Síndicos discutem Projeto de Lei nº 2.510/2020 para propor emenda ao Senado Federal

A responsabilização dos síndicos pela comunicação de casos de violência doméstica no condomínio vem ganhando força de lei em diferentes capitais do País e é objeto de PL no Senado Federal.

Mas gestores pedem mudanças na matéria, pois a omissão de socorro já é considerada crime segundo o Art. 135 do Código Penal. Uma das sugestões é que o síndico fique responsável pela divulgação dos canais de denúncia e da responsabilidade social que recai sobre todos as pessoas indistintamente.

O Projeto de Lei nº 2.510/2020 do Senado Federal tem cunho social importantíssimo para a nossa sociedade, principalmente nos grandes centros urbanos, em que há aglomeração populacional em face da verticalização das cidades. Por outro lado, mediante o aumento brutal da violência doméstica mundial, e consequentemente em nosso País, é de extrema importância o tema em questão, do qual só temos a agradecer aos nossos Senadores, principalmente ao autor do projeto, o Senador Luiz do Carmo (MDB/GO), quanto ao olhar voltado a estas questões, que infelizmente são tão reais e devastadoras de nossa sociedade.

Entretanto, é certo que as atribuições dos síndicos são inúmeras, e suas responsabilidades regidas por leis tanto nas esferas cível, criminal e tributária, e não há qualquer interesse em se eximirem de qualquer responsabilidade ou colaboração ao tema da violência doméstica. Todavia, considerando que a gestão condominial é realizada em sua maciça maioria por moradores dos próprios condomínios, os síndicos de uma maneira geral passaram a refletir e questionar alguns pontos do projeto de lei, que terão um impacto negativo na vida condominial.

A principal questão é o tratamento diferenciado entre a figura do síndico e demais moradores do condomínio em face do crime de omissão de socorro previsto no Art. 135 do Código Penal, do qual todos são iguais perante a lei.

Neste sentido, não justifica a responsabilização diferenciada do síndico em relação aos demais moradores, que também são vizinhos de possíveis vítimas de violência doméstica, cabendo a todos, neste caso, a responsabilidade objetiva idêntica, uma vez que a violência doméstica não tem vinculação às questões inerentes à gestão condominial.

Se o projeto de Lei 2.510/2020 for aprovado na forma que está redigido, acabará por punir o síndico por fatos de terceiros, uma vez que não necessariamente esse gestor terá conhecimento e acesso à informação da suposta violência que esteja ocorrendo no condomínio.

Conclui-se que o objetivo central do projeto é a conscientização da sociedade quanto à necessidade da denúncia de violência doméstica, a fim de serem preservadas as vítimas desta violência. Mas, de acordo com o Art. 135 do Código Penal, a omissão de socorro é crime imputado a qualquer pessoa que deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. O crime é punível com detenção de um a seis meses ou multa, e a pena poderá ser aumentada de metade se da omissão resultar lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resultar a morte.

Portanto, a omissão de socorro é norma cogente de aplicação imediata a toda e qualquer pessoa que deixar de prestar socorro a quem está em iminente perigo, seja pela simples falta de denúncia às autoridades policiais.

Desta forma, tanto moradores, locatários, possuidores, incluindo o síndico, são responsáveis igualmente em razão da omissão de socorro, não podendo outra norma abrandar a tipicidade e o agente do Código Penal.

Por outro lado, e não menos importante, temos que o síndico é a figura principal na gestão condominial, sobre ele recai inúmeras responsabilidades e obrigações, e a destituição de um síndico é algo extremamente prejudicial para um condomínio, mesmo nos casos que se faça necessária tal medida por atos contrários à própria gestão.

Com a destituição de síndico prevista neste PL, o condomínio fica sem um representante legal, o que determina a necessidade imediata de nova eleição do mandatário e, de acordo com a realidade social e condominial, são pouquíssimas as pessoas que se dispõem a atuar nesta função, e o condomínio não pode ficar sem um responsável. Mesmo que se opte pela contratação de um síndico profissional, isto demanda tempo, orçamentos, avaliações dos moradores, e a eleição propriamente dita para que haja esta transição.

Desta forma, a destituição do síndico terá repercussão para toda a comunidade vinculada ao condomínio, transferindo as consequências da suposta omissão do síndico para todos os condôminos.

Neste sentido, o que se demonstra mais adequado é a aplicação da norma prevista no Código Penal quanto ao crime de omissão, que representa uma punição direta ao infrator, e está de acordo com o que determina a nossa Constituição Federal, cujas penas são personalíssimas e individualizadas. Conforme o Art. 5º, incisos XLV e XLVI:

“XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

e) suspensão ou interdição de direitos”.

Por outro lado, para que se possa averiguar a “suposta omissão do síndico” em assembleia para sua destituição, em que deverá ser preservado o devido processo legal, mesmo que no âmbito condominial, haverá necessidade de exposição dos fatos, o que acabará por divulgar de forma ampla e geral a violência ocorrida, expondo além do ato, a própria vítima, indo contra toda a sistemática de sigilo previsto para estes casos.

Desta forma, conclui-se que a destituição do síndico afronta normas Constitucionais assim como o Código Civil, devendo tal artigo do projeto de lei ser revisto.

No mais, os casos em que o condomínio for administrado por síndico profissional, ele terá dificuldade do acesso à informação quanto à violência doméstica, e até que tome conhecimento e faça a denúncia, não terá a mesma eficácia se um vizinho da vítima acionar prontamente os órgãos competentes, que é o que se espera, que seja feito!

Este tema vem sendo discutido entre síndicos, que estão se mobilizando a fim de serem apresentadas ao Senado propostas de emendas ao projeto, adequando-o conforme as considerações acima, para que, ao ser aprovado, determine que o síndico seja responsável pela divulgação dos canais de denúncia e a responsabilidade social que recai sobre todos nós indistintamente, inclusive e principalmente quanto ao crime de omissão de socorro, previsto no Art. 135 do Código Penal.

A conscientização e a divulgação dos canais de denúncia são as principais ferramentas ao combate à violência doméstica em nossos condomínios, e em nossa sociedade de maneira geral.

Obs.: Venha participar deste debate, encaminhando um e-mail para sindicos.saocaetano@yahoo.com, aos cuidados da advogada Carla Fuentes Sales.

Adriana Kingeski dos Santos

Carla Fuentes Sales

É advogada e percursora deste debate entre os síndicos no município de São Caetano do Sul, Região Metropolitana de São Paulo. A advogada é proprietária de escritório especializado em Direito Imobiliário e Condominial que atua na Região do ABC, além de presidente da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da OAB de São Caetano do Sul. Mais informações: carla@fuentesesales.com.br.

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