Crianças envolvidas na dinâmica condominial são mais responsáveis

Criança solta nas áreas comuns tira o sossego de muita gente e, o pior, pode se colocar em perigo. O síndico não responde pela guarda, mas pode minimizar riscos de ocorrências graves bloqueando acessos, e também propor à garotada uma ‘sindicância lúdica’, mas que ensina regras de convívio harmônico e seguro.

Garotada do Villagio Di Firenze

Torneio do projeto síndico mirim com a garotada do Villagio Di Firenze e do Cerejeiras teve participação de Samuel Corrêa (de camisa rosa); pequenos gestores exibem premiações

Em nova Odessa, cidade da região de Campinas, o síndico profissional Samuel Ananias Corrêa implantou um ano atrás o cargo de síndico mirim no condomínio horizontal Villagio Di Firenze, com 154 residências. “Quando eu assumi a gestão, 70% das reclamações dos condôminos eram de bagunça de crianças e adolescentes, por isso propus ao conselho esse projeto lúdico, que é mais eficaz do que aplicar multas. Promove noção de convivência coletiva e também aproxima o público infanto-juvenil do síndico, que deixa de vê-lo como um bicho-papão ou bedel, para compreender que é alguém que está ali para contribuir com o condomínio”, relata Samuel.

Dentre as queixas iniciais havia o ruidoso futebol no meio da rua, em frente às casas; as conversas e risadas altas dos adolescentes que permaneciam sentados nas calçadas após as 22 horas; o volume da música que a criançada ouvia na piscina; as brincadeiras dos pequenos em meio aos carros, entre outras desordens. “Antes, eles usavam menos a área de lazer, composta de minicampo de areia, miniquadra de basquete, piscina, salão de jogos, e um espaço wi-fi. Hoje, essa área tem vida, e é usada com respeito”, constata o síndico. Ele atesta que o número de notificações e multas envolvendo a gurizada diminuiu muito, e até a inadimplência da taxa condominial cedeu “porque os pais se sentem mais estimulados ao ver os filhos felizes e acolhidos”, acredita.

O projeto consiste em indicar dois síndicos mirins por sábado, que exercem a sindicância por uma semana. Participam menores de 17 anos, por isso a turma é dividida em dois grupos, de acordo com a faixa etária. Na assembleia mirim, os síndicos apresentam demandas, discorrem sobre suas ações e se autoavaliam como gestores dentro de um plano de metas que visa premiação individual e coletiva. A premiação dos síndicos consiste em um brinde personalizado e um diploma, e a dos grupos em cinema com pipoca e refrigerante no salão de festas ou campeonatos. “Eles curtem muito, sobretudo ficar no comando, em evidência”. A sugestão para quem for implantar o método é iniciar indicando para a gestão os ‘pimentinhas’, que normalmente já se destacam entre os colegas, e trazê-los para uma ‘liderança do bem’. A estratégia funciona, segundo Samuel, tanto que acaba de adotá-la mais uma vez, agora no condomínio Cerejeiras, onde 47 crianças e adolescentes aderiram ao projeto e já há fila de espera para ser síndico mirim.

Outra iniciativa bem-sucedida é a do grupo paulistano Na Rua sem Wi-fi que há quatro anos apresenta às novas gerações as atrações que divertiam a gurizada pré-internet, como futebol de botão, bambolê, taco, pião, telefone sem fio e cama de gato, entre outras. “A ideia é proporcionar às crianças de hoje a mesma emoção da infância de antigamente”, conta o presidente Anderson Costa. O grupo já realizou eventos em ruas de lazer, parques, shopping, praças, SESC, estação da CPTM e até no mundo corporativo. Para condomínios, o formato pode ser adaptado conforme o espaço disponível e, uma vez conhecendo as ‘novas’ brincadeiras, as crianças terão mais repertório para aproveitar as áreas comuns com os amigos, babás, pais ou avôs, sem ter de se colocar em risco explorando espaços inapropriados como escadas ou garagens.

Projeto na rua sem Wi-fi

Carrinho de rolimã e bambolê estão entre as atrações do Na Rua sem Wi-fi , que resgata brincadeiras antigas

Livre circulação, pode?

Crianças desacompanhadas nas áreas comuns do condomínio não são responsabilidade do síndico, tampouco do zelador ou porteiro. “O responsável legal pela criança é o genitor ou o tutor”, enfatiza o advogado Rodrigo Karpat, especialista em administração condominial. Porém, como os pequenos ainda não têm a real noção de perigo em determinadas situações, o síndico pode contribuir para minimizar riscos de acidentes bloqueando ou dificultando alguns acessos, entre os quais, às piscinas.

Outra medida do síndico refere-se ao cumprimento da lei municipal 12.751, que proíbe menores de dez anos de usarem o elevador sem a companhia de um adulto. “Todas as vezes que for constatado o menor dentro do elevador, seu responsável legal deve ser notificado, multado e essas condutas repreendidas”, orienta. Essa regulamentação tem de constar na cabina.

Para as áreas comuns do condomínio, não existe lei que proíba a circulação de crianças desacompanhadas. Mas Rodrigo salienta que, se houver conhecimento de que o menor está se expondo a algum risco, o genitor deve ser avisado imediatamente. “Mas se ele não demonstrar preocupação, e a criança for pequena, pode se tornar um caso de falta de cuidados onde a polícia pode ser acionada e, em situações extremas, o conselho tutelar”, comenta o advogado.


Matéria publicada na edição – 283 – out/2022 da Revista Direcional Condomínios

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