A falta de energia em condomínios e a responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica

Acontecimentos recentes que impactaram a cidade de São Paulo, mediante a chegada de fortes tempestades, causaram prejuízos de toda ordem, em especial pelo fato de milhares de residências terem permanecido sem energia elétrica ao longo de dias seguidos.

Esses danos chegaram aos condomínios, com prejuízos verificados tanto nas áreas comuns quanto nas unidades autônomas e privativas.

Isso porque, assim como ocorre na maioria das cidades brasileiras, São Paulo insiste na adoção de um procedimento obsoleto e desgastado, caracterizado pela exposição aérea da fiação de energia em postes, cujos fios são frequentemente alcançados durante fortes tempestades, em decorrência da queda de árvores, atingidas por descargas elétricas.

A adoção da fiação subterrânea, medida própria de cidades do primeiro mundo, é muito tímida em nosso país. A título de exemplo, a capital mineira possui somente 2% de sua fiação inserida na terra. Por seu turno, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo, aproximam-se de 10%, números que, se de um lado, apontam para o descaso com a importância que o tema se reveste, de outro lado apontam para a crônica de uma tragédia anunciada.

Visto o problema sob a ótica jurídica, a responsabilidade das empresas fornecedoras de energia elétrica é objetiva, o que vale dizer que, caso venha a ocorrer interrupção sistêmica do fornecimento de energia, há se ser aplicada a teoria do “faute du service”.

Segundo os ditames da escola francesa, quando ocorre a interrupção da prestação do serviço público, as concessionárias devem responder pelos danos causados.

A falta prolongada de energia impacta a rotina de milhares de unidades condominiais, importando no advento de danos, como é o caso da queima de aparelhos eletrônicos ou da perda de medicamentos ou de alimentos que necessitam de refrigeração.

Deve-se entender que a relação que se estabelece entre os usuários do serviço público e as concessionárias de energia elétrica se enquadra nas regras próprias ao Direito do Consumidor, o que autoriza que condôminos ou moradores que possam ter se deparado com prejuízos, possuem o direito subjetivo de postular indenização em razão dos danos causados pela falta de fornecimento de energia elétrica.

Trata-se de um direito fundamental previsto no inciso XXXV do artigo 5° da Constituição Federal, e que vem protegido por normas administrativas, como é o caso da Resolução 1.000/21 da Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel (Aneel).

Esta resolução afirma que todo aquele que venha a ter prejuízo em decorrência de um apagão, pode requerer o ressarcimento de danos. 

Essa indenização inclui desconto na fatura, o qual deve ser concedido de forma automática no prazo máximo de até dois meses após a interrupção do serviço de energia elétrica.

Cabe ao interessado comprovar, por meio de documentos ou outros tipos de prova, o prejuízo causado e a conexão deste dano com a interrupção do serviço público essencial.

Para além dos danos materiais, admite-se a possibilidade de se postular indenização por dano moral, bem como ressarcimento por lucros cessantes, eis que muitas pessoas tiveram suas rotinas profissionais impactadas, reduzindo o seu potencial de ganho, dependendo da atividade laboral exercida.

O primeiro passo para os que intentam obter ressarcimento, é contatar a concessionária de energia elétrica, apresentando elementos aptos a comprovar os danos causados com o apagão, valendo para esse fim a apresentação de imagens ou vídeos (de alimentos ou medicamentos estragados) ou de notas fiscais ou orçamentos de bens de consumo atingidos ou danificados.

A concessionária tem o prazo de até 90 (noventa) dias para resolver a demanda de forma consensual. Caso a empresa se recuse a responder, o usuário poderá abrir um chamado junto à Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel (Aneel), que por sua vez, tem o poder disciplinar de aplicar multas de valores expressivos à concessionária recalcitrante.

Exauridas as tentativas de resolução pelas formas amigáveis de solução de conflitos, restará ao consumidor dirigir-se ao Poder Judiciário, onde poderá requerer reparação por danos de ordem material e moral.


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Autor

  • Vander Ferreira de Andrade

    Advogado. Especialista, Mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP. Responsável pela capacitação de mais de 5.000 profissionais no segmento condominial em todo o Brasil. Palestrante e Parecerista. Articulista de diversos periódicos especializados na área do Direito e da Gestão Condominial. Autor do “Manual do Síndico Profissional” (Editora Nelpa – São Paulo, 3.ª Edição, 2022). Atualmente é Vice-Presidente do Capítulo São Paulo da J. Reuben Clark Law Society e Presidente da Associação Nacional de Síndicos e Gestores Condominiais.