Drogas em condomínios

Levantamento nacional realizado junto às escolas públicas pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), vinculado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e pela Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) aponta que o contato com as drogas lícitas, principalmente o álcool, representa a porta de entrada de jovens e adolescentes no vício das ilícitas.

A conclusão não é diferente de estudo comandado pelo psicólogo Wagner Abril Souto, coordenador do Centro de Referência em Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod), da Secretaria de Saúde do Estado. “Para 50% dos adolescentes atendidos pelo Cratod, os pais fazem uso abusivo do álcool, que introduz isso a eles.” De forma geral, aponta Wagner, a facilidade de acesso, a generalização da distribuição em todos os estratos sociais, o exemplo familiar negativo, além do barateamento das drogas, constituem os principais fatores que predispõem ao consumo.

É um assunto tão complexo quanto pouco falado ou debatido nos condomínios, afirma o síndico Maurício Jovino, do Residencial Guignard, na zona leste da Capital paulista. Há cerca de cinco anos, Maurício conseguiu resolver um problema de consumo que acontecia no espaço comum dos sete edifícios do Guignard. “Você fica sozinho numa situação dessas, mas precisa decidir junto com a comunidade o que fazer”. “É uma das questões mais delicadas para lidar nos condomínios, porque a maior parte das famílias empurra com a barriga e finge que o problema não é com elas.” Por outro lado, “elas acabam rompendo os laços com os filhos, estimulando ainda mais o consumo”.

Para o psicólogo Wagner Souto, “não fugir do problema e estabelecer boa relação afetiva” representa o grande “fator de proteção” contra o contato e a dependência das drogas, mesmo porque, “o adolescente começa com as lícitas, como o álcool e tabaco, que ele encontra na própria família”. Tudo depende, acrescenta, “da relação que ela estabelece com esse uso, pois ao pedir aos jovens que comprem as lícitas, apesar da proibição da lei, estão dando estímulo à própria experimentação”. Nesse sentido, o síndico Maurício Jovino optou por estabelecer inicialmente um diálogo com os jovens usuários e, depois, com os próprios familiares, orientado por especialistas e apoiado pelo conselho e outros moradores. “Tivemos uma conversa franca, oferecemos opções de auxílio gratuito, descartamos o enfrentamento”, diz.

Mas alguns cuidados foram adotados para que se abrisse a interlocução. O primeiro foi comprovar o consumo nas áreas comuns e identificar os usuários. Segundo o advogado Cristiano de Souza Oliveira, “é preciso ter certeza, provas nas mãos, não adianta ‘ouvir dizer’”. “O funcionário tem que ter visto e formalizado ou as câmeras registrado o fato. Com essas informações, o síndico deve chamar os responsáveis, mas sempre por  escrito”, recomenda. Ainda assim, ele pouco pode fazer, a não ser solicitar providências aos pais, mas sem enfrentamento.

“O síndico não tem competência para fazer nada mais a não ser pela conscientização. Qual a responsabilidade dele? Ele não pode ser omisso”, complementa. Acionar a polícia também pouco tem ajudado, pois, segundo Cristiano, há um entendimento das áreas da segurança pública e judiciária de que as ocorrências dentro dos condomínios referem-se ao espaço privado e que, portanto, não podem ser apuradas exceto sob mandado judicial. A situação adquire mais complexidade quando o consumo ocorre dentro de casa e incomoda os vizinhos mais próximos. “Ao síndico cabe apenas pedir que a reclamação seja colocada no papel e, no máximo, como segundo passo, comunicar o morador que está havendo a queixa contra ele”,  observa Cristiano. Recorrer ao Artigo 1336, Inciso IV , do novo Código Civil, que aborda a questão da salubridade, poderia dar algum respaldo à administração, quando, por exemplo, o consumo resultasse em barulhos ou demais incômodos, mas esse é um caminho complexo, observa o advogado. “Seria partir para o enfrentamento”, analisa.

O consultor em segurança Waldir de Oliveira Samora também sugere o caminho do diálogo. “O síndico não pode estar sozinho, precisa do apoio da comissão e da família.” De qualquer forma, algumas ações preventivas podem ser adotadas pela administração, pondera Samora. “A chave está na vigilância, feita tanto pelos funcionários quanto pelos equipamentos, como o circuito de CFTV ”, diz. Os locais ermos devem ser iluminados ou ter seu acesso restrito por barreiras físicas, acrescenta. O síndico Maurício Jovino lembra, por exemplo, que alguns comportamentos típicos sinalizam o consumo de drogas entre os jovens e adolescentes. “Eles formam grupos e se isolam da comunidade, falam baixo, frequentam locais pouco iluminados, distantes da vigilância dos funcionários ou das câmeras e se desarticulam rapidamente quando chega alguém estranho a eles.”

Já a venda ou entrega de entorpecentes dentro dos condomínios pode ser identificada por meio de visitas constantes e rápidas de dois a três jovens estranhos ao local, entre eles pelo menos uma garota, principalmente no horário da tarde, indica Waldir Samora. O consultor observa que “o acesso está muito fácil, foi pulverizado”. Somado a isso, fatores como a curiosidade, amizades e a frequência a locais de uso predispõem à experimentação e posteriormente ao vício, afirma. “O mundo moderno tirou um pouco dos pais o controle sobre os filhos. Mas a base de tudo ainda está na educação”, conclui Samora. 


Matéria publicada na edição 142 dez/09 da Revista Direcional Condomínios

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