Síndico – Superação Nota 10

Três histórias reunidas aqui homenageiam o Dia do Síndico, a ser comemorado em 30/11,  e refletem bem a “missão” incansável dessas pessoas que prezam pelo bom funcionamento da coletividade, pela valorização do patrimônio e pela construção de um ambiente harmonioso. Experiência que envolvem “debate eleitoral”, “plano diretor” de melhorias, gestão compartilhada, controle orçamentário, programas sociais, entre muitos outros.

Uma moradora vem desafiando a paz da síndica, condôminos e funcionários do Condomínio Edifício Ana Carolina, em Santana, zona Norte de São Paulo, há pelo menos oito anos. Já foi citada em um boletim de ocorrência junto à Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) por uma ex-funcionária, alvo de outra queixa por “injúria e ameaça” junto ao 9º Distrito Policial do Carandiru e também à promotoria da 1ª Vara Cível do Fórum Regional I de Santana. E ao receber uma multa aplicada pela síndica Rejane de Albuquerque por comportamento antissocial, conforme preveem as normas regimentais, acionou judicialmente o condomínio por danos morais. Ganhou a ação! O condomínio tornou-se réu e foi penalizado.

Na sentença, o juiz, mesmo reconhecendo a inaptidão da moradora para viver em condomínio, condenou o Ana Carolina a pagar R$ 1.500,00 de indenização.

Segundo ele, ficou caracterizada injúria contra a moradora. Na época, a advogada orientou o condomínio a não recorrer, mas o problema permanece, a pessoa continua dirigindo ofensas diárias contra outros residentes, funcionários e visitantes. “Há diversas reclamações registradas no Livro de Ocorrências nesses últimos oito anos”, diz Rejane, que “gostaria de resolver da melhor forma o caso”. Conforme o Novo Código Civil, artigo 1.348, inciso IV, compete ao síndico “cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia”. Mas o condomínio já foi condenado, a acusada não paga as multas aplicadas, então, o que fazer? Rejane conta que é ré em outras ações por danos morais por zelar pelas normas condominiais.

SER SÍNDICO É… Nada disso, entretanto, esmorece o ânimo da síndica, que permanece firme em sua função, encarando-a como uma “missão”. “Já investi 17 anos neste trabalho, estamos conseguindo colocar o prédio em ordem e desistir agora não faz parte do meu perfil”, observa a ex-tenente da Aeronáutica. Graduada em Assistência Social e membro do Conselho de Síndicos do Secovi (Sindicato da Habitação), Rejane foi indicada por alguns de seus colegas como uma típica “síndica nota 10”. Seu trabalho iniciou em 1993, quando o edifício, de 128 apartamentos de um dormitório, passava por sérios problemas de má-gestão e inadimplência (de 45%). Na época, os condôminos optaram pela auto-gestão, depois a elegeram síndica, com acúmulo de função de administradora e zeladora e pagamento de pró-labore. O antigo apartamento do zelador deu lugar ao escritório, onde dá expediente diário das 13h às 21h e comanda 13 funcionários.

Suas atividades envolvem “todo o aporte administrativo rotineiro, tudo que cabe ao gestor condominial fazer”; contratação, dispensa, orientação e treinamento dos colaboradores (conforme as Normas para Observância pelos Funcionários); reunião de integração com novos moradores (metade dos apartamentos é ocupada por inquilinos, o que faz com que a rotatividade dos ocupantes seja elevada); atendimento a corretores de imóveis, prestadores de serviço, leituristas etc.; e separação de correspondências e encomendas.

Como perfil de gestora, alia o rigor no cumprimento das normas com a transparência das ações. As reuniões com o Conselho Administrativo são mensais e as comunicações com os moradores lançam mão de circulares, conversas pessoais, contatos por telefone e email, além de notificações impressas. Nas assembleias, procura atrair um número maior de participantes promovendo encontros temáticos, palestras e sorteios de brindes. “Assim mesmo, elas mobilizam em média 20 condôminos, um pouco mais que 10%”, lamenta Rejane. Desenvolve ainda um trabalho social com os idosos, que representam 35% dos moradores, e as crianças. Encaminha casos de maus tratos aos órgãos competentes, divulga os respectivos estatutos e orienta casais sobre orçamento doméstico, revela. Segundo Rejane, as atividades que mobilizam as pessoas estão entre as que mais lhe dão prazer. “Gosto de organizar as reuniões com os funcionários, as assembleias, decoração de Natal, mostrar aos novos moradores as dependências comuns”, diz.

Rejane sente-se também realizada pela nova roupagem que ajudou a dar ao Ana Carolina. “Quando assumi a gestão do edifício, havia uma intimação do Contru por falta de segurança, na mesma época em que o Condomínio Baronesa de Arari, da Paulista, foi interditado. Éramos conhecidos como o ‘balança mais não cai de Santana’”, lembra a síndica. Desde então, o prédio passou por um processo de reconstrução e valorização, suas unidades têm “liquidez de venda e de aluguel”, e a inadimplência foi zerada. “Esta é a maior raridade”, acredita a síndica, que cumpre seu 9º mandato e será candidata novamente em 2011.

O SUCESSO EM NÚMEROS

O síndico precisa ter disponibilidade, bom senso, conhecimento e interesse por assuntos variados, espírito de liderança, flexibilidade nas relações e capacidade de mediação, conforme atesta a experiência de Nicanor Pereira de Souza, em seu 6º mandato à frente do Condomínio Edifício Santana Top Life, também zona Norte da cidade. Segundo Nicanor, as maiores dificuldades enfrentadas pelo síndico decorrem das relações entre os moradores, especialmente das situações que envolvem crianças. O jeito é partir para o caminho da conciliação, promover uma gestão transparente, criar regras para o uso das áreas comuns, fazer reuniões com funcionários, lançar circulares aos moradores sempre que houver necessidade e colocar em perspectiva o interesse comum nas decisões e escolhas. “Faço uma administração bem aberta”, caracteriza Nicanor, que não gosta de decidir nada sozinho; a cada mês organiza uma reunião com o Conselho Administrativo (com três titulares e três suplentes), além do subsíndico.

Entretanto, o que chama atenção em sua gestão “nota 10” é a organização de tudo em planilhas e manuais. Mensalmente, Nicanor apresenta o movimento financeiro ao Conselho e aos demais condôminos (através do quadro de aviso). Advogado e ex-gerente geral de uma fábrica de cimentos por 25 anos,Nicanor acostumou-se a fundamentar suas ações em números, a buscar a valorização do patrimônio bem como a reduzir custos. Nos últimos dez anos, por exemplo, enquanto a variação de preços ficou em 99,6%, (segundo o IGPM/Índice Geral de Preços ao consumidor) ou 83,71% (conforme o ICON/Índice de Custos Condominiais do Secovi), as despesas do condomínio cresceram metade disso, 45,59%. A taxa condominial, por sua vez, variou 26,8%, de R$ 448,39 para R$ 568,00 mensais.

A ginástica orçamentária do prédio de 68 apartamentos de três dormitórios resulta de um controle minucioso de gastos e de ações que visam à redução do consumo (se gasta 20% menos de energia depois de concluída a reforma da iluminação da garagem; o consumo de água da Sabesp caiu de 25 mil para dez mil metros cúbicos após a construção de um poço artesiano). Nicanor diz que assumiu o condomínio com orçamento no vermelho e hoje apresenta caixa positivo. Os condôminos acabaram beneficiados ainda, ao longo do período, por uma indenização de R$ 450 mil reais, ganha contra a construtora do prédio, por “vícios construtivos”. Também foram vitoriosos em outra ação contra a empresa, hoje fixada em R$ 2 milhões, dinheiro ainda indisponível, mas que já tem destino certo: obras de impermeabilização, pintura e demais prioridades a serem definidas em assembleia pelos moradores.

AMBIENTE DE CONCILIAÇÃO

Na história do síndico Luiz Carlos França Domingues, engenheiro que cumpre seu 4º mandato à frente do Condomínio Ilhas Gregas, localizado no Jardim Paulistano, um dos aspectos que se destaca é a busca de um “ambiente de conciliação”. Ali o síndico delega funções e responsabilidades não apenas ao gerente predial e demais funcionários administrativos, como também se reúne a cada dois meses com o Conselho de Administração e com comissões setoriais formadas voluntariamente pelos moradores. Estes se dividem nas áreas de segurança, finanças, recursos humanos e manutenção, conforme a experiência profissional de cada um. “Atuamos aqui como uma verdadeira equipe, então as coisas funcionam de forma bem coordenada”, observa o síndico, engenheiro com MBA em Gestão de Facilities, curso realizado na Universidade de São Paulo.

Em sua trajetória junto ao Ilhas Gregas, Domingues tornou-se o primeiro síndico a conquistar a certificação ISO 9001/2000 para um condomínio residencial. Isso aconteceu entre 1997 e 2002, na primeira fase em que esteve no comando do empreendimento de alto padrão, com seis prédios e cerca de mil moradores, além de 46 funcionários diretos. As gestões posteriores não deram conta de atender ao rigor dos procedimentos administrativos exigidos para a renovação anual da certificação, tampouco conseguiram manter o “ambiente de conciliação”, especialmente entre os funcionários. Desta forma, o engenheiro, hoje com 83 anos, foi convencido pelos condôminos a retornar em 2009, quando participou de um verdadeiro processo eleitoral, que envolveu, inclusive, a realização de um debate entre os candidatos. “Uma semana antes da assembleia de votação, os candidatos a síndico expuseram suas idéias, abriram-se para perguntas do público. A ideia veio do filho de um condômino, que participa do diretório acadêmico da faculdade”, rememora o engenheiro.

Segundo ele, o debate foi conduzido por um moderador e, a participação, “surpreendentemente grande”. “É muito bom poder expor ideia e programas, bem como dizer como se vai enfrentar as dificuldades, porque os condomínios sempre lidam com questões polêmicas”, diz. Reconduzido ao cargo, Domingues conseguiu estabelecer um Plano Diretor de melhoramentos, a ser executado até o final de 2011. Os investimentos estão orçados em R$ 650 mil e preveem a reforma do hall social (de dois prédios por ano), adequação às normas de acessibilidade, combate às infiltrações na garagem, recuperação de áreas de lazer (quadra poliesportiva, pista de cooper etc.) e instalação de novos equipamentos de fitness.

Com os funcionários, Luiz Domingues conseguiu resgatar a relação de confiança e comprometimento. “Além da remuneração que fica no patamar entre médio e alto do mercado, eles contam com muitos benefícios, como refeitório, uniforme e um extra proveniente da ‘caixinha’ e equivalente a quase um 14º salário”, afirma. No entanto, o que mais gera satisfação, conforme ressalva, é a adoção de uma política de incentivo e capacitação. A cada cinco anos trabalhados no Ilhas Gregas, o funcionário recebe uma gratificação. Também passa por cursos e treinamentos pagos pelo condomínio. “O eletricista, por exemplo, começou aqui como faxineiro e após realizar cursos no Senai, tornou-se um profissional completo, mexendo com a parte elétrica e a eletrônica. Isso serve como motivação para todos”, destaca. Outra fonte de motivação está na transparência da gestão e das decisões, acredita o síndico. Ele e o seu gerente predial, Fernando Figueroa, dividem bem as tarefas; Domingues “cuidando mais dos condôminos e, o Sr. Fernando, dos funcionários”.

Diante dos moradores, também prevalece a política de transparência. O condomínio publica um jornal mensal, possui um livro de sugestões e utiliza-se da intranet para a comunicação com grande parte dos condôminos. Segundo Domingues, “a grande realização que um síndico pode ter é uma administração bem transparente, que consiga conciliar os problemas interpessoais e manter o patrimônio. Um empreendimento como esse, que tem 20 anos, pede uma atenção constante em modernização”, observa. Presença assídua no Ilhas Gregas, Luiz Carlos Domingues diz que tem fôlego para mais uma gestão, para que ao menos consiga retomar a certificação da ISO, em nova tentativa de deixar a casa em ordem e facilitar a vida dos futuros síndicos.

LEGISLAÇÃO

Dois dispositivos legais regulamentam as atribuições, prerrogativas e responsabilidades dos síndicos: o Novo Código Civil (Lei 10.406/2002) e a Lei 4.591/64, conhecida como a Lei dos Condomínios. Segundo o advogado e consultor condominial Cristiano de Souza Oliveira, a lei de 1964 permanece válida, “porém, onde houver conflitos, prevalece o Novo Código”. “Este confirma a ideia de que quem administra o condomínio é o síndico”, reitera Cristiano. E, além de repetir algumas atribuições previstas na Lei dos Condomínios, completa “com outras determinações inéditas, que vislumbram o objetivo de uma administração clara e participativa”. A não observância dessas obrigações, as quais são completadas pela Convenção condominial, poderão levar o síndico às sanções e responsabilidades diversas, aponta Cristiano. Clique aqui e confira uma detalhada análise de ambas as leis, desenvolvida pelo advogado.


Matéria publicada na edição 152 nov/10 da Revista Direcional Condomínios

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