Inspeção de acompanhamento de garantia para os condomínios novos

É muito importante a gestão do síndico durante o período de garantia da edificação, de forma a assegurar seu desempenho, conservação e valor patrimonial.

O início da “vida” de um condomínio é o que traz maior demanda de atividades e requer maior atenção e controle do síndico. É um período de transição, onde ainda não se definiram algumas regras, as pessoas não se conhecem, os moradores estão se mudando, realizando reformas, corretores estão trazendo clientes, problemas de construção estão aparecendo, a equipe de obras, muitas vezes, ainda está no local, enfim, é muita coisa acontecendo e pouca estrutura e controle para tudo isso. Aqui trataremos apenas dos aspectos técnicos de engenharia, mas se está passando por isso, é bom buscar se informar para os demais assuntos.

Criando uma linha do tempo, a partir do nascimento do condomínio (data de instalação do condomínio) em diante, existe a fase de passagem do bastão da construtora para o condomínio (Leia sobre o tema em outro artigo – ” Vistoria de recebimentos de edificações: Orientação aos síndicos”). Aqui vamos tratar de um passo a seguir, após o recebimento completo das áreas comuns da edificação.

Depois da “passagem de bastão” começa a contar o prazo de garantia e toda a responsabilidade de uso, operação, conservação e manutenção da edificação é exclusiva do síndico, cabendo a ele realizar essa gestão com base nas definições do “Manual do Síndico”, que deve ser entregue pela construtora. Nesse momento é muito provável que comecem a aparecer anomalias construtivas, ou os chamados vícios ocultos, que nada mais são do que o comportamento da edificação em uso e exposição. Esses devem ser reclamados logo após seu aparecimento, para que não se corra o risco de perder o prazo de garantia dado pela construtora, nem o prazo legal de 90 dias a partir do aparecimento, segundo o inciso II e § 3° do Art. 26 do Código de Defesa do Consumidor. Outra atenção que o síndico deve tomar é para que não perca a garantia devido a ações incorretas, conforme veremos abaixo.

Linha do tempo – Ciclo de vida da edificação

Descobrir a data do aparecimento de um vício oculto é bastante difícil, praticamente improvável, e para não se correr esse risco de perder os prazos de garantia , é recomendado realizar inspeções regulares na edificação, principalmente nas áreas e equipamentos pouco utilizados. Apesar dessa atividade poder ser realizada pelo zelador, ou responsável pela manutenção, é cada vez mais comum a contratação de peritos em engenharia para realização dessa tarefa. As vantagens dessa contratação são que esses profissionais já possuem experiência para identificação dos vícios construtivos, e seus riscos, sabendo distinguir o que é decorrente de erro de execução e o que é falha de uso ou manutenção. São as chamadas “Inspeções de Acompanhamento de Garantia”, ou “Inspeções de Gestão de Garantia”, onde são emitidos laudos ou pareceres técnicos, classificando o que é de responsabilidade do construtor e o que é responsabilidade do condomínio.

Então, se pensarmos, outra vantagem é que esses laudos têm maior “peso” e comprovação técnica para cobrar o construtor, e serve como fiscalização das atividades do responsável pela manutenção. Isso garantirá a durabilidade, segurança e desempenho da edificação, evitando a identificação tardia das anomalias, que pode se tornar inviável de reparação, muito onerosos, terem atingido outros sistemas e estarem fora do prazo de garantia.

Algumas normas técnicas já orientam essa prática, que se aplicam durante toda a vida útil da edificação. Sendo elas:

Nota¹: Não que a perda do prazo posso tirar o direito de reclamação, mas se isso ocorrer pode se dificultar a tratativa com o construtor, tendo de recorrer a tribunais de arbitragem ou judiciais, o que leva tempo, custa caro e desgasta muito a relação condomínio x construtora, o que não é vantajoso para nenhum dos lados.

• NBR 5.674 – Manutenção de Edificações – Requisitos para o sistema de gestão de manutenção (ABNT, 2012);
• NBR 14.037 – Diretrizes para elaboração de manuais de uso, operação e manutenção das edificações (ABNT, 2011);
• NBR 15.575 – Edificações Habitacionais – Desempenho (ABNT, 2013).

Perda de Garantia

As garantias podem ser perdidas devido ao uso incorreto, a falta de manutenção, manutenção incorreta, a alterações, reformas, etc. O ideal é verificar o que está descrito no “Manual do Síndico” e orientar todos os moradores e funcionários quanto a isso. De maneira geral os itens que podem fazer com que a edificação fique fora de garantia são:

• Não for observado o que está disposto no Manual do Síndico e o Manual do Proprietário;

• Não atender os requisitos da ABNT NBR 5674: “Manutenção da Edificação”, no que diz respeito à manutenção, o uso e a operação correta;

• Não serem mantidos registros legíveis e disponíveis para prover evidências da efetiva implementação do programa de manutenção, do planejamento, das inspeções e da efetiva realização das manutenções;

• Se for executada reforma pelo condomínio ou descaracterizações dos sistemas construtivos integrantes da edificação, bem como outros dispositivos expressos neste Manual;

• Se for verificado o mau uso de equipamentos e sistemas, bem como manuseios impróprios;

• Se houver danos por mau uso, ou não respeitando os limites admissíveis de sobrecarga nas instalações e estruturas;

• Se, nos termos do art. 393 do Código Civil Brasileiro atualizado 2003, ocorrer qualquer caso fortuito, ou por força maior, que impossibilite a manutenção da garantia concedida;

• Após exceder os prazos das garantias previstos em contrato e na lei.

Prazos de Garantia

O prazo de garantia legal, aplicável a todos os imóveis é o de 5 anos do Art. 618 do C.C., porém só é válido para casos que comprometam a solidez e segurança.

Excetuando o prazo de garantia legal, prazos de garantia são decorrentes de uma relação contratual, e são diferentes para cada contrato. Mas de maneira geral trazem prazos diferentes para cada um dos sistemas da edificação.

Os prazos de garantia constantes na tabela abaixo, são referenciais não obrigatórios descritos na ABNT NBR15.575.

Sistemas, elementos, componentes e instalações

1 ano

2 anos

3 anos

5 anos

Fundação, estrutura principal, estruturas periféricas, contenções e arrimos.

 

 

 

Segurança e estabilidade global.

Estanqueidade de fundações e contenções

Paredes de vedação, estruturas auxiliares, estrutura e cobertura, estrutura das escadarias internas ou externas, guarda corpos, muro de divisa e telhados

 

 

 

Segurança e integridade

Equipamentos industrializados (aquecedores de passagem ou acumulação, motobomba, filtros, interfone, automação de portões, elevadores e outros)
Sistema de dados de voz, telefonia, vídeo e televisão

Instalação

Equipamentos

 

 

 

Sistema de proteção contra descargas atmosféricas, sistema de combate a incêndio, pressurização das escadas, iluminação de emergência, sistema de segurança patrimonial

Instalação

Equipamentos

 

 

 

sistema de segurança patrimonial

 

 

 

 

Porta corta fogo

Dobradiças e
molas

 

 

Integridade de portas e batentes

Instalações elétricas
Tomadas/ interruptores/ disjuntores/ fios/ cabos/ eletrodutos/ caixas e quadros

Equipamentos

 

Instalação

 

Impermeabilização

 

 

 

Estanqueidade

Esquadrias de madeira

Empenamento

Descolamento

Fixação

 

 

 

Esquadrias de aço

Fixação

Oxidação

 

 

 

Esquadrias de alumínio e PVC

Partes móveis (inclusive recolhedores de palhetas, motores e conjuntos elétricos de acionamento)

Borrachas, escovas, articulações, fechos e roldanas

 

Perfis de alumínio, fixadores e revestimentos em painel de alumínio

Fechaduras e ferragens em geral

Funcionamento

Acabamento

 

 

 

Revestimentos de paredes, pisos e tetos internos e externos em argamassa/ gesso liso/ componentes de gesso acartonado

 

Fissuras

 

Estanqueidade de fachada e pisos molháveis

Má aderência do revestimento e dos componentes do sistema.

Revestimento de paredes, pisos e tetos em azulejos/ cerâmica/ pastilhas

 

Revestimentos, soltos, gretados, desgaste excessivo.

Estanqueidade de fachada e pisos molháveis

 

Revestimento de paredes, pisos e tetos em pedras naturais
(mármore, granito e outros)

 

Revestimentos, soltos, gretados, desgaste excessivo.

Estanqueidade de fachada e pisos molháveis

 

Pisos de madeira – tacos, assoalhos, decks

Empenamento, trincas na madeira, descascamento

 

 

 

Piso cimentado, piso acabado em concreto, contra piso

 

Destacamentos, fissuras, desgaste excessivo

Estanqueidade de pisos molháveis

 

Revestimentos especiais (fórmica, plásticos,
têxteis, pisos elevados, materiais compostos de alumínio)

 

Aderência

 

 

Forro de gesso

Fissuras por acomodamento dos elementos estruturais e de vedação

 

 

 

Forros de madeira

Empenamento, trincas na madeira e destacamento

 

 

 

Pintura / verniz (interna e externa)

 

Empolamento, descascamento, esfarelamento, alteração de cor, ou deterioração do acabamento

 

 

² Nota: Os prazos referidos de garantia iniciam a partir da “Data de Entrega” ou “Data de Início de Uso”.

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Autores

  • Marcus Vinícius Fernandes Grossi

    Engenheiro Civil, é doutorando em tecnologia da construção pela USP; mestre em Tecnologia da Construção de Habitações pelo IPT; especialista em Excelência Construtiva e Anomalias pelo Mackenzie; em Gestão e Tecnologia da Construção pela POLI-USP; Inspetor de Estruturas de Concreto pelo IBRACON, ABECE e ALCONPAT. Atua como Perito Judicial, Assistente Técnico da Defensoria Pública e Ministério Público do Estado de São Paulo; professor universitário; palestrante de cursos de perícia e patologia das construções. É sócio-gerente da Fernandes & Grossi Consultoria e Perícias de Engenharia, onde atua com consultoria, perícias de engenharia, inspeção predial, entrega de obras, auditoria de projetos, normatização técnica, desempenho e qualidade das construções. Atualmente é membro da Divisão Técnica de Patologia das Construções do Instituto de Engenharia e associado da ALCONPAT - Associação Brasileira de Patologia das Construções. Lançou a obra “Inspeção e Recebimento de Obras/Edificações Habitacionais” (LEUD Editora, 2020).

  • Jornalismo Direcional

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