Um dos questionamentos que costumam ser formulados, mormente por causídicos que intentam realizar mais de uma atividade profissional, é o que diz respeito à possibilidade ou não de compatibilizar a profissão de advogado com a atividade de síndico condominial, profissional ou não.
Sobre esse tema, o Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil já se manifestou, descerrando o seu entendimento e posição. Assim é que, prima facie, não se olvida o direito do advogado de exercer outras atividades ou profissões, com a premissa de que estas devam ser realizadas em local diverso da prática jurídica.
Os preceitos éticos recomendam ao advogado a adoção de cautelas redobradas para que não se caracterize o ato de captação irregular de clientes, pois, segundo o disposto no Art. 34, Inciso IV, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), constitui infração disciplinar “angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros”.
Assim, qualquer conduta que se avizinhe de uma possível concorrência desleal pode culminar configurando uma grave infração de ordem ética, uma vez que comportamentos deste prisma possuem o potencial latente de impactar de maneira negativa toda uma classe profissional, na medida em que outorga privilégios indevidos e inadequados ao seu detentor, assenhorados por quem atua em desconformidade com as diretrizes elementares de sua profissão.
Ademais, os mesmos princípios éticos apontam para a necessidade de serem perquiridas hipóteses situacionais que podem ser erigidas ao patamar de um evidente conflito de interesses, uma vez que o advogado, em razão de seu próprio múnus, possui o dever de custodiar informações de seus clientes, mesmo uma obrigação de confidencialidade. Nesse sentido, preceitua o Art. 25 do Código de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil que:
“Art. 25. “O sigilo profissional é inerente à profissão, impondo-se o seu respeito, salvo grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se veja afrontado pelo próprio cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da causa.”
Esta situação pode, eventualmente, gerar confronto inevitável com o exercício da atividade de síndico condominial, cujo mister precípuo se apresenta sob o formato da gestão do condomínio, na linha delineada pela lei, e na esteira dos anseios esposados pela massa condominial.
Nesse sentido, alguns julgados do Tribunal de Ética da OAB apontam:
“Advogado e Síndico – O advogado deve sempre evitar a captação de clientela e a concorrência desleal que podem caracterizar infração ética – é dever do advogado resguardar sigilo perene das informações privilegiadas obtidas em decorrência do exercício da advocacia.
Precedentes: E-3.527/2007 e E-4.378/2014. Proc. E-5.214/2019 – v.u., em 26/06/2019, do parecer e ementa da Rel. Dra. Renata Mangueira de Souza, Rev. Dr. Jorge Radi Junior – Presidente Dr. Guilherme Martins Malufe.”
Assim, e conquanto algumas dúvidas incidentes sobre o tema da compatibilização da profissão de advogado com a da atividade de síndico possam encontrar razoável justificativa, outras, de cunho diversificado, podem se subsumir a graves infrações éticas, daí porque observamos a necessidade de fazer as devidas distinções a respeito das condutas que devem ser evitadas pelo advogado.
Em primeiro lugar, devemos consignar que não há nenhum tipo de vedação, nenhum óbice legal, nem mesmo vetor de natureza ética que impeça o advogado de assumir a função de síndico, por exemplo, no edifício em que resida; da mesma forma, inexiste qualquer tipo de óbice para que o advogado residente possa ser contratado pelo condomínio ou por um ou mais moradores do dita estrutura condominial.
Assim, da mesma forma como o Tribunal de Ética da OAB autoriza ao advogado o exercício voluntário de atividades junto a entidades associativas de cunhos diversos, da mesma forma, se permite ao mesmo profissional o desempenho de exercício de outras atividades laborais, uma vez observado o preceito de que tal não se dê, conjuntamente, na mesma localidade, com o exercício da advocacia.
Destarte, caso o advogado venha a ser o síndico do condomínio em que reside, nada obsta que possa atuar na defesa de interesses individuais ou coletivos dos condôminos, desde que não guardem qualquer relação com as questões de ordem condominial, hipótese em que aflora evidente descompasso e indiscutível óbice de natureza impeditiva.
Temos assim para nós que, uma vez consolidado o entendimento de que o advogado pode ser o síndico condominial, independente de residir ou não no mesmo espaço, por lógico e imanente consectário, inexistem obstáculos de ordem ética para que este posa atuar em ações diversas, a favor ou em sentido contrário aos interesses dos condôminos, asseguradas as premissas de que não sejam constatadas hipóteses de conflitos de interesses do condomínio onde o mesmo exerce a função de síndico, e desde que não seja esta mesma pessoa a detentora de informações privilegiadas que possam posicioná-la de maneira mais favorável em determinada ação.
Em idêntico diapasão, resta vedado ao advogado fazer o encaminhamento de demandas de condôminos, especialmente às vinculadas às questões de ordem condominial, para outros advogados que com ele se encontrem associados, visto que tal comportamento, também pelo fato de atentar contra a dignidade da profissão, se perfaz conformando possível infração dos preceitos éticos. Esse entendimento está em conformidade com o preceituado no Art. 34, Inciso III, da Lei 8.906/1994, segundo o qual constitui infração disciplinar “valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber”.
No mesmo sentido, a acumulação de atividades de representação legal de síndico condominial, com a de advogado, no exercício de causa em que se faça presente o interesse do condomínio, seja no polo passivo, seja no polo ativo, deve ser a todo custo evitada, medida profilática que encontra, inclusive, expressa previsão legal no Art. 1.348, Inciso II, do Código Civil, reforçando referida vedação de atuação profissional, a saber:
“Art. 1.348. Compete ao síndico:
(…)
II – representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns.”
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