Acessibilidade: sinal de alerta

Projeto de lei em discussão na Câmara Municipal de São Paulo pretende obrigar todos os condomínios residenciais a adotarem as normas de acessibilidade. É uma boa oportunidade para que síndicos e condôminos comecem a pensar seriamente sobre o assunto, não somente pelo aspecto legal, mas para assegurar condições de mobilidade a todos os moradores, incluindo os idosos, população que vem crescendo pelo aumento da longevidade.

Construído há cerca de 30 anos no Campo Belo, uma das regiões mais valorizadas, arborizadas e agradáveis de viver em São Paulo, o Condomínio Edifício Maison Du Rhone aprovou recentemente em assembleia a repaginação da área comum, adequando-a as atuais necessidades de seus moradores. Com uma bem cuidada torre de 18 andares e apartamentos em torno de 150 metros quadrados, o Maison Du Rhone possui amplo boulevard, piscina, gás individualizado, sistema de reuso da água, duas boas vagas de garagem por unidade e salão de festas e de jogos. É confortável e proporciona qualidade de vida aos condôminos, que desejam, no entanto, a sua modernização. Já a síndica Nelza Gava de Huerta quer aproveitar as futuras obras e melhorar as condições de acessibilidade do local.

O número de idosos residentes aumentou nos últimos anos, alega Nelza. Em seus 13 anos de gestão, Nelza já fez muito pelo condomínio, como a rampa atual, bem melhor que a versão anterior, e novas escadas da entrada principal da rua. Reservou uma vaga exclusiva para idosos ou cadeirantes na garagem e providenciou rampas no subsolo para acesso aos elevadores. Equipou os banheiros do salão de festas com pequenas barras de apoio. Mas os acessos do nível da rua, por escadas ou rampa, estão fora das especificações indicadas pela legislação e dificultam a mobilidade. Os elevadores, já reformados, possuem botoeiras em braile, porém, sua altura é inadequada para cadeirantes. Inadequados encontram-se ainda os corrimãos (das escadas internas e externas e da rampa), a própria inclinação da rampa externa, o piso em Miracema (irregular) bem como os desníveis existentes nas portas ou passagens dos diferentes ambientes das áreas comuns.

Estas e outras observações foram realizadas pela arquiteta Guiomar Leitão, conselheira do CREA, membro titular da Comissão Permanente de Acessibilidade da Prefeitura (CPA) e coordenadora do GT de Acessibilidade do Instituto dos Arquitetos do Brasil em São Paulo (IAB/SP). A convite da Direcional Condomínios e da síndica, a arquiteta visitou o Maison Du Rhone para verificar o padrão de acessibilidade do local. Pela idade de construção, o Maison Du Rhone não está obrigado por lei a promover as adequações, “mas se o fizer atenderá melhor ao seu público, especialmente ao idoso, às mães com carrinhos de bebês, aos portadores de deficiência visual ou de baixa visão e às pessoas que precisam ser removidas com macas”, destaca Guiomar. “Dona Nelza já percebeu essa necessidade e quer manter a edificação sempre atual, porque isso agrega qualidade de vida e valor de mercado. Há um grande número de condôminos com mobilidade reduzida, pelo próprio avanço da idade”, acrescenta a arquiteta.

HORA DE MUDAR

As edificações residenciais anteriores a 1992, ano da promulgação do Código de Obras vigente no município de São Paulo, estão desobrigados a cumprir com as normas, mesmo que passem por reformas. Isso não vale para os comerciais, que “não têm direito adquirido em termos de acessibilidade”, observa Guiomar. De qualquer maneira, está na hora dos residenciais começarem a se mexer, em função das discussões em torno do Projeto de Lei Municipal 680/2009, proposto em outubro do ano passado pela vereadora Mara Gabrilli. Tramitando pelas comissões temáticas do legislativo, a matéria, que ainda irá à votação em plenário e dependerá de sanção do prefeito caso aprovada, pretende que todas as edificações multifamiliares da cidade, agrupadas verticalmente, tornem-se acessíveis, independente de sua idade. O que está em discussão é justamente como fazer isso, já que muitos prédios antigos não comportam, por exemplo, a instalação de elevadores.

Segundo o secretário municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida, Marcos Belizário, pouco há o que fazer nesses casos, uma vez que existe a barreira estrutural, física. Por outro lado, o Código de Obras dispensa construções com até cinco andares ou 12 metros de altura da obrigatoriedade de oferecer o equipamento. Claro que a situação muda em relação a outros quesitos, como a exigência de rampas para imóveis posteriores a 1992, entre outros. Além disso, edificações construídas após a promulgação do decreto federal de 2004 (Confiram no quadro abaixo) devem ter toda área comum acessível, inclusive piscinas, acesso a portarias, salão de festas, de recreação etc. Muda ainda nos grandes empreendimentos, bem como nas políticas de habitações populares, afirma o secretário Belizário.

Segundo ele, o CDHU e a COHAB estão incorporando o conceito de desenho universal inclusive no interior das unidades, o que ainda é incomum em grande parte do mercado imobiliário. “Os imóveis de interesse social construídos hoje são acessíveis, com as especificações corretas de largura da porta do banheiro, de vaso sanitário mais centralizado, altura dos lavatórios, e encanamento distribuído de forma a atender à necessidade futura de instalação de barras de apoio”, relaciona Belizário. “Nas leis específicas de construção de habitação de interesse social (HIS) e moradia popular (HMP) é preciso que haja um apartamento acessível disponível no térreo e que a edificação contemple em seu projeto a instalação do elevador”, acrescenta.

Para a arquiteta Guiomar Leitão, é preciso investir mais na formação dos profissionais da área e também da engenharia para que comecem a projetar as edificações sob a perspectiva do desenho universal e da mobilidade. “O conceito foi esquecido, mas está sendo retomado, porque a expectativa de vida aumentou e com isso o número de idosos.” Já o secretário Belizário lembra que a cidade de São Paulo apresenta hoje 1,5 milhão de pessoas portadoras de deficiência, “mas contando com dificuldades de mobilidade, esse número amplia e muito.” Belizário recomenda aos condomínios recorrer a profissionais especializados para orientá-los a executar as adaptações.

 

FIQUE ATENTO

DECRETO FEDERAL 5.296/2004
Regulamenta as Leis Federais 10.048/2000 e 10.098/2000 e aplica a NBR 9050/2004. A adaptação às normas de acessibilidade para pessoas com deficiências ou mobilidade reduzida deve acontecer na construção, reforma ou ampliação das edificações, prevendo, inclusive, que a concessão de alvarás ou licenças de funcionamento esteja condicionada a isso. No entanto, o decreto não atinge aos condomínios residenciais de São Paulo anteriores a 2004.

LEI MUNICIPAL 11.228/1992 (CÓDIGO DE OBRAS E EDIFICAÇÕES – COE)
Edifícios comerciais ou residenciais construídos sob a vigência da lei devem atender a muitas regras de acessibilidade previstas neste Código.

DECRETO MUNICIPAL 45.122/2004
Estabelece, entre outros, sanções ao não cumprimento do decreto federal e das legislações municipais.

PROJETO DE LEI MUNICIPAL 680/2009
De autoria da vereadora Mara Gabrilli, em processo de discussão nas comissões da Câmara Municipal de São Paulo e também em audiências públicas, determina a obrigatoriedade de adaptação dos condomínios residenciais multifamiliares (acima de duas unidades e agrupados verticalmente) a adotarem as normas da acessibilidade, independente de seu ano de construção e conforme normas vigentes e futuras da ABNT.

Saiba+

Desenho Universal

O conceito de desenho universal trata de formatos, materiais e medidas empregados nas edificações e objetos de uso diário, com vistas a garantir sua acessibilidade a todas as pessoas, incluindo portadores de deficiências, idosos e todos aquelas que estejam com as condições de mobilidade reduzidas. Incorporado nas normas técnicas brasileiras (NBR’s) e legislações, baseia-se em sete princípios: no igualitário (uso equiparável para pessoas com diferentes capacidades); adaptável (uso flexível para um leque amplo de preferências e habilidades); óbvio (simples e intuitivo, fácil de entender, como as sinalizações, por exemplo); conhecido (informação perceptível, em diferentes códigos, como em braile); seguro (diminui riscos de ações involuntárias); sem esforço (é o caso, por exemplo, das medidas de inclinação das rampas, de forma a não sobrecarregar o esforço físico de idosos ou cadeirantes); abrangente (tamanho e espaço para o acesso e o uso). (Fonte: “Desenho Universal, um conceito para todos”, de Ana Claudia Carletto e Silvana Cambiaghi. Produzido pela vereadora Mara Gabrilli, com apoio da Company S.A.)


Matéria publicada na edição 149 ago/10 da Revista Direcional Condomínios

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