Administradoras próprias – sem espaço para aventuras

Condomínios que optam pela gestão própria de contas a pagar, folha de pagamentos, encargos, inspeções anuais obrigatórias, entre muitos outros, demandam profissionalização e participação maior dos moradores.

Condomínios que optam pela gestão própria de contas a pagar, folha de pagamentos, encargos, inspeções anuais obrigatórias, entre muitos outros, demandam profissionalização e participação maior dos moradores.

A profissionalização na gestão dos condomínios, especialmente naqueles em que os síndicos dedicam tempo integral à atividade ou contam ainda com o suporte de gerentes prediais, auxiliares administrativos e um conselho participativo, facilita a opção pelo modelo da autogestão. Neste, da emissão dos boletos da taxa condominial à folha de pagamentos, tudo pode ser administrado internamente, em escritório próprio. “É uma opção interessante para grandes empreendimentos, mas se torna fundamental criar uma estrutura interna, pois os condomínios não podem entrar em uma aventura de autogestão”, observa a contadora e administradora Cristina Muccio, consultora na área e coautora da obra “Administrando Condomínios”, feito em parceria com a advogada Evelyn Gasparetto.

A alternativa se justifica, conforme pondera Cristina, “se for bem feita e por pessoal qualificado, com corpo diretivo atuante, pois o condomínio tem que ficar atento à prestação de contas, ao balancete mensal, ver se não tem atraso no pagamento aos fornecedores”. Segundo ela, executar a folha de pagamentos, por exemplo, é tarefa complexa, “é preciso checar se os itens da Convenção Coletiva estão sendo cumpridos”. Há ainda o risco de se perder prazos junto ao Fisco e negligenciar a legislação trabalhista. Por outro lado, reconhece Cristina, o modelo traz como vantagem a possibilidade de acesso rápido e facilitado à documentação, além de controle maior dos gastos.

Para o síndico Miguel Lavieri Neto, que herdou a autogestão e desde 2002 está à frente do Edifício Terrazza Novos Rumos, o modelo permite “melhor gestão das despesas”, já que é possível “ver onde se gasta demasiadamente”. Empresário aposentado, Miguel diz que conta com uma equipe bem estruturada para administrar a imensa gama de demandas de um condomínio com o porte do seu, que apresenta duas torres e quatro blocos, com 112 apartamentos de alto padrão. Localizado na Vila Clementino, zona Sul de São Paulo, em região de intensa valorização imobiliária, o Terrazza Novos Rumos impõe ainda o desafio de que se mantenham os edifícios sempre cuidados e atualizados. Isento do pagamento da taxa condominial, assim como o subsíndico, Miguel afirma que tem o auxílio de um conselho consultivo bastante atuante, que se reúne a cada dois meses, em encontros abertos aos demais condôminos, em uma gestão que ele caracteriza como “participativa”.

Sua equipe de apoio é dada por 20 funcionários diretos, entre eles, doze porteiros, cinco auxiliares de limpeza, dois profissionais para a manutenção, além do próprio auxiliar administrativo. Mas a administração da folha é repassada a um escritório de contabilidade. O cargo de zelador acabou extinto na implantação da autogestão, relata Miguel, lembrando que na época, por volta de 1998, os condôminos optaram por essa via diante de problemas anteriores com má gestão e desvio de verbas. Segundo ele, a principal dificuldade que a administração própria traz está, justamente, na insegurança gerada nas trocas dos síndicos. Por enquanto ele tem sido eleito, sucessivamente e a cada ano, para continuar no cargo, “mas precisa haver um rodízio e aí surge a dúvida se não seria melhor contratar uma administradora”, diz.

SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE
Faz 18 anos que Rejane de Albuquerque atua como síndica e administradora do Condomínio Edifício Ana Carolina, localizado em Santana, zona Norte de São Paulo. Recebendo cinco salários mínimos e meio por um expediente que tem hora para começar, mas não para encerrar os trabalhos, ela defende o modelo da autogestão. Admite, entretanto, que é preciso muita disponibilidade.

Segundo ela, a autogestão foi aprovada em assembleia e está prevista na Convenção, solução tomada depois que o condomínio chegou a uma situação de quase insolvência, com dívidas junto à própria administradora. O condomínio se deu conta da precariedade financeira quando morreu o zelador e não havia verbas para o enterro nem para os acertos trabalhistas com os familiares, lembra Rejane. “Era conselheira na época, começamos a pedir a apresentação da documentação e a discutir a possibilidade da autogestão.” A decisão foi tomada em assembleia com grande participação dos moradores, que definiram pela extinção do cargo de zelador, pelo acúmulo das funções de gestor e síndico e por sua remuneração, sem que lhe coubesse, entretanto, a isenção do pagamento da taxa condominial.

No cargo desde então, Rejane lembra que herdou um quadro de elevada inadimplência, além de obras por fazer. “Metade do prédio devia”, conta Rejane, que hoje tem apenas um inadimplente e conseguiu dar uma repaginada no edifício de 128 apartamentos de um dormitório. Sua primeira medida foi substituir os prestadores de serviços, começando pelo de elevadores, seguida da renovação do quadro de funcionários. A inadimplência foi tratada individualmente com cada devedor e, em relação às obras, providenciaram-se equipamentos de segurança patrimonial e de prevenção contra incêndio. Houve, finalmente, a reforma da guarita e do salão de festas e a implantação da copa dos funcionários e da sala de ginástica.

De acordo com a síndica, o principal desafio da gestão própria foi vencer desconfianças e comprovar o profissionalismo. Rejane conta com um auxiliar administrativo e com o apoio externo de consultoria jurídica e contábil (esta realiza o processamento da folha de pagamentos e uma auditoria mensal sobre as contas). Sua equipe de colaboradores se completa com quatro porteiros, quatro garagistas, dois faxineiros, um serviços gerais e um folguista.

Já o síndico Arnaldo Ferri, colega de Rejane no Conselho de Síndicos do Secovi, conta com uma estrutura bem mais enxuta para a autogestão do edifício Sol Nascente, prédio de 16 andares e 80 apartamentos do bairro da Liberdade, em São Paulo. Em seu terceiro mandato, ex-diretor da área financeira de uma empresa e remunerado pelo condomínio desde a segunda gestão, Arnaldo administra o dia a dia, as contas e os balancetes com o apoio do zelador e de um escritório de contabilidade. O serviço de portaria e limpeza é terceirizado. Segundo ele, a autogestão funciona apenas se o síndico tiver formação ou experiência na área administrativa e financeira. “O despreparo é a grande dificuldade que a autogestão pode enfrentar”, avalia Arnaldo.

SISTEMA HÍBRIDO
Outra opção que está virando tendência em São Paulo é o sistema híbrido, em que grandes condomínios, mesmo que contem com o apoio de administradoras, montam quadro administrativo próprio para auxiliar na gestão dos espaços, equipamentos e compras. É o caso do Condomínio Ilhas Gregas, verdadeiro oásis verde do Jardim Paulistano, em São Paulo, com três mil metros quadrados de jardins, seis torres e 210 apartamentos de altíssimo padrão. O síndico e engenheiro Luiz Carlos França dedica boa parte de seu tempo à gestão condominial, contando com o suporte de um gerente predial, duas assistentes e seis funcionários de manutenção, além do quadro de portaria e limpeza, totalizando 46 funcionários diretos. “Essa estrutura toda não sai barato, mas compensa, pois é muito bom para o condomínio poder contar com soluções rápidas para as coisas”, observa Luiz França. Segundo ele, “não é possível gerenciar empreendimentos grandes somente à distância”.

Também o síndico Waldir Berger, do Condomínio Living Club Refuge, optou por montar um escritório interno, como complemento ao trabalho da administradora. Executivo aposentado e administrador de empresas, Waldir disponibiliza bastante tempo aos edifícios da Vila Leopoldina, na Zona Oeste da cidade, com o apoio de uma secretária. Ele diz que o maior benefício tem sido a possibilidade de realizar mais cotações entre os fornecedores de produtos e serviços, o que gera economia de 5% sobre o custo mensal do condomínio.

Para o advogado Cristiano de Souza Oliveira, esses modelos alternativos podem funcionar bem, desde que se busquem “profissionais habilitados para auxiliar, além do aperfeiçoamento constante”. No caso especial da autogestão, é preciso “assegurar que os atos praticados pelo síndico (que já é o administrador perante a lei) sejam corretos, devendo o condomínio se cercar de bons profissionais, pois autogestão não é sinônimo de ‘mais barato’, mas sim de controle”.


Matéria publicada na Edição 161 – set/11 da Revista Direcional Condomínios.

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