Afinal de contas, quem pode ou não votar em assembleia de condomínio?

Uma das principais dúvidas sobre o direito à participação na assembleia do condomínio diz respeito ao devedor que já está com acordo firmado com a administração, mas ainda não quitou o passivo.

A participação ou não de devedores em assembleia de condomínio, mesmo tendo feito acordo de pagamento, tem sido a grande dúvida dos síndicos e administradoras de condomínios, visto que se deparam com o Art. 1.335, inciso III, do Código Civil Brasileiro (Lei Federal 10.406/2002), que traz a menção da palavra QUITE em seu texto original:

“Art. 1.335. São direitos do condômino:
III – votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite.”

Esse texto abre uma grande discussão e divide não só os síndicos e administradores, mas também os operadores do Direito, advogados, juízes, doutrinadores, em duas correntes/opiniões divergentes.

Pontos de divergência

Em resumo, parte deles entende que o condômino que faz acordo parcelado não tem o direito a voto, pois conforme o artigo acima, não está QUITE com as suas contribuições e, além disso, argumenta-se que o acordo não descaracteriza a inadimplência. Já outra parte admite e considera que o acordo das cotas condominiais pressupõe novas condições de pagamento, desfazendo a dívida anterior e, inclusive, a condição de inadimplente, e rebate dizendo que o condômino nessa condição tem, sim, o direito a voto.

Para dirimir a problemática acima, precisamos aprofundar um pouco mais o conhecimento e a linha de raciocínio de cada uma das hipóteses, a saber: – Argumentos a favor da impossibilidade do voto para quem tem acordo

Como dito acima, os que defendem a impossibilidade do direito de voto, no caso de acordo em andamento, se resguardam na interpretação gramatical da palavra quite, constante do Código Civil, e defendem ainda que esse condômino em acordo não está em “pé de igualdade” com aquele que não tem parcelas de acordo em andamento, pois não tem nenhuma pendência, ainda que esteja a vencer.

Mas há pontos fracos. De fato, a interpretação gramatical é, sem dúvida, uma dos tipos de leitura do texto legal, mas não podemos esquecer que não é o único tipo de entendimento, temos diversas outras maneiras de interpretar as leis do nosso ordenamento Jurídico, tais como: interpretação histórica, que considera o tempo em que a lei foi editada; interpretação lógica, que visa buscar um significado coerente; interpretação sistemática, que visa analisar as normas jurídicas entre si, visto que o ordenamento jurídico é um todo unitário sem incompatibilidades; além de diversos outros tipos de interpretações.

Fato é que devemos interpretar as leis de forma harmoniosa, visando evitar qualquer tipo de antinomia e há quem diz que uma das formas mais corretas de se interpretar seria da forma sistêmica, pois conforme dito acima, o ordenamento Jurídico é um todo unitário que se completa entre as diversas leis, artigos e incisos, um tem com o outro completa interligação.

– Argumentos contrários à impossibilidade do voto para quem tem acordo (ou seja, argumentos a favor do voto para quem tem acordo em andamento)

As relações condominiais estão atreladas e reguladas pelo Código Civil, isso é fato, e existe previsão neste dispositivo, no Capítulo das Obrigações, que quando uma obrigação é descumprida, existem formas de pagamento indireto da mesma, entre elas, a NOVAÇÃO. Entende-se por novação o ato de o “Devedor contrair com o Credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior”, conforme previsto abaixo:

“Art. 360. Dá-se a novação:
I – Quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior.”

Percebam que isso é exatamente o que ocorre nos acordos de dívidas de condomínio, os condôminos são cobrados pelo síndico/advogado que disponibiliza a eles um parcelamento que substitui o passivo anterior. Normalmente nesse acordo consta o objeto da dívida, ou seja, os meses que estavam em atraso, bem como a nova forma de pagamento, como novas datas a vencer.

Quando essa negociação ocorre, de forma automática, estamos diante de uma NOVAÇÃO, conforme previsão acima, ainda que do termo não conste a palavra “novação de dívida”, mas sim, “Confissão de Dívida” ou “Acordo Extrajudicial”.

Estando, então, diante de uma novação, com todos os atributos a ela pertencentes, e interpretando as leis de forma sistemática, conforme relatado acima, e não de forma gramatical e isoladamente, não se atendo tão somente à palavra quite, como os que defendem a teoria adversa, chegamos à conclusão de que os condôminos que têm acordo em andamento possuem total condição de votar nas assembleias e delas participar, pois não têm débitos, mas sim parcelas a vencer.

Consenso

Apesar das divergências, nos parece pacífico que a resolução desse conflito pode se dar pela Convenção Condominial, que pode tratar do assunto, definindo se o Condômino em situação de acordo tem ou não o direito de voto em assembleia. Isso com base no Art. 1.334 do Código Civil, incisos I e IV, onde diz que a Convenção disporá sobre o modo de pagamento das contribuições e as sanções, as quais, estão sujeitos os condôminos.


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Autor

  • Thiago Natalio de Souza

    Advogado sócio da Natalio de Souza Advogados, professor, articulista e palestrante, colunista de diversos jornais e revistas, consultor na área condominial. É diretor da Comissão de Direito Condominial da OAB SP- Vila Prudente, membro efetivo da Comissão Especial de Direito Condominial de São Paulo. Graduado pela Universidade São Judas Tadeu e pós-graduando em Direito Imobiliário, em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Escola Paulista de Direito (EPD).

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