Como calcular as multas aplicadas ao condômino?

É correto pagar juros e multa sobre a taxa de Fundo de Reserva ou Fundo de Obras do rateio condominial quando esta se encontra em atraso?

Existem diferentes tipos de multas que podem ser aplicadas aos condôminos como ferramenta de gestão do condomínio, previstas em lei e em normas internas, tendo como referência o valor da taxa de rateio, no entanto, moradores costumam questionar se devem entrar nesse cálculo os montantes relativos ao Fundo de Reserva, de Obras etc.

Vamos ilustrar a questão com o Fundo de Reserva, que é calculado sobre o valor da cota condominial, variando de 5% a 10% de tal arrecadação mensal. Já a cota condominial é cobrada sobre a fração ideal de uma determinada unidade. Por exemplo, caso esta tenha um valor hipotético de R$ 500,00, o Fundo de Reserva poderá corresponder a R$ 50,00, sendo, portanto, cobrado do condômino o valor total de R$ 550,00. Dessa forma, tanto a cota condominial quanto o Fundo de Reserva entram na definição de “contribuição” disciplinada pelo Art. 1.336, §1º, do Código Civil.

Deste modo, é possível cobrar juros e multa sobre o valor total de R$ 550,00 (além de outros fundos que estejam com arrecadação em curso), e não somente sobre R$ 500,00. Pois caso não fosse aplicada a multa e os juros moratórios sobre o valor integral da cota condominial, ocorreria o enriquecimento ilícito do devedor em detrimento dos condôminos que pagaram o boleto com pontualidade.

Ou seja, o condomínio pode aplicar multas sobre o valor integral do rateio tanto nos casos de atrasos no pagamento dos boletos quanto na forma de sanções pelo descumprimento das regras da Convenção e do Regulamento Interno (RI). Estamos falando aqui de dois tipos de multas: Aquela pelo não pagamento do boleto dentro do prazo, assim, o fato gerador é o atraso no cumprimento da obrigação de pagar a cota condominial; e aquela por descumprimento das normas da Convenção Condominial ou do RI, que tem como fato gerador a infração a tais normas. Porém, como o fato gerador é distinto, a lei prevê formas diferentes de aplicação dessas multas (mas sempre referenciadas sobre o valor integral do boleto).

Portanto, como calcular as multas aplicadas ao condômino?

Primeiramente, é importante diferenciar esses dois tipos de multa aplicáveis no âmbito dos condomínios, sendo a primeira pelo atraso no pagamento da cota condominial, que é a multa moratória pelo pagamento após a data do vencimento; e, o segundo tipo, a multa “compensatória”, que é aquela disciplinada na Convenção Condominial, destinada a compensar ou a reparar a coletividade condominial pelo descumprimento de tais disposições, sendo, neste caso, o descumprimento total ou parcial do que dispõe a Convenção, devendo constar nesta os valores das respectivas penalidades.

O atual Código Civil, em vigência desde janeiro de 2003, determinou o limite da multa aplicável ao condômino inadimplente da cota condominial, passando de 20% para 2%. Anteriormente à vigência do atual Código Civil, a Lei nº 4.591/64 previa, no Art. 12, §3º, que a multa a ser aplicada era de 20%, mas no caso de mora por período igual ou superior a 6 (seis) meses, conforme reproduzimos abaixo:

“Art. 12. Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio.
[…]

§3º. O condômino que não pagar a sua contribuição no prazo fixado na Convenção fica sujeito ao juro moratório de 1% (um por cento) ao mês, e multa de até 20% (vinte por cento) sobre o débito, que será atualizado, se o estipular a Convenção, com a aplicação dos índices de correção monetária levantados pelo Conselho Nacional de Economia, no caso da mora por período igual ou superior a 6 (seis) meses. […]”

Tanto a multa por atraso na cota condominial quanto o descumprimento da Convenção Condominial foram disciplinados pelo Código Civil no Art. 1.336, caput, incisos e parágrafos, bem como no Art. 1.337.

No caso do atraso do pagamento do boleto, temos:

“Art. 1.336. São deveres do condômino:

I – contribuir para as despesas do condomínio, na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;

II – não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;

III – não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;

IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

§1º. O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

§2º. O condômino que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.”

Nesse sentido, importante destacar que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) fixou a tese de que a multa por atraso no pagamento das cotas, mesmo nos condomínios que possuem convenção anteriores a janeiro de 2003, deve ser de no percentual máximo 2% (sobre cada cota).

Quanto às sanções por infrações à Convenção e ao RI, temos:

Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.”

Valor muda dependendo do tipo de penalidade

Enquanto a multa por atraso no pagamento da cota condominial deve ser limitada ao porcentual de 2%, com a aplicação dos juros de 1% ao mês, a multa por descumprimento das disposições da Convenção Condominial e do Regimento Interno deve estar regulamentada na Convenção, com valores calculados geralmente sobre o valor da cota condominial.

É importante ressaltar que a cota condominial em atraso, abrangendo as despesas ordinárias ou extraordinárias, como o Fundo de Reserva, Fundo de Obras etc., é um título executivo extrajudicial, conforme dispõe o Art. 784, X, do Código de Processo Civil:

“Artigo 784. São títulos executivos extrajudiciais:
[…]

X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas.”

Fique atento à cobrança dos honorários advocatícios

Quando existe a cobrança judicial de tais valores, no entanto, é importante destacar que o advogado responsável pela ação deve juntar as contas aprovadas em assembleia, incluindo eventuais rateios ou qualquer outro valor deliberado e aprovado pelos condôminos, daí a importância em se registrar todas as atas das assembleias gerais.

Também é muito comum o profissional incluir na planilha de atualização do débito em aberto da cota condominial não somente os juros de 1% ao mês e a multa de 2%, como também o valor de 10% de honorários advocatícios, o que é proibido segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

Ao decidir que o condomínio é credor dos valores cobrados judicialmente, o juiz em geral fixa os “honorários de sucumbência”, que em geral são de 10%, portanto, o devedor não pode ser cobrado em duplicidade em relação aos honorários, pois neste caso haveria a inclusão na planilha de honorários e posteriormente a determinação judicial de honorários.

A decisão do STJ que respalda tal determinação é a seguinte:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. 1. PENALIDADE DO ART. 940 DO CC/2002. MÁ-FÉ NÃO CONSTATADA PELA CORTE DE ORIGEM. SÚMULA N.7 DO STJ. 2. AFRONTA AOS ARTS. 389, 395 E 404 DO CC. HONORÁRIOS CONTRATUAIS. RESSARCIMENTO PELA PARTE ADVERSA. IMPOSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CASA. SÚMULA 83/STJ. 3. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. […]”

No que se refere ao pedido de ressarcimento de honorários contratuais, o Colegiado estadual assim se manifestou (e-STJ, fls. 832-833):

“[…] O art. 20, caput, do Código de Processo Civil estatui que ‘a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria’. […]

Da mesma forma, o contrato de honorários, firmado entre o advogado e o constituinte, vincula apenas as partes deste negócio jurídico.

Aqui incide a regra de que o contrato é res inter alios acta, ou seja, esse ajuste realizado entre as partes contratante, em princípio, não aproveita, nem prejudica terceiros. […]

Respeitado entendimento em contrário, a questão deve ser dirimida pela norma, acima já transcrita, do próprio Código de Processo Civil. O art. 20 do Código de Processo Civil já dispõe sobre o devido ressarcimento ao vencedor da demanda, não apenas quanto às custas e às despesas processuais, mas também com relação aos honorários advocatícios, questão relacionada ao ônus do exercício do direito de ação.

Com efeito, a jurisprudência desta Corte está pacificada no sentido de que não existe a obrigação de reembolso dos honorários advocatícios contratuais despendidos pela parte vencedora da demanda.

É que não se mostra crível atribuir à parte adversa da demanda, que não possui nenhuma relação com o causídico da outra parte, o dever de arcar com os honorários convencionados com base em critérios por demais particulares e subjetivos. […]

Nesse sentido, verifica-se que o julgado recorrido está em sintonia com a jurisprudência deste Tribunal. […]

Assim, constatado, na espécie, que a conclusão alcançada pelo Tribunal de origem encontra-se em perfeita harmonia com a jurisprudência desta Casa, é caso de incidência do enunciado n. 83 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.”

(Recurso Especial nº 1652313-SP – 2017/0024404-2. Relator: Min. Marco Aurélio Bellizze. Brasília, 27 de março de 2017).

Já na multa por infração à Convenção condominial, ressalte-se, é preciso que a administração garanta o direito de defesa ao condômino, conferindo um prazo razoável para tanto, sendo o “recurso” submetido à análise pelo Corpo Diretivo, sendo recomendável fazer a ratificação da multa em assembleia caso seja necessário cobrar judicialmente tal valor.

Neste caso específico a multa pode iniciar, por exemplo, em 50% do valor da cota condominial ou outro valor dependendo da gravidade da infração aos dispositivos da Convenção e do Regimento Interno, tendo parâmetros distintos em cada condomínio.

Previsão no Código de Processo Civil

Além das considerações acima, registra-se que o Art. 784, X, do Código de Processo Civil, determina que a multa por atraso no pagamento das cotas condominiais deve ser aplicada também sobre o Fundo de Reserva ou Fundo de Obras, eis que tais valores englobam as contribuições que o condômino deve pagar.


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Autores

  • Irina Uzzun

    Advogada sócia do escritório Irina Uzzun Sociedade de Advogados, professora universitária, pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD) e mestranda em Soluções Alternativas de Controvérsias Empresariais pela EPD. Irina Uzzun foi síndica orgânica do Condomínio The Spotlight Perdizes, em São Paulo, durante 5 mandatos seguidos. Atuou como síndica profissional.

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