Condomínios e a obrigação da vacinação

Com mais de um ano e meio desde a chegada da pandemia do novo Coronavírus no País, hoje começamos a vislumbrar um retorno gradual à normalidade. Como no resto do mundo, isso só é possível por conta da vacinação em massa.

Hoje, no Brasil, chegamos a quase ¼ da população totalmente vacinada, isso quer dizer, tendo tomado a primeira e a segunda dose ou uma única vacina, como nos casos de dose única. Tendo isso em vista, a questão que se coloca em várias instâncias é se é possível obrigar as pessoas a estarem vacinadas. Por exemplo, essa é uma questão premente na área trabalhista, onde se discute se as empresas podem obrigar os funcionários a se vacinarem.

Na esteira desse assunto, os condomínios também vêm se questionando sobre a legalidade ou não de obrigar funcionários e, principalmente, condôminos a se vacinarem.

Essa é uma questão complexa, pois atinge, nesse caso, dois grupos diferentes. No caso dos trabalhadores, não há consenso entre os especialistas e juristas. Porém, em dezembro de 2020, o STF decidiu que a vacinação contra a Covid-19 é obrigatória e que sanções podem ser aplicadas em relação àqueles que não se vacinarem.

Além disso, a empresa pode usar o argumento de que essa é uma questão de interesse coletivo e, por conta disso, deve garantir um ambiente seguro para todos que ali estão.

Tendo isso em vista, tivemos uma decisão em relação a uma auxiliar de limpeza que atuava em um hospital infantil em São Caetano do Sul (SP) e que foi dispensada por justa causa. A funcionária tentou rever a decisão, a qual foi mantida pela juíza Isabela Flaitt, em decisão proferida na 2ª vara do Trabalho de São Caetano do Sul, tendo como justificativa o entendimento do STF disposto no Art. 3º da lei 13.979/20 (ADI’s 6.586 e 6.587 e ARE 1.267.897). A juíza também mencionou o guia técnico do MPT que prevê em seu ordenamento o afastamento de funcionário e considera falta grave a recusa em se vacinar.

Já em relação aos condôminos, essa é uma questão de maior complexidade pairando a questão do abuso de direito de se fazer tal exigência versus a saúde coletiva. Mesmo tendo a decisão do STF em vista, a Corte completa que:

“(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, porquanto facultada sempre a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, (ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas, (iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade e (v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente; e (II) tais medidas, com as limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.” (STF. Plenário. ADI 6586/DF e ADI 6587/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski: Data de julgamento: 17/12/2020. Data de publicação:17/04/2021)

Nesse sentido, por mais que a decisão não tenha sido proferida tendo os condomínios como foco, é possível se fazer essa analogia, dado o fato de a decisão objetivar a coletividade.

Dessa forma, entendo que é possível sim que o condomínio regre o uso das áreas comuns, obrigando a comprovação da vacinação, para que o condômino/morador possa utilizar esse espaço. Isso porque o condômino tem o dever de “dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes” (conforme o Art. 1.336, Inciso IV, do Código Civil). Lembrando que a Constituição Federal garante a supremacia dos direitos coletivos sobre os direitos individuais.

Salutar que a decisão de exigência de vacina e restrição do uso de espaços seja tomada em assembleia, alterando a Convenção ou minimamente o Regimento Interno, para constar tal exigência nesses instrumentos que regem a vida condominial.

Porém, nem todas as áreas podem ser cerceadas, pois é garantido pela Constituição Federal o direito à locomoção do indivíduo, Art. 5º, XV, que prevê: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. Nesse caso, se enquadraria a questão do elevador, por exemplo. O morador não pode ser impedido de se locomover, podendo usar o elevador para poder sair de casa, assim como a garagem.

Hoje, a pandemia ainda não foi vencida, e só a vacinação em massa será capaz de fazer com que voltemos à normalidade. Além disso, as variantes vêm complicando essa situação. No momento, é a variante Delta que preocupa os especialistas.

Tendo todo esse cenário em vista, é preciso que a gestão do condomínio esteja atenta. Antes de tomar atitudes drásticas, é importante conscientizar a comunidade condominial da importância da vacinação. Para isso, a divulgação de informativos, tanto através de meio físico quanto digital, é de extrema importância. Dessa forma, a coletividade estará informada e atenta às diretrizes do condomínio.  

Autor

  • Rodrigo Karpat

    Advogado, especialista em Direito Imobiliário e administração condominial e sócio do escritório Karpat Sociedade de Advogados. É coordenador de Direito Condominial na Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB-SP, palestrante e ministra cursos em todo País, além de colaborar para diversas mídias especializadas. É colunista de sites e mídias impressas, além de consultor da Rádio Justiça de Brasília e do Programa "É de Casa", da Rede Globo. Apresenta os programas "Vida em Condomínio", da TV CRECI, e "Por Dentro dos Tribunais", do Portal Universo Condomínio.

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