Saiba identificá-las e como se prevenir
Pior que a frustração de um serviço mal feito, é a dor de cabeça que os síndicos têm para suspender contratos com fornecedores que descumprem o escopo dos trabalhos e ainda assim querem impor pesadas multas rescisórias. confira nesta reportagem os cuidados que devem ser tomados antes da contratação de serviços, conforme as dicas dos advogados márcio Rachkorsky e márcio Rodrigues de carvalho Barros.
Quando assumiu a gestão do antigo Palácio Zarzur e Kogan, atual Condomínio Edifício Mirante do Vale, no Vale do Anhangabaú, coração de São Paulo, o síndico Márcio Rodrigues de Carvalho Barros estava com um grande problema para resolver: colocar a casa em ordem, com seus 50 andares e 63 mil metros quadrados de área, já que o Contru tentara interditar a edificação por falta de segurança. Era o ano de 1986 e o edifício de 170 metros de altura (o mais alto do País), inaugurado em 1960, não andava lá bem conservado, era um gigante maltratado, com seus conjuntos comerciais vendidos quase ao valor da taxa condominial. E nesses 25 anos de administração contínua, não restou alternativa ao síndico senão promover sucessivas reformas, benfeitorias e modernizações, a ponto de exibir hoje a renovação do certificado de segurança do Contru, expedida em abril do ano passado.
Entre as obras necessárias, o Mirante precisava de uma repaginada externa na fachada. Contratou então uma empresa de engenharia para reforma e manutenção, mas, em lugar de trocar os elementos metálicos enferrujados, o prestador começou a disfarçar os pontos de ferrugem com massa plástica, entre outras irregularidades. “Conseguimos, de imediato, uma liminar para a suspensão dos trabalhos, e a empresa, em retaliação, abandonou tudo do jeito que estava, inclusive com os balancinhos pendurados na fachada. Ficamos um ano assim, até que tivemos que fechar um acordo, pagando à empresa um resíduo de serviço que consideramos satisfatório. Mas tudo isso é um dissabor muito grande para o condomínio, porque tivemos que pagar pela perícia e contratar outra empresa para retirar os balancinhos”, relembra Márcio Barros.
Para outro advogado de nome Márcio, o Rachkorsky, comentarista da rádio CBN São Paulo e do SP TV, da TV Globo, é justamente nas situações de rescisão contratual que os síndicos acabam tendo muita dor de cabeça. Fornecedores e/ ou prestadores de serviços acabam estabelecendo prazos alongados de contrato e nos casos de ruptura estipulam o pagamento de pelo menos 50% do valor acordado no período faltante. “Isso é ilegal, abusivo e qualquer juiz do mundo anula esse tipo de cláusula, e ainda que se tenha assinado uma cláusula abusiva, é possível recorrer ao Judiciário e pedir a sua anulação.” Também é comum “multas surreais” nos casos de contratação direta de funcionários anteriormente terceirizados, aponta Márcio Rachkorsky.
Segundo ele, torna-se indispensável o apoio de uma consultoria especializada antes da assinatura dos contratos, em que os síndicos possam ser orientados sobre os objetos a serem descritos nas cláusulas. Entre eles, o que trata da “irretratabilidade e irrevogabilidade” do contrato. “Isso garante ao condomínio que a empresa não poderá revogar nem retratar o contrato, dá segurança jurídica ao síndico”, explica (veja demais cuidados sugeridos por Márcio Rachkorsky na página ao lado). O advogado ressalta que os síndicos, administradores e zeladores devem saber que podem fazer algumas exigências e, mais importante, não se dobrarem às pressões dos fornecedores. “Muitas vezes as empresas utilizam um contrato padrão, dizem que o jurídico não permite alteração e isso se torna uma relação unilateral e não bilateral”, observa. Caso, inclusive, esses fornecedores estabeleçam algum acordo para fixação de preços ou condições de serviços e contratos, os síndicos devem levá-los ao Procon, defende Márcio Rachkorsky. “É preciso denunciar as práticas abusivas, que podem ser consideradas até cartelização”, diz.
RESPONSABILIDADES
Márcio Rachkorsky ressalta que não há como dispensar a assessoria jurídica para a consecução dos contratos por outra importante razão. “É fundamental não tanto pelos valores, quanto pelas responsabilidades envolvidas.” O advogado lembra que os síndicos assumem responsabilidade civil, criminal, tributária, trabalhista e previdenciária em um único contrato. “A criminal, por exemplo, é a mais pesada, pois mexe com a integridade, liberdade, de uma hora para outra a vida vira e acaba num processo penal. Já a ambiental é inafiançável. Os síndicos precisam ficar atentos a isso, pois se for removido um exemplar da mata atlântica em uma reforma de jardim, eles podem ser presos em flagrante.”
Já o advogado Márcio Barros, síndico do Mirante, chama atenção, por sua vez, às eventuais práticas abusivas provenientes das concessionárias de serviços públicos. Ele próprio acabou tendo que negociar durante dois anos um orçamento da AES Eletropaulo para conseguir trocar a cabine de barramento do edifício, o que dependia de serviços da concessionária em sua rede de distribuição. A Eletropaulo orçara inicialmente o seu trabalho em R$ 277.491,20, relativos a material (cerca de R$ 220 mil), mão de obra (R$ 32 mil) e administração (R$ 25 mil), conforme descrito em ofício da própria concessionária, de 11 de setembro de 2007.
“Eles tentam impor as regras, mas você tem que ter conhecimento para discutir isso”, observa Márcio Barros.
Depois de muitas contestações técnicas ao orçamento, realizadas por um engenheiro contratado pelo Mirante, o escopo do serviço caiu a R$ 29.151,05, pagos pelo Mirante à concessionária no dia 1º de setembro de 2009. E Márcio Barros aproveita para deixar outra dica aos síndicos, relativa à chamada energia reativa – “é aquela energia que ‘sobra’ na rede quando se aciona as bombas, por exemplo”. Ela é detectada por meio dos relógios digitais e chegam à conta sob a rubrica de “multa devido a baixo valor de potência que incide sobre a energia elétrica”. No Mirante, essa energia representava um custo mensal de R$ 12.049,00 sobre o total de R$ 38.489,00, que acabou eliminado quando a administração do condomínio providenciou a instalação de capacitores em sua rede.
REQUISITOS FUNDAMENTAIS PARA ASSINAR CONTRATOS
Márcio Rachkorsky enumera abaixo um verdadeiro checklist dos cuidados a serem tomados pelos síndicos, zeladores, administradores ou gerentes prediais antes da assinatura dos contratos. são eles:
– Exigir a denominação do contrato (deixar bem clara a sua natureza, se é prestação de serviço, locação de máquina ou equipamento, manutenção etc.);
– Exigir a qualificação das partes, principalmente da empresa contratada, com endereço completo, cNpJ, documentos sociais. pedir cópia do contrato social, certificar-se de que a pessoa que está assinando o contrato consta como responsável legal pela empresa. pedir ainda jogo completo de certidões: junto ao distribuidor civil, de processo trabalhista, de falência ou concordata, Receita federal (que é conjunta com o iNss), Justiça federal, dos cartórios de protestos, do fisco municipal (iss e ipTU), certidão criminal dos sócios e certificado de regularidade de recolhimento do fgTs;
– 1ª cláusula: definir o objeto e o escopo do contrato;
– 2ª cláusula: incluir preço e forma de pagamento;
– 3ª cláusula: deixar as obrigações das partes bem delimitadas;
– 4ª cláusula: registrar as garantias e penalidades;
– 5ª cláusula: estabelecer prazos para execução do contrato, amarrando o cumprimento das etapas às formas de pagamento;
– 6ª cláusula: incluir a rescisão. Registrar as situações em que se pode rescindir e por quais motivos (justos ou não justos) e por quanto tempo é preciso fazer um aviso prévio.
demais cláusulas devem prever a “irretratabilidade e irrevogabilidade do contrato”, seguro (para complementar as garantias contratuais, como apólice de seguro de vida dos funcionários, mesmo que terceirizados) e eleger o fórum competente para eventuais pendências ou conflitos (deve estar localizado na sede do condomínio).
Matéria publicada na edição 154 fev/11 da Revista Direcional Condomínios
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