“A dívida condominial – como qualquer outra – também prescreve e se o síndico não fizer o seu dever de casa, pode vir a ser responsabilizado posteriormente pelos condôminos.”
A inadimplência nos Condomínios Edilícios aumentou significativamente nos últimos anos, principalmente diante da crise econômica e dos altos índices de desemprego.
A primeira conta a ser sacrificada é a cota condominial, deixando síndicos e administradores à deriva do que fazer, diante desse problema na economia que assola todo o País. Porém, é dever do síndico cobrar o condômino inadimplente (Art. 1.348, VII, Código Civil), sob pena de não conseguir pagar outras despesas que também são muito importantes ao condomínio, como a folha salarial dos funcionários e demais despesas de manutenção.
A bem da verdade é que o condômino adimplente paga pelo inadimplente, o que causa um sentimento de revolta e injustiça entre todos.
A dívida condominial – como qualquer outra – também prescreve e se o síndico não fizer o seu dever de casa, pode vir a ser responsabilizado posteriormente pelos condôminos.
O prazo prescricional é de 5 (cinco) anos, de acordo com Art. 206, § 5º, I, do Código Civil e o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“Recurso Especial Representativo de Controvérsia. Direito Civil. Cobrança de taxas condominiais. Dívidas líquidas, previamente estabelecidas em deliberações de assembleias gerais, constantes das respectivas atas. Prazo prescricional. O Art. 206, § 5º, I, do Código Civil de 2002, ao dispor que prescreve em 5 (Cinco) anos a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular, é o que deve ser aplicado ao caso. 1. A tese a ser firmada, para efeito do Art. 1.036 do CPC/2015 (Art. 543-C do CPC/1973), é a seguinte: Na vigência do Código Civil de 2002, é quinquenal o prazo prescricional para que o Condomínio geral ou edilício (vertical ou horizontal) exercite a pretensão de cobrança de taxa condominial ordinária ou extraordinária, constante em instrumento público ou particular, a contar do dia seguinte ao vencimento da prestação. 2. No caso concreto, recurso especial provido.” (REsp 1483930/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/11/2016, DJe 01/02/2017) – Grifamos.
Outra dúvida frequente é de quem o síndico deve cobrar. Do antigo proprietário cujo nome ainda consta na matrícula imobiliária ou do atual possuidor? Mesmo que este último se recuse em apresentar qualquer documento que demonstre a que título está no imóvel, como um compromisso de compra e venda não levado a registro, por exemplo (vulgo contrato de gaveta).
O Art. 1.334, § 2º, do Código Civil (Lei no 10.406/2002), equiparou os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas aos legítimos proprietários titulares de direitos aquisitivos na matrícula imobiliária.
Vale dizer, quem possui um contrato de promessa ou de compra e venda, ainda que não levado ao registro, também é equiparado pela Lei ao legítimo proprietário do imóvel, podendo exercer os mesmos direitos da posse, assim como participar de assembleias, votar e ser votado. Desse modo, porque não poderia ser igualmente cobrado pela dívida condominial na Justiça?
Para a cobrança judicial de um típico condômino, basta comprovar com a cópia atualizada da matrícula imobiliária a titularidade do proprietário. Contudo, quando quem está no imóvel há anos não é o proprietário, as coisas se complicam um pouco, pois nem sempre existe no cartório de imóveis o registro do compromisso de compra e venda ou do instrumento de cessão, para fins de equiparação tal qual sugerido no artigo acima.
O que fazer nesses casos?
Muitos colegas advogados insistem em tentar localizar o antigo proprietário, o que é um equívoco, data vênia, pois, na maioria das vezes o antigo proprietário é falecido e, ainda por cima, sequer foi aberto inventário. De modo que não existem um responsável (inventariante) para ser citado, o que contribui para o decurso do prazo prescricional, vez que apenas com citação válida é que a prescrição será interrompida.
Existe uma solução jurídica para resolver esse problema. A dívida condominial possui natureza “propter rem” (decorre do simples fato de possuir um bem). Logo, pode ser cobrada não só do condômino, cujo nome se encontra registrado no cartório de imóveis, mas de qualquer pessoa que esteja na “posse” do imóvel e que tenha gerado ou não a dívida.
Inclusive, nos casos de arrematação do imóvel, o novo adquirente ainda assim responde por débitos anteriores à sua posse, podendo se preferir, promover ação regressiva contra o antigo proprietário, consoante já decidiu o STJ, que já consagrou no sentido de que os novos compradores respondem pelos débitos, mesmo referentes aos débitos anteriores à posse no imóvel. Veja:
“(…) Taxas condominiais em atraso. Cobrança. Possuidor do imóvel. Aquisição posterior. Legitimidade passiva. (…) 2. O adquirente de imóvel em condomínio responde pelas cotas condominiais em atraso, ainda que anteriores à aquisição, ressalvado o seu direito de regresso contra o antigo proprietário (…).” (AgRg no AREsp 215.906/RO, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe 28/03/2016) – Grifamos.
E ainda que exista um compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas condominiais pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto e se houve ciência inequívoca. Veja-se outro julgado do STJ:
“(…) Compromisso de compra e venda não levado a registro. Legitimidade passiva. Promitente vendedor ou promissário comprador. Peculiaridades do caso concreto. Imissão na posse. Ciência inequívoca. 1. Para efeitos do Art. 543-C do CPC, firmam-se as seguintes teses: a) O que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação. b) Havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto. c) Se ficar comprovado: (i) que o promissário comprador se imitira na posse; e (ii) o condomínio teve ciência inequívoca da transação, afasta-se a legitimidade passiva do promitente vendedor para responder por despesas condominiais relativas a período em que a posse foi exercida pelo promissário comprador. (…).” (REsp 1345331/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/04/2015, DJe 20/04/2015) – Grifamos
A estratégia é tentar comprovar que o possuído, de uma forma ou de outra, tinha conhecimento das despesas condominiais e até mesmo participava da vida condominial, devendo, assim, contribuir com às despesas de manutenção da edificação, como qualquer outro condômino.
Seria um absurdo aceitarmos que o possuidor, pelo simples fato de não ter um documento que lhe comprove a titularidade do imóvel, estaria dispensado das contribuições rateadas por todos. Referida situação acarretaria enriquecimento sem causa, o que é vedado pelo Art. 884, do Código Civil.
Todos os julgados citados acima condenaram os possuidores – não importando a que título estivessem no imóvel – sob o fundamento de que a dívida é real (propter rem) e que há comprovação de que o mesmo usufruiu dos serviços condominiais, além de documentos que comprovem a inequívoca “ciência” da cobrança e das responsabilidades condominiais, tais como: o envio de boletos, participação em assembleias, recebimento de cobranças, etc.
O Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), em vigor desde 18 de março de 2016, reduziu o caminho da cobrança com a fase executiva. A despesa condominial foi incluída no rol de títulos executivos extrajudiciais, dispensando toda a fase de constituição da dívida (conhecimento), iniciando-se o processo já na fase executiva, confira-se:
“Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas.”
Basicamente, será necessário para promover a ação de execução os seguintes documentos: i) convenção; ii) ata da assembleia que elegeu o síndico; iii) ata da assembleia geral ordinária que realizou a previsão orçamentária do exercício em débito; iv) demonstrativo do débito atualizado; v) dentre outros documentos que comprovam a inadimplência (exemplo: Boletos).
É bom destacar, ainda, que o juiz irá analisar todos os documentos, podendo até mesmo determinar a emenda à inicial e, segundo se extrai do Art. 785, do NCPC: a existência de título extrajudicial não impede a parte de optar pelo procedimento de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial.
Pelo novo processo executivo, o condômino será citado para pagar o débito no prazo de apenas 3 (três) dias, sob pena de não o fazendo, o Oficial de Justiça poder retornar a diligência e já proceder à penhora de bens de propriedade do condômino que encontrar, in verbis:
“Art. 829. O executado será citado para pagar a dívida no prazo de 3 (três) dias, contado da citação.
§ 1o Do mandado de citação constarão, também, a ordem de penhora e a avaliação a serem cumpridas pelo oficial de justiça tão logo verificado o não pagamento no prazo assinalado, de tudo lavrando-se auto, com intimação do executado.
§ 2o A penhora recairá sobre os bens indicados pelo exequente, salvo se outros forem indicados pelo executado e aceitos pelo juiz, mediante demonstração de que a constrição proposta lhe será menos onerosa e não trará prejuízo ao exequente.”
Outra alteração oportuna diz respeito à tentativa de citação e intimação do devedor. Anteriormente, o condômino-devedor se furtava ao recebimento das correspondências e Oficiais de Justiça, inclusive, constrangendo e ameaçando funcionários do condomínio (porteiros) com as mais variadas desculpas para se ocultar da Justiça, procrastinando o andamento da ação.
Segundo o artigo 248, § 4º, do NCPC, será válida a entrega do mandado (citação ou intimação) ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, in verbis:
“Art. 248, § 4º. Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente.”
Com relação às dívidas vencidas e vincendas, o condomínio poderá executar além das cotas vencidas até a distribuição da ação, aquelas que forem vencendo ao longo da lide. Como ocorre nas cobranças locatícias, visto que o débito condominial é de trato sucessivo (vence todo o mês).
Por uma questão de economia processual, a Lei já autorizava em seu Art. 290, do revogado CPC/73, a inclusão das parcelas vincendas no cálculo até a prolação da sentença, até porque, seria incoerente ao credor ter que ajuizar uma ação a cada mês, tumultuando o Judiciário. Inclusive, mesmo que a parte não requeira, o juiz tem por obrigação incluir tais parcelas na condenação imposta pela sentença, confira:
“Art. 290. Quando a obrigação consistir em prestações periódicas, considerar-se-ão elas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor; se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las, a sentença as incluirá na condenação, enquanto durar a obrigação.”
E, por fim, sempre é bom lembrar que a dívida condominial poderá acarretar na perda do próprio imóvel do devedor, mesmo se tratando do único bem de família, como já vem decidindo reiteradamente o STJ, confira:
“Agravo regimental no recurso especial. Cobrança. Taxas condominiais. Bens móveis guarnecedores da casa. Jurisprudência. Precedentes. Súmula nº 7/STJ. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que é possível a penhora de bem de família quando a dívida é oriunda de cobrança de taxas e despesas condominiais. (…).” (AgRg no REsp 1196942/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 21/11/2013) – Grifamos.
Dizendo com outros falares, o condômino devedor perde o imóvel se atrasar o condomínio.
Verifica-se que a dívida condominial pode e deve ser cobrada judicialmente e, se for bem cobrada, com a aplicação da Lei, apresentará bons resultados aos síndicos que não sabem mais aonde economizar para tentar fazer as melhorias necessárias no condomínio.
E o que é pior, muitos condôminos ainda acreditam que a dívida condominial não traz sérias consequências, ledo engano!
Recomenda-se sempre a consulta de um advogado especializado em condomínios para fins de instruir o síndico na melhor estratégia para a cobrança da cota condominial, com todos os documentos necessários e para que o condomínio não perca mais tempo ou acarrete a prescrição da dívida.
Por fim, não podemos nos esquecer dos “acordos” que são sempre bem-vindos e resolvem anos de briga na Justiça, além de serem mais econômicos para todos!!!
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