Hidráulica: gotas que valem dinheiro

Das intervenções simples à atualização dos materiais, passando por soluções ecológicas, o monitoramento constante do sistema hidráulico permite o uso racional da água, evita infiltrações e gera economia ao condomínio.

A mudança de posição de um “ladrão” então mal colocado na caixa d’água foi a grande responsável, em 2007, pela redução mensal de R$ 3 mil nas despesas do Edifício Carlos Eduardo, no Bosque da Saúde, zona Sul de São Paulo. “À noite, quando o consumo baixava, a água saía pelo ladrão. Jogávamos 500 mil litros”, detalha a síndica Wandinei Corrêa Aguiar Migliácio, há sete anos no posto. O exemplo dá bem o tom da importância da manutenção preventiva e corretiva nos sistemas e componentes hidráulicos.

Para Wandinei, essa necessidade era visível desde a sua mudança para o prédio, dois anos antes, pelos sinais de infiltração que observava na garagem. Além disso, havia vazamento em muitos dos 72 apartamentos distribuídos pelos dois blocos interligados do empreendimento. Ela dispunha da planta hidráulica, mas não tinha o mapeamento das colunas reparadas. O levantamento, feito por meio de consulta às antigas notas fiscais, acabou incorporado à documentação sistemática que ela adotou para as novas intervenções, incluindo fotos do antes, durante e pós-obras. “É para mostrar aos condôminos, mas também para o futuro, quando outra pessoa chegar”, justifica.

ADEQUAÇÃO ÀS NORMAS

Sua preocupação em estabelecer um programa de manutenção vai ao encontro das NBR’s 5.674/2012 e 14.037/2011, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A primeira, em síntese, trata de aspectos associados à implantação e gestão desse tipo de programa. Ela obriga o incorporador ou construtor a entregar o Manual de Uso, Operação e Manutenção (das áreas comuns) ao responsável pelo condomínio e o seu equivalente às unidades. A 14.037, complementar, indica como devem ser feitos os manuais e traz prazos sugestivos para a manutenção.

Cada edifício, no entanto, terá seus próprios prazos e maneiras específicas de executar a manutenção, enfatiza Ricardo Pina, engenheiro responsável pela coordenação do comitê que elaborou a NBR 5.674. Em um sistema hidráulico, exemplifica, as variações de vida útil (e os procedimentos de manutenção) dependem de vários fatores, como material utilizado (ferro galvanizado ou fundido, cobre, PVC, entre outros); número de andares; pressão; e equipamentos ao longo da rede – entre outros fatores. Prédios muito antigos, que não dispõem do manual, podem se inspirar nas normas para construir seu programa de manutenção.

O tema é complexo, mas demanda providências. O vice-presidente do Sindicato da Habitação em São Paulo (Secovi-SP), Carlos Borges, lembra que tramita no Congresso Nacional projeto de lei com o objetivo de estabelecer inspeções prediais para se conferir providências como essa. “No Brasil, a cultura da manutenção preventiva ainda tem muito a evoluir”, afirma. No pós-obra, acrescenta, o programa de manutenção (preventiva e corretiva) é um pré-requisito para se atingir um desempenho mínimo, conforme os parâmetros estabelecidos pela NBR 15.575, norma atualizada em 19 de julho último, em trabalho coordenado por Borges. “Essa norma estabelece o nível mínimo de desempenho para alguns sistemas (como estrutura, vedações, instalações elétricas e hidrossanitárias, pisos, fachada e cobertura) ao longo de uma vida útil”, explica. Obrigatória para o construtor, ela não se aplica, entretanto, às reformas e aos prédios antigos, por isso a manutenção é que preservará a saúde das edificações, inclusive a financeira, avalia o dirigente.

CONHECIMENTO E ORGANIZAÇÃO AUXILIA SÍNDICA

A síndica Wandinei recorda que a economia inicial com a conta de água, pela intervenção no ladrão da caixa, possibilitou substituir colunas sem necessidade de rateio. Paralelamente, todas as unidades foram vistoriadas, para regular as válvulas de descarga e sanar eventuais vazamentos – procedimento que se repete até hoje.

Além disso, as dez caixas d’água foram impermeabilizadas e instituiu-se a medição diária do hidrômetro, com vistas a detectar rapidamente alterações de consumo que sinalizem novos problemas. Até hoje, quando isso acontece, todos os apartamentos são vistoriados, buscando-se rápida correção de eventual vazamento. “O prédio é antigo, com 34 anos, e não tem medição individual de consumo, o que seria o ideal”, afirma.

Engenheira química, a síndica relata que percebeu no prédio a mistura de cobre com ferro em uma mesma coluna, o que “provoca corrosão galvânica”. Na troca, a opção escolhida foi o PVC. “Há muitos detalhes. Se tem caixa d’água intermediária e dependendo da metragem da coluna, é preciso colocar um redutor de pressão”, exemplifica. Já a tubulação para os hidrantes, também substituída, tem que ser em ferro ou em cobre, compara. “Fui me informar no Corpo de Bombeiros, porque esse é um projeto específico, cheio de detalhes.”

Atenta, no início de 2013 ela contratou um engenheiro civil perito, para relacionar e priorizar as obras necessárias do condomínio. A síndica trabalha amparada pelo conselho de moradores; decisões de assembleia para tudo o que não é emergencial; fornecedores profissionalizados; e um zelador, a alma do condomínio, conforme define. “As normas da ABNT também servem como orientação”, acrescenta. Ela explica que a manutenção hidráulica e das bombas é feita por equipes externas, especializadas.

CRIATIVIDADE TAMBÉM AJUDA

Há, no entanto, prevenções que não dependem de recursos, caso da coleta de óleo implantada há oito anos no Condomínio Edifício Girassol, prédio localizado no centro de São Paulo. A medida teve a adesão da maioria dos 74 apartamentos e reduziu o acúmulo de gordura e entupimentos na tubulação, afirma o síndico José Luiz Valerio. “Tentamos ser ecologicamente corretos. Recolhemos a água da chuva em uma cisterna. Com ela, molhamos o jardim e lavamos as áreas comuns”, exemplifica.

O Edifício Girassol, construído em 1953, já recebeu várias melhorias e, na parte hidráulica, a prioridade atual é instalar hidrantes nos 27 andares – processos em andamento. Mas existem atualizações que dependem dos moradores, que são orientados a substituírem as válvulas de descarga pela caixa acoplada. Preventivamente, há vistoria anual nas unidades contra vazamento, e a cada dois anos, reforço na impermeabilização das caixas d’água do prédio.

Matéria publicada na edição – 184 de out/2013 da Revista Direcional Condomínios

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