Vício em drogas, um drama para condomínios e familiares

O consumo de drogas representa um dos problemas mais delicados que os síndicos enfrentam nos condomínios. Sua abordagem junto aos moradores (usuários e/ou familiares) é complexa e demanda conhecimento mínimo das implicações do vício.

O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou em agosto passado que mais da metade (55,5%) dos estudantes do último ano do Ensino Fundamental no Brasil, menores de idade, já experimentou bebidas alcoólicas. O dado foi apurado pela Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), que revelou ainda ter havido pelo menos uma ocorrência de embriaguez em 21,4% desses adolescentes. Segundo o psicólogo Nelson Luiz Raspes, especialista em dependência química, o contato com o álcool está cada vez mais precoce e representa uma porta de entrada à doença do vício em drogas, lícitas (álcool) ou ilícitas. A situação se agrava diante da “falsa crença” social de que uma criança pode experimentar um pouco de álcool ou a espuma de uma cerveja sem que isso lhe traga implicações futuras, observa.

Colaborador da revista Direcional Condomínios, Nelson fez cursos na área pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade de Santa Catarina. Atua há 15 anos com tratamento da dependência química no Centro Bezerra de Menezes, em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. Segundo ele, “vários fatores contribuem para que os pais demorem a perceber que os filhos estão consumindo substâncias psicoativas e, quando descobrem, o impacto é muito grande”.

O problema afeta não apenas as famílias, quanto o próprio condomínio, principal espaço de socialização hoje de grande parcela da população residente nos maiores centros urbanos brasileiros. Pois mesmo diante de uma acusação ou evidência, seja por parte de um morador do prédio, funcionário ou síndico, os usuários “procuram formas de esconder a substância em locais estratégicos e, quando vão consumi-la, o fazem fora de casa”. De acordo com Nelson Raspes, o monitoramento das áreas comuns pode afastar, mas “não elimina o problema”. “O usuário sempre arrumará uma forma de consumir o que deseja, até mesmo dentro da casa de alguém que use junto. É comum consumirem ainda nos tetos dos edifícios e deixarem rastros, como restos de maconha ou mesmo cigarro”, acrescenta.

O especialista afirma que é necessário acesso à informação e orientação especializada para que pais e os gestores possam lidar de maneira adequada com as ocorrências. Ele costuma citar o caso da moradora de um prédio, cujo filho, em surto causado por um alucinógeno, desceu nu nas áreas comuns e acabou ameaçado por outro condômino. O importante, diz, é não apenas conhecer a doença, mas saber abordar o usuário e familiar diante de alguma ocorrência, preferencialmente de forma assertiva, objetiva. Nesse exemplo, o problema foi tratado como caso de polícia, quando deveria ter tido encaminhamento médico. “A repercussão de situações como estas trazem consequências graves para o usuário e para a própria família, que muitas vezes é convidada a retirar-se do condomínio.”

Claro que a administração deve coibir o uso em áreas comuns e solicitar que o dependente “procure outro local para consumo, pois as regras do condomínio devem ser seguidas”. Entretanto, “cada caso é diferente”. “Cabe ao síndico avaliar a gravidade da situação para eventualmente dirigir-se às famílias com propriedade e tomar as devidas providências dentro do regimento interno”, orienta.

NO CONDOMÍNIO

Gestor há três anos do Conjunto Residencial Moradas do Campo Limpo, na zona Sul de São Paulo, o síndico Eduardo José Aleixo diz que o serviço de ronda e monitoramento constante das áreas comuns evita o consumo de substâncias ilícitas e do álcool em espaços mais afastados do condomínio. Com quatro torres, 244 unidades e cerca de mil moradores, o Moradas do Campo Limpo possui ampla área (33.231 m2), com jardins, churrasqueiras, quadra etc. Na época em que assumiu o cargo, a atual estrutura de vigilância havia sido contratada e acabara de inibir alguns abusos, inclusive a concentração de jovens que se encontrava regularmente no estacionamento de visitantes para consumir bebidas alcoólicas.

De qualquer maneira, Eduardo Aleixo, engenheiro eletricista e professor universitário da área de logística, mobilizou um grupo de moradores para elaborar e aprovar novo regimento interno, atualizando as regras de uso dos espaços, de forma que os moradores respeitem a destinação desses ambientes, seus horários, bem como o direito dos demais condôminos. E quando ocorre algum problema, o diálogo vem antes de eventuais notificações e multas.

O síndico observa ainda que a Lei Antifumo, hoje adotada em todo País, contribui bastante para a ação dos gestores. Este foi um dos argumentos que Eduardo Aleixo utilizou recentemente para reter um cachimbo de narguilé que uma turma de adolescentes costumava esconder embaixo de um carro no estacionamento, para consumir o tabaco longe da vista dos familiares. “Eu disse a eles que só entrego aos pais”, destaca o síndico. O narguilé foi encontrado pelos funcionários da ronda. “Esses são orientados a ficarem afastados, mas sempre observando e dando sinal de sua presença, mostrando aos adolescentes que há uma pessoa atenta ao comportamento deles.”

Em três anos de gestão, Eduardo Aleixo nunca precisou notificar ou aplicar multas relacionadas ao assunto, resultado que ele atribui a “três ações primordiais”: a observação (sem ingerência); a iluminação das áreas comuns (eliminando pontos de sombras); e um regimento interno aprovado em assembleia, que assim pode respaldar a administração caso haja necessidade de uma ação mais enérgica.

Matéria publicada na edição – 217 – out/16 da Revista Direcional Condomínios

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