As recentes tragédias em edificações residenciais no Brasil (o edifício que ruiu em Fortaleza e a queda de uma marquise de um prédio em São Paulo) trazem novamente à baila a questão das enormes responsabilidades do síndico, sobre as quais muitos sequer têm uma noção completa do que representam para os condôminos, sua vida e patrimônio.
Quando um participante de assembleia se candidata ao cargo de síndico — um “tremendo abacaxi”, segundo a crença geral — nem sempre faz ideia das enormes responsabilidades que irá assumir, ou das dificuldades que certamente haverá de enfrentar.
Membro bastante atuante do Conselho de um condomínio desde 2011, eu já havia feito o curso de síndico profissional quando fui eleito síndico em 2016, e confesso que, mesmo assim, senti um frio na barriga ao assumir o cargo.
Já ciente das obrigações legais e do cuidado a observar em relação à segurança da edificação, foi na prática, conversando com engenheiros, prestadores de serviços e acompanhando a execução das obras que aprendi a identificar e prevenir riscos, a conhecer materiais e procedimentos e, até mesmo, a maneira correta de soldar canos de cobre.
Enfim, o exercício do cargo de síndico não se resume meramente a mandar fazer; é preciso, além de gostar desse trabalho, muita dedicação, envolvimento, e a constante busca de conhecimento.
Os desafios dos síndicos
Não raro, os síndicos irão enfrentar diversos desafios para fazer a manutenção predial. Vamos a alguns deles, os mais comuns.
– Restrições orçamentárias
Ao elaborar a previsão orçamentária anual, o síndico, especialmente aquele que herdar o pesado passivo de uma administração relapsa, dependendo de quanto eventualmente houver no Fundo de Reserva (que não é obrigatório por lei), deve sempre propor uma verba para manutenções extraordinárias porque, certamente, haverá muito a fazer, e várias poderão ser as situações emergenciais, até que o legado de omissão e negligência seja totalmente conhecido e eliminado.
– Discutindo custos
Às vezes, o síndico encontrará dificuldades em obter a aprovação das verbas necessárias, tendo de lidar com a discordância dos condôminos e do Conselho sobre os custos das obras, por mais necessárias que possam ser. A começar pelo mito dos “três orçamentos”, pois nem sempre bastará simplesmente escolher o menor deles, já que o preço mais baixo não será, necessariamente, a melhor opção — deve-se desconfiar de orçamentos muito abaixo e muito acima da média. E convém lembrar a importância da equalização dos orçamentos, prática que permite comparar, de maneira clara e justa, os produtos e serviços oferecidos por cada concorrente. Assim, será preciso explicar e justificar, paciente e didaticamente, os procedimentos e custos apresentados.
– “Herança maldita”
Décadas de abandono da manutenção preventiva representam a pior herança para novos síndicos.
Em todos os ramos de atividade, a prevenção é fundamental, pois permite reduzir custos, evitando acidentes, assim como danos aos componentes dos equipamentos e instalações. Não obstante, há gestores que preferem deixar para executar reparos somente em situações emergenciais ou de urgência, a chamada manutenção corretiva.
Ao encontrar uma edificação em estado de prolongado abandono, o gestor deverá identificar todos os defeitos existentes e expô-los à assembleia, por ordem de prioridade, apresentando os custos dos reparos e um plano de ação, enfatizando, quando for o caso, que determinadas providências não poderão ser adiadas.
– Gambiarras
Além de mais custosa, a manutenção corretiva irá onerar ainda mais os condôminos quando síndicos, por falta de conhecimento ou por omissão, permitirem que profissionais sem capacidade recorram a gambiarras, utilizando materiais inadequados ou executando serviços de maneira incorreta.
É por isso que os gestores devem se informar ao máximo sobre os produtos, equipamentos e serviços que forem adquirir ou contratar. E não convém deixar decisões importantes nas mãos do zelador ou gerente predial, porque a responsabilidade final será sempre do síndico, que deverá inspecionar a execução dos serviços e se encarregar da compra dos equipamentos de maior complexidade.
Falta de informação
A falta de informação sobre a necessidade da contratação de vistorias periódicas, perícias, laudos estruturais e do cumprimento das normas trabalhistas deixa o síndico e o condomínio vulneráveis a grandes riscos. As atividades profissionais estão sujeitas a várias exigências determinadas pelas normas do Ministério do Trabalho. O trabalho em altura (acima de dois metros), por exemplo, só pode executado por pessoas treinadas para tal, detentoras de certificado de capacitação para a norma NR-35. A utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs), inclusive por prestadores de serviços, deve ser fiscalizada e exigida com rigor.
Eis porque é imprescindível buscar conhecimento e cercar-se de profissionais gabaritados, de confiança, com boas referências.
Aprendizado
Concluindo, o exercício do cargo de síndico demanda um constante aprendizado. Acompanhar a execução dos serviços e aprender ao menos o básico a respeito de cada um deles e dos equipamentos utilizados em edificações é uma prática altamente recomendável.
É importante inteirar-se dos artigos 1.314 a 1.358 do Código Civil Brasileiro, e dos artigos 1º ao 27º da Lei de Condomínios e Incorporações (Lei 4.591/64).
Além disso, é importante ouvir os moradores e funcionários, que podem dar sugestões e informações muito úteis.
Relembre o caso mais recente: A tragédia do edifício Vila América
Quase um mês após o colapso do edifício Andrea, em Recife, Pernambuco, a queda da marquise do edifício Vila América, no bairro de Jardim Paulista, em São Paulo, no início da noite de 13 de novembro, atingiu dois jovens que conversavam debaixo dela, causando a morte de um deles e ferimentos no outro.
Segundo um jornal de grande circulação, técnicos da defesa Civil teriam identificado “infiltrações e reparos precários”. Por outro lado, noticiou-se que o síndico do Vila América disse, em depoimento à Polícia Civil, que o prédio foi vistoriado em junho por um engenheiro civil, que emitiu um laudo atestando a segurança da edificação. O engenheiro será chamado para prestar esclarecimentos e informar quais áreas do edifício foram vistoriadas.
Um engenheiro consultado pela coluna disse nunca ter visto algo parecido, referindo-se à estrutura de concreto, que considerou “deficiente”, sem ferragem suficiente para unir, com segurança, a estrutura do prédio à da laje da marquise. Seria a laje original, ou teria ela sido construída posteriormente?
Ao contrário do edifício Andrea, que apresentava várias colunas com a armadura exposta antes de ruir completamente na manhã do dia 15 de outubro, em Fortaleza, fruto de negligência e descaso, as circunstâncias que envolvem a tragédia do Vila América são nebulosas, e somente uma investigação detalhada e uma perícia aprofundada poderão revelar as causas do acidente.
Mediante esses dois acidentes graves envolvendo edifícios, no intervalo de apenas um mês, vale reiterar a importância da inspeção predial periódica e, não menos importante, o cuidado que se deve ter ao escolher os prestadores de serviço.
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