Direito real de laje: É possível sua aplicação nos condomínios edilícios?

A possibilidade de venda das superfícies superiores ou inferiores dos prédios através do registro do direito real de laje abre para os condomínios edilícios a possibilidade de captar recursos para investir em outras partes do próprio condomínio, aumentando inclusive o valor de mercado das suas unidades.

Antes de adentrarmos ao assunto e responder o questionamento, resta esclarecer o que seria o direito real de laje. O Ministério das Cidades criou em 2016 uma comissão multidisciplinar com o objetivo de atualização da lei que regia a regularização fundiária no País. Esta comissão foi formada por diversos profissionais, da iniciativa pública e privada, advogados, juízes, desembargadores, engenheiros e arquitetos urbanísticos dentre outros.

Abro um parêntese para ressaltar o problema que o Brasil enfrenta hoje devido ao fato de a metade dos domicílios urbanos existentes se encontrarem em situação irregular.

Membros da comissão tiveram a ideia de regrar o instituto da laje, tendo como principal objetivo a regularização da situação das comunidades (favelas), já que as construções que existem nestes espaços são irregulares e não possuem requisitos legais para regularização, bem como aumentar o potencial construtivo das cidades (construção de prédios residenciais sob as linhas dos trens, por exemplo).

A laje foi incluída no rol de direitos reais do Art. 1.225 do Código Civil, após a conversão da Medida Provisória 759/2016 na Lei 13.465/2017, regulada nos artigos 1.510 e seguintes da referida Lei.

Trata-se de um direito real novo, de propriedade, e que não se confunde com o direito de superfície, são direitos reais distintos.

O direito real de laje é facultativo para os municípios, que através dos seus planejamentos urbanísticos, optarão ou não pelo seu uso.

Basicamente, apenas para fins ilustrativos, o direito real de laje seria a constituição de propriedade autônoma, com registro e abertura de matrícula individualizada no cartório de registro de imóveis, de imóvel construído sob a laje ou subsolo de construção-base, concedendo àquele que reside sob a laje de um prédio (imóvel) o direito de ser proprietário de fato.

Apesar deste tema estar muito mais ligado ao direito imobiliário, notarial ou registral do que ao direito condominial, por que não podemos traçar um paralelo ao direito de laje, aplicando este direito nas superfícies superiores ou inferiores dos condomínios edilícios?

Hoje, é comum que alguns prédios, sejam eles residenciais ou comerciais, aluguem a parte superior destes edifícios, que estão sem uso, para empresas de telecomunicações que buscam a instalação de suas antenas em locais altos para melhoria do seu sinal em determinada região.

Considerando todo o exposto, podemos considerar como possível a hipótese de venda e não somente locação destes espaços para empresas de telecomunicações, através do direito real de laje, aumentando o ativo dos condomínios e gerando estabilidade para estas empresas.

Da forma que é feito hoje, as empresas de telecomunicações alugam os “topos” dos prédios sob prazo determinado para instalação das antenas. O investimento para instalação destas antenas é alto e gera insegurança para estas empresas, já que o contrato de locação poderá ser desfeito no término do prazo contratual. Com a possibilidade de compra destas áreas, a insegurança acabaria.

Podemos pensar mais adiante, não só em empresas de telecomunicações, como também, empresas que atuam com instalação de placas de energia solar.

O artigo 1.510-A da Lei 13.465/17 prevê:

“O proprietário de uma construção-base poderá ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo.”

Portanto, é plenamente possível que o condomínio edilício ceda a superfície superior da sua construção para uma empresa ou até mesmo um particular, que mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo. Veja ainda que a lei não estabelece limites para a laje, ou seja, esta poderá ser construída em cima de uma casa e até mesmo em cima de um prédio com quarenta andares.

No entanto, como estamos falando de alteração da área comum do edifício, deverá haver a aprovação de todos os condôminos em assembleia para realização de tal venda. O §6º do referido artigo assim estabelece:

“§ 6º – O titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as posturas edilícias e urbanísticas vigentes.”

Como o caput do Art. 1.510-A trata da laje como superfície superior ou inferior, pode-se considerar ainda a hipótese de venda de subsolo de um prédio, desde que sem utilidade para o mesmo e com a aprovação de todos os condôminos, para uma empresa de estacionamento, por exemplo. A empresa de estacionamento poderá comprar este subsolo e adquirir esta propriedade através de um direito real de laje, que será registrado no cartório através de abertura de matrícula autônoma.

Independentemente da superfície adquirida através do direito real de laje, seja ela superior ou inferior, o proprietário deverá respeitar a estrutura física do prédio, não podendo colocá-la em risco com obras ou falta de reparação à segurança, conforme disposto no Art. 1.510-B da referida lei:

“Art. 1.510-B. É expressamente vedado ao titular da laje prejudicar com obras novas ou com falta de reparação a segurança, a linha arquitetônica ou o arranjo estético do edifício, observadas as posturas previstas em legislação local.”

Destaca-se ainda o fato de o proprietário do direito real de laje ter que respeitar a Convenção condominial, o Regimento Interno e demais regulamentos do condomínio, tendo ainda a obrigação de pagar a taxa condominial relativa à fração ideal da sua laje.

Ressalta-se o fato de o direito real de laje ser matéria legal nova, regulada através de lei em 2017. Conforme pesquisa em sites de tribunais, não foram localizadas jurisprudências que discorram sobre o assunto. Nos cartórios de registro de imóveis também não foram localizados registros e aberturas de matrículas acerca deste direito. No entanto, ele existe e pode ser aplicado sim aos condomínios edilícios.

A possibilidade de venda das superfícies superiores ou inferiores dos prédios através do registro do direito real de laje abre para os condomínios edilícios a possibilidade de captar recursos para investir em outras partes do próprio condomínio, aumentando inclusive o valor de mercado das suas unidades.

O direito real de laje existe, foi regulado em lei e precisa de aprimoramento técnico-jurídico para passar para o plano de existência prática. Os profissionais da área condominial precisam estudá-lo e adequá-lo à realidade.


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Autores

  • Diego Victor Cardoso Teixeira dos Reis

    Advogado atuante nas áreas de Direito Condominial, Imobiliário e Recuperação de Crédito, sócio fundador do escritório Teixeira e Reis Advogados Associados. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie. Pós-graduado em Direito Imobiliário, Notarial e Registral pela Faculdade Legale. Vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da 56ª Subseção da OAB Osasco.

  • Jornalismo Direcional

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