Responsabilidade civil e criminal do síndico: Quando ocorre?

Caro(a)s colegas síndico(a)s! Sempre escutamos que o síndico responde civil e criminalmente pelos seus atos, no entanto, é importante diferenciar quando ocorrem estas responsabilidades mencionadas.

Recentemente acompanhamos o desabamento de um prédio em Fortaleza (CE), que deixou 9 mortos, incluindo a síndica e 7 feridos. Utilizando esse trágico incidente como exemplo e de forma meramente ilustrativa para melhor compreensão, tem-se que de acordo com as informações veiculadas até o momento, a empresa de engenharia poderá ser responsabilizada por não ter realizado a ancoragem dos pilares, pois existem indícios de que não tomou os cuidados necessários para evitar o acidente.

Na esfera civil, a empresa de engenharia poderá ser condenada a pagar uma indenização para as vítimas. Ou seja, a reparação pelos danos (materiais e/ou morais) seria feita por meio de um pagamento em dinheiro para aqueles que sofreram os danos, sendo que tais situações estão devidamente previstas no Código Civil. O engenheiro também poderá ser responsabilizado, mas quem responde inicialmente é a empresa (pessoa jurídica), pois esta é que foi contratada pela síndica.

Em relação à síndica, esta responderia somente caso fosse devidamente comprovado que ela não foi diligente na contratação da empresa e na fiscalização dos serviços. A sua responsabilidade deve se restringir à demonstração de culpa para que o evento danoso ocorresse, pois não é possível exigir do síndico uma conduta além da prevista em lei, como exemplo, obrigar que conheça sobre cálculo estrutural sem que seja especialista nesta área. O que poderia ter sido exigido da síndica é que esta verificasse a regularidade da empresa perante os órgãos de fiscalização e que exigisse a apresentação dos documentos necessários exigidos em lei. Não se pode “fechar os olhos” para tais obrigações.

Já na esfera criminal, o Código Penal determina que haverá responsabilidade se ficar comprovado o dolo (vontade e consciência) ou culpa (falta de cuidado), ou seja, é necessário considerar se a ação ou omissão resultou em um dano considerado crime. Caso os pilares da edificação em Fortaleza tivessem sido escorados, em cumprimento às normas da engenharia, possivelmente o desabamento seria evitado e, em consequência, as mortes e lesões nas vítimas. Quanto à síndica, esta responderia criminalmente caso fosse comprovada a sua omissão (pois poderia e deveria agir para evitar o resultado considerado crime no Código Penal).

Outra importante distinção entre as duas espécies de responsabilidade é que a civil pode ser objetiva, quando independe da culpa e ocorre quando uma determinada pessoa, mesmo sem a intenção de ter causado os prejuízos, terá a obrigação de indenizar. Por exemplo, se um adolescente de 15 anos danificar as áreas comuns do condomínio, os pais deste adolescente serão obrigados a pagar pelos danos causados. Vejam que não foram os pais que causaram os danos e estes certamente não tinham a intenção de causar prejuízos ao condomínio, mas a lei determina que eles são obrigados a indenizar aqueles que sofreram os danos, pois são responsáveis pelos filhos menores e pelos danos que estes causarem a terceiros.

Deve-se ressaltar novamente que esta ausência de culpa pelos danos causados ocorre somente quando está prevista em lei. A responsabilidade civil pode ser também subjetiva e ocorre quando é necessário comprovar a culpa de quem causou o dano, pois agiu com imprudência (sem as cautelas necessárias); com negligência (uma omissão ou falta de atenção, deixando de prever um resultado que poderia ser previsto); ou com imperícia (uma ausência de conhecimentos técnicos para praticar um determinado ato).

Já a responsabilidade criminal sempre será subjetiva, pois é necessário comprovar a culpa daquele a quem foi imputado um crime, eis que, em regra, a condenação penal gera uma privação da liberdade, ao contrário do que ocorre na condenação civil, que gera “apenas” uma diminuição do patrimônio daquele que causou o dano (indenização em dinheiro).

Tem-se que, de modo geral, é possível uma pessoa ser responsabilizada tanto no âmbito civil como no âmbito criminal.

Em relação ao condomínio, este tem a obrigação, por meio da pessoa do síndico, ao contratar um serviço prestado por terceiros, de solicitar os documentos relacionados à atividade que será realizada, em especial aqueles de segurança do trabalho, que são as normas regulamentadoras (NR 35 para serviços em altura; NR 10 para os serviços que envolvem eletricidade, por exemplo). Além da documentação, o síndico deverá fiscalizar se estas normas são atendidas na execução dos serviços, caso contrário, poderá ser responsabilizado caso ocorra um acidente no local (a morte de um funcionário, por exemplo).

A família da vítima poderá pedir indenização para a empresa contratante e, inclusive, ao condomínio, que não fiscalizou os serviços (é o caso da omissão na esfera criminal). Outro exemplo é o fato de um funcionário (terceirizado ou próprio) chegar sem condições para trabalhar (alcoolizado ou com qualquer outra limitação). O síndico deverá impedi-lo de exercer as suas funções, bem como se não quiser utilizar EPI (Equipamento de Proteção Individual).      

É importante mencionar que as responsabilidades são consideradas de acordo com a área a que pertencem, de modo que ocorrerá uma responsabilidade administrativa caso a pessoa tenha praticado um ato considerado ilícito perante a administração pública, como a falta de entrega de um documento junto à prefeitura, por exemplo, ocorrendo da mesma forma na esfera ambiental, fiscal, trabalhista etc. Destarte, em todas as situações deverá existir o que chamamos de “nexo de causalidade”, que é a relação existente entre a conduta do agente (aquele que causou o dano) e o dano produzido em razão desta conduta, ou seja, é necessário verificar que o prejuízo somente ocorreu em virtude de uma conduta do agente (uma ação ou omissão).
Inúmeras obrigações atribuídas aos síndicos vão muito além das obras e, caso estes não cumpram com isto, os condôminos podem – e devem – fazer com que elas sejam exercidas, ainda que pela via judicial. Espero que as informações tenham sido úteis para todos!


Matéria complementar da edição – 251 – novembro-dezembro/2019 da Revista Direcional Condomínios

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Autor

  • Irina Uzzun

    Advogada sócia do escritório Irina Uzzun Sociedade de Advogados, professora universitária, pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Paulista de Direito (EPD) e mestranda em Soluções Alternativas de Controvérsias Empresariais pela EPD. Irina Uzzun foi síndica orgânica do Condomínio The Spotlight Perdizes, em São Paulo, durante 5 mandatos seguidos. Atuou como síndica profissional.

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