“Logo que, numa inovação, nos mostram alguma coisa de antigo, ficamos sossegados; pois tudo que é novo assusta”
Friedrich Nietzsche
O setor condominial é muito resistente em aceitar inovações. Há anos a tecnologia possibilita aos condomínios uma gestão mais eficiente e não é diferente com a questão das assembleias.
No final da década de 90, início dos anos 2000, se debateu muito sobre a possibilidade de realizações de assembleias não presenciais, em ambientes virtuais, no entanto naquele tempo as limitações tecnológicas inviabilizavam a realização. A pandemia fez com que tais ideais voltassem ao debate, agora com mais segurança e tecnologia acessível a todos.
Diferente do passado, abriu-se um debate sobre a impossibilidade de realização, a possível insegurança jurídica e principalmente a falta de regulamentação legal.
Pois bem, tal debate isola o setor condomínio da sociedade e não aceita uma leitura e compreensão contextualizada da realidade, qual seja, as assembleias em ambientes virtuais em nada se distanciam das assembleias presenciais, apenas o local da realização não é presencial, mas toda a formalidade, se seguida, garante a segurança jurídica e legalidade do ato solene.
Considero que a realização de assembleias em ambiente virtual não depende de lei, uma vez que nos termos do art. 1334 do Código Civil, assembleia é uma matéria de competência da Convenção.
Vale destacar que em 2018, a Lei 13.777 introduziu em nosso ordenamento jurídico, com a inclusão no Código Civil o instituto da multipropriedade, que em seu art. 1358-Q, inciso VIII estabelece que os condomínios edilícios que adotarem o regime de multipropriedade, poderão em seu regimento interno prever a realização de assembleias não presenciais, inclusive por meio eletrônico.
Mas não é só. Também as empresas acabam tendo a possibilidade das assembleias não presenciais, nos termos do art 1080-A do Código Civil, já regulamentado pela Instrução Normativa 81/2020 do DREI (Diretoria do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração).
Há no congresso um Projeto de Lei que prevê a possibilidade expressa de assembleias condominiais não presenciais (PL 548/2019 – redação dada pela CCJ da Câmara dos Deputados), mas seria necessário, ou cada condominio poderia se autorregulamentar? Vejo que caberia a cada condomínio tal escolha.
O término de vigência da Lei 14010/2020 não deve ser impeditivo para realização de assembleias não presenciais, uma vez que nosso ordenamento jurídico, como visto, acata tal realização, sempre devendo seguir os trâmites da convenção.
Não é muito lembrar que para quem questiona a impossibilidade de assembleias em ambiente virtual para condomínios grandes, nossa Câmara de Deputados com 513 membros, realizou em 2020 e parte de 2021, bem como agora no início de 2022, sessões totalmente virtuais pelo aplicativo Zoom, com a diferença de que as normas lá debatidas e votadas valem para o Brasil! Seriam os condomínios diferentes?
O direito à voz deve ser estabelecido e o planejamento da assembleia passa a ser mais criterioso, pois podem as assembleias não presenciais serem mais longas.
Um roteiro prático pode ser seguido, garantindo a segurança jurídica e eficácia da solenidade-assembleia:
• Escolha da plataforma:
Deve o condomínio buscar uma plataforma que seja de fácil acesso, segura e que garanta a manifestação de todos, além da possibilidade de apresentação de telas pelos gestores, enquetes durante a reunião ou votação verbal e gravação de vídeo, som e manifestações escritas em chats;
O importante é que não se confunda com assembleia em ambiente virtual, consultas ou enquetes que ficam disponibilizadas por dias em sites. A assembleia é um ato solene que se não seguir o que diz a convenção poderá ser nula nos termos do art. 166, V do Código Civil.
Assim, a reunião ocorre em dia e hora agendados, e os presentes se conectam ao mesmo tempo.
Pode haver um formato híbrido, onde parte fica conectada e parte fica presencial, sendo que a estrutura para conexão entre o ambiente virtual e presencial deve ser garantido, ou seja, que todos saibam quem está participando, falando e deliberando.
• Solenidade:
Que se mantenha os trâmites da cerimônia, previsto em convenção, uma vez que somente o ambiente de encontro é virtual, ou seja: haja convocação, pautas definidas, horários para primeira e segunda convocação, escolha de presidente e secretário, confirmação de presença, pauta a ser seguida, exposição da pauta, manifestações dos presentes, deliberação e ata;
• Abrindo os trabalhos
Esclarecimentos iniciais dos procedimentos e chamada por unidade condominial para registro de presença, onde pode haver a confirmação verbal, ou o mais aconselhável por “chat”, evitando-se participação de estranhos;
• Proposta de protocolo a ser esclareci¬do previamente:
- i. Informação que toda a assembleia está sendo gravada;
- ii. Que todos os presentes mantenham o áudio desligado;
- iii. Que haverá alguns passos a serem seguidos para ordem dos trabalhos:
- Escolha do Presidente e Secretário;
- Leitura da ordem do dia;
- Exposição do tema pelo síndico ou administradora;
- Abertura para inscrição de ordem de manifestação dos interessados (via chat), e/ou chamada para manifestação por unidade;
- Abertura para deliberação por meio de enquete virtual na hora ou chamada por unidade;
- Proclamação da deliberação, excluídos os inadimplentes, caso estejam presentes.
• Finalização com elaboração de ata, a ser feita pelo secretário, que conterá todos os participantes, suas manifestações e deliberação, autorizando, conforme o caso, a feitura de ata eletrônica ou a utilização de ata notarial
Matéria publicada na edição – 275 – fev/2022 da Revista Direcional Condomínios
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