Seja retrofit, restauração ou reforma, obra de fachada tem valor alto; por outro lado, existem estratégias para fazer caixa, como mostra a experiência de dois condomínios paulistanos que persistiram no propósito e alcançaram resultado.
Na foto maior, frente do Edifício Rio Negro renovada; ao lado, na lateral do prédio, brise de madeira, que será substituído por versão de ACM (no detalhe à direita), material mais econômico e sustentável.
Antes de passar por limpeza, reparos e retrofit de fachada, havia um enorme descompasso entre o Condomínio Edifício Rio Negro e os seus atributos: imóveis com planta bem distribuída, garagens com depósito e vagas espaçosas para os veículos, além da localização, no entorno da Avenida Paulista. “O visual do prédio não era condizente com seu potencial”, comenta a síndica profissional Cassia Capuzzo. Desde que assumiu a gestão, há quatro anos, ela centrou esforços para tornar novamente segura e bonita a fachada da construção de 1970. Hoje a obra está na reta final, mas para isso, Cassia teve de vencer obstáculos.
O entrave inicial foi a parte financeira. “A cota condominial é alta, mesmo assim, antes mal cobria o fundo de inadimplência e a folha de pagamento dos funcionários”, relata a síndica. Aos poucos, ela conseguiu reverter a inadimplência. Quanto aos colaboradores, propôs trocá-los por terceirizados e enfrentou resistência dos moradores até que, enfim, concordassem com a mudança. “É compreensível que eles tivessem laços afetivos com funcionários muito antigos, mas eu precisei mostrar a realidade do condomínio. Tínhamos de fazer caixa”. Com essas medidas, além de um rateio entre os condôminos, foi possível custear a obra orçada em R$ 400 mil.
O Rio Negro, com uma torre e 12 andares, havia passado por manutenção de fachada uma única vez, quase três décadas atrás. Não à toa, antes da intervenção recente, a fachada estava deteriorada e as infiltrações já causavam umidade nos imóveis; o desgaste da vedação nos caixilhos permitia infiltração de água da chuva, inclusive nas amplas janelas frontais; e o revestimento de pastilhas, elemento presente nas quatro faces da fachada, pedia reparo urgente – o condomínio fora até notificado por um prédio vizinho, pois pastilhas caíram em seu terreno. Também o brise, elemento arquitetônico de madeira sob as janelas dos quartos, requeria troca, uma vez que partes apodrecidas poderiam desabar e causar acidentes.
Diante desse cenário, as doze unidades concordaram com a obra, que consistiu de etapas como lavagem (o que devolveu o viço às placas de granito da fachada principal), recuperação de trincas e reconstituição de pastilhas. Já o retrofit na lateral direita do prédio foi um capítulo à parte. Cássia sugeriu materiais mais modernos, leves e de manutenção mínima para substituir o madeiramento das janelas e do brise, como alumínio e placas de ACM (Chapas de Alumínio Composto), respectivamente. Para o brise, houve consenso, mas para as janelas não, acarretando em um vai e vem de assembleias.
Os condôminos decidiram-se por permanecer com as janelas originais, que se encontram na etapa de reforma. “Essa indecisão envolvendo as janelas foi bem cansativa e chegou até a atrasar o cronograma da obra, mas o importante é que deu tudo certo no final e sinto muito orgulho em ter participado desse movimento de revitalização”, assume Cassia.
Tijolo Aparente
A fachada do Las Vegas apresentava sujidade e danos em tijolos e pastilhas (foto à esq.); ao lado, plena recuperação.
Há 20 anos como síndico orgânico do Edifício Las Vegas, na Aclimação, região central de São Paulo, Dario Villaescusa acompanhou três restaurações: em 2003, 2012 e no início de 2022. Por ele, a última intervenção teria acontecido antes, mas tardou a ser realizada porque os condôminos não reagiram bem à ideia. “Os moradores não queriam aprovar a obra devido ao custo alto, então antes que o desgaste do tempo e da falta de manutenção trouxessem mais danos à fachada e encarecessem mais o valor, começamos a poupar dinheiro de modo que ninguém precisasse pôr a mão no bolso para a execução dos reparos”, relata.
Para atingir o montante necessário, primeiro o condomínio desligou os funcionários próprios e firmou contrato com uma empresa de serviços de portaria e limpeza. Aos poucos, migrou para o sistema de portaria remota, mantendo apenas uma quantidade mínima de colaboradores. “Com essas providências, as nossas despesas foram reduzidas consideravelmente e conseguimos economizar bastante para promover um up grade na fachada”, diz o síndico.
A edificação da Aclimação consiste de uma torre de 12 andares, com 48 unidades, construída por volta de 30 anos, tendo como característica marcante tijolos aparentes na maior parte da fachada, além de pastilhas brancas em algumas áreas, como nas sacadas, cujo forro de madeira remete às construções da década de 1990. “Mesmo que o forro da sacada fique mais preservado da ação das chuvas e poluentes, tratamos de envernizá-lo em todas as restaurações”, comenta Dario.
O síndico conta que nas três obras de fachada foram realizados, entre outros, serviços de limpeza com hidrojateamento, recuperação e impermeabilização, mas o resultado obtido não foi o mesmo. “O processo de restauro de tijolos é artesanal, o que é muito diferente dos prédios de alvenaria; nestes, se a parede é branca, é branca e pronto. Quando ocorre a substituição ou a recuperação de um tijolo é preciso igualar a tonalidade com a dos demais que compõem a parede. Quanto ao acabamento do próprio tijolo, o charme e a graça estão no fato de ele ser irregular, porém existem irregularidades que são aceitáveis, outras não”, pondera o síndico.
Profissional de estética dentária, Dario comenta ter um ‘olhar treinado’ para a harmonia e proporção das formas, o que faz dele exigente aos detalhes. Entretanto, salienta que restaurar a fachada vai além de preocupar-se com o visual do prédio. “Algumas áreas da fachada ficam mais expostas ao sol, à chuva, ao vento, ocasionando maior desgaste na impermeabilização dos tijolos, que são de natureza porosa. Se isso ocorrer, podem absorver água da chuva e a umidade atravessa para o interior dos apartamentos, comprometendo a mobília”, explica. E completa que também a parte de pastilhas precisa ser revista de tempos em tempos.
Na época da primeira reforma, Dario lembra que a fachada estava bastante comprometida, o que demandou uma obra grande. Mas por inexperiência sua e da empresa contratada, o resultado da intervenção ficou razoavelmente satisfatório. “Houve muita dificuldade em acertarem na tonalidade do tijolo e do rejunte. Numa obra, podemos questionar o resultado, conversar com o dono da empresa, mas existem momentos em que somos obrigados a nos contentar com o parcialmente satisfatório porque notamos que há um limite naquilo que o prestador pode te oferecer, então não adianta postergar a entrega”, explica.
Dario recorda que alguns empregados da empresa abandonaram o serviço no meio, restando apenas um deles, tornando a restauração ainda mais demorada. “Obras de fachada são grandes, custosas e causam tumulto no prédio porque o dia a dia das pessoas é alterado. Essa durou sete meses e terminou com um grande cansaço de todos os lados”. A má finalização, segundo ele, deixou defeitos constatados no pós-obra.
Na segunda intervenção de fachada no Las Vegas, a situação foi diferente. A empresa cumpriu o cronograma e pouco menos de quatro meses deixou a edificação com ótima aparência. Decorridos 18 meses, vizinhos procuraram o síndico para falar sobre o estranho aspecto da parede externa. Pelas janelas e sacadas dos moradores, Dario jogou água nos tijolos e constatou que a impermeabilização fora mantida. “Não sabíamos se os tijolos estavam impermeáveis em alguns lugares apenas, ou se a empresa aplicara algum produto inadequado. Notamos também alteração na cor do rejunte. A fachada foi ficando rapidamente descaracterizada, e não havíamos sequer fotografado o antes e depois da obra para questionar a prestadora de serviço”, lamenta o síndico.
Na última intervenção, entregue neste ano, Dario combinou com o zelador que fotografasse o passo a passo da obra, a fim de ter imagens documentadas para acionar a garantia caso venha a acontecer algo semelhante. “Acredito que não; percebemos o profissionalismo, foi de longe a melhor obra, com a melhor equipe que tivemos”, comenta, revelando que o condomínio gastou cerca de R$ 150 mil nesse processo.
Mais maduro e experiente, o síndico cuidou para que os funcionários se sentissem bem no condomínio, que descansassem nos intervalos e, por vezes, sentou com eles para comer uma fruta ou um bolo. “Se não proporcionarmos boas condições de trabalho, nem mantivermos bom relacionamento, há um grande risco de a obra não sair do jeito que imaginávamos”, acredita. Na etapa em que Dario avaliava as amostras de restauros dos funcionários, a maturidade deu o tom: “Se não acertavam a cor do tijolo ou do rejunte, eu procurava dizer de modo que não ferisse os sentimentos de quem fez o trabalho. Se acertavam, eu os elogiava”.
Sem sobressalto
Síndico e consultor condominial, Wolfram Werther dá sugestões para execução de obras em fachada. Confira:
Planejamento – Obra de fachada é cara e dificilmente os condôminos irão aprovar o valor bruto de um orçamento. “Recomendo iniciar o rateio dois a três anos antes da obra. Quando o condomínio já tiver uma boa reserva, fica mais fácil financiar o restante parcelando em até 10 vezes com a empresa que fará a obra, e existe maior chance de os condôminos aprovarem a execução.”
Custo extra – Nunca abra mão da manutenção. “Se aparece uma fissura que não é cuidada, vai evoluir para despesas. Haverá o custo direto da obra e os indiretos, pois uma fissura evolui para uma rachadura, podendo causar infiltração e estragos em apartamentos. O proprietário poderá acionar o condomínio para arcar com as despesas do tratamento e correção da parede, ou de eventual troca de móvel que fora comprometido. Já imaginou o custo de um marceneiro para fazer outro armário embutido?”
Funcionários – Wolfram recomenda exigir da empresa de reforma e pintura de fachadas a comprovação de que os funcionários estejam empregados em regime CLT, o que reduz a margem de problemas. “Uma vez fui avisado que dois trabalhadores da obra fumavam maconha no condomínio”, relata o síndico, pontuando que se tratavam de pessoas sem vínculos empregatícios.
Matéria publicada na edição – 280 – jul/2022 da Revista Direcional Condomínios
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