Recursos digitais ajudam, mas pedem regras, objetivos e monitoramento.
Os recursos de tecnologia digital otimizam operações de toda ordem nos condomínios, com a vantagem de dar mais tempo ao gestor para planejar e encaminhar soluções. E não é diferente na comunicação, hoje agilizada principalmente pelas redes sociais e aplicativos de troca de mensagens instantâneas via celular. O êxito das iniciativas, no entanto, depende de regras, objetivos e monitoramento para evitar conflitos. Além disso, há questões legais a serem observadas, aponta o advogado Alfredo Pasanisi, especializado em direito condominial. Entre elas, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD / Lei 13.709/2018) e a chamada “Lei do Stalking” (Lei 14.132/2021).
Crime de perseguição
A “Lei do Stalking” transformou em crime a perseguição, antes tratada como contravenção penal, sujeito à reclusão de seis meses a dois anos, além de multa e penas mais rígidas se ele for cometido contra crianças, adolescentes, idosos ou mulher, explica Pasanisi. O dispositivo inclui a perseguição feita por qualquer meio, “não está limitada ao ambiente digital”, acrescenta. O “stalking” se caracteriza por ser reiterado, a tal ponto que a vítima se sinta constrangida, ameaçada física ou psicologicamente; e/ou com restrição da capacidade de locomoção, da liberdade ou privacidade. É diferente, compara, do direito de expressão, de manifestar uma opinião contrária, ou insistir com perguntas quando a dúvida permanece. Também é diferente de um xingamento pontual ou feito diante do grupo de WhatsApp, mas ainda assim, alerta, esses casos podem ser considerados crimes de injúria e difamação, respectivamente.
Segundo Pasanisi, o bom senso deve predominar no uso desses canais. O especialista sugere a adoção de regras para grupos de trocas de mensagens criados pelos condomínios, com previsão de punições quando o combinado for descumprido. Aos síndicos ele alerta já existir precedente de condenação de administrador de grupo do WhatsApp, por danos morais, caso em que a vítima processou a pessoa que a ofendeu e, também, o administrador. Se a situação envolve o síndico como vítima, normalmente a decisão de buscar a Justiça é dele, como pessoa física.
Foco nas pautas
No Condomínio Central da Barra Arte, na Barra Funda, zona Oeste de São Paulo, assuntos como política, religião e futebol são proibidos no grupo de mensagens dos moradores. Se a postagem indevida não for apagada, em última instância pode ocorrer a expulsão, com retorno depois de três dias. “Não há conflito, a gente sempre consegue amenizar, as pessoas se ajudam, emprestam carro, trocam dicas de profissionais”, comenta o síndico Roberto Cardinalli.
Segundo ele, a interação tem contribuído bastante para o sucesso das iniciativas de caráter socioambiental e de sustentabilidade adotadas no condomínio de duas torres e 300 apartamentos. E melhorou com a criação de um canal exclusivo, com o mesmo aplicativo, apenas para divulgar assuntos administrativos. As informações são expostas ainda nos painéis multimídia dos elevadores. Já as reclamações ou dúvidas são encaminhadas através de diferentes canais: via e-mail (recebido por ele e os conselheiros); pelo livro da portaria; pelo inbox das redes sociais e “pelo zap”.
A parte do software de gestão é usada para questões administrativas na relação do condômino com o prédio e na parte de reservas de espaços, como o salão de festas, feitas diretamente no site. Feliz com os resultados, Cardinalli só ressalva que a intensa demanda afeta a privacidade do gestor. Por isso adotará um limite de horário para ser acionado e celular exclusivo para atender às demandas do condomínio.
Monitoramento
Organizar uma estrutura de comunicação é trabalho árduo, até que todos os envolvidos absorvam as regras, especialmente na comunicação instantânea, observa a síndica profissional Kelly Remonti. No Condomínio Top Village, em Alphaville, na Região Metropolitana de São Paulo, onde ela mora e atua há dez anos na sindicatura, a comunicação é uma das prioridades da gestão, visando a reduzir conflitos, mais comuns, segundo ela, quando as pessoas não se conhecem. Atualmente, um dos canais mais ativos é o grupo do WhatsApp. Mas o espaço exigiu ajustes. No começo, “as pessoas chegavam a postar 30 mensagens de bom dia”, exemplifica. O consenso foi adotar regras semelhantes às que já orientavam a página do grupo do condomínio em uma rede social, com foco nos eventos e campanhas, além da troca de informações úteis, como fornecedores e divulgação dos talentos do condomínio. São proibidos temas como política, religião, manifestações discriminatórias ou pejorativas, propagandas, notícias sensacionalistas, correntes e mensagens de autoajuda. “Eu monitoro diariamente e hoje já não dá tanto trabalho”, afirma Kelly.
A comunicação ganha contornos ainda mais complexos em um condomínio-clube com onze torres, 920 apartamentos e cerca de 3.500 moradores, como o administrado pela síndica profissional e moradora Nilvea Alcalai, na zona Sul de São Paulo. Em 2021, a gestora trabalhou o aperfeiçoamento dos canais internos de comunicação com os moradores, incluindo a atualização cadastral de todos. “Quando assumi tínhamos basicamente o e-mail e o site da administradora. De digital, praticamente nada.”
Instalar painéis informativos eletrônicos nos elevadores foi uma das primeiras medidas, sem custo para o condomínio, seguida de um aplicativo associado ao site da administradora. O morador baixa o app no celular ou computador para fazer reservas, como o horário na academia; mandar e-mail para administradora ou síndica; acessar boletos; além de informações sobre prestação de contas, atas e comunicados. Tudo tem sido adequado à LGPD, destaca Nilvea Alcalai, que formou um Comitê de Comunicação entre os moradores com vistas a aprimorar o portal do condomínio. “Tem que ser uma plataforma robusta, que comporte dez mil registros”, observa. A síndica destaca ainda o legado das assembleias virtuais, que emergiu na pandemia do novo Coronavírus e ajudou a ampliar a participação das pessoas. Elas agora acontecem em formato híbrido (presencial e remotamente).
Matéria publicada na edição – 274 – jan/2022 da Revista Direcional Condomínios
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