Justiça de SP declara inconstitucional regra condominial relativa a multas

Coproprietário questionou exigência de pagamento prévio de multa infracional para que seu recurso fosse analisado pela administração do condomínio, entre outras posturas consideradas improcedentes e ofensivas à legislação.

A Justiça de São Paulo considerou inconstitucional uma regra comum entre os condomínios, que condiciona a análise da defesa administrativa contra a aplicação da multa por infração condominial, ao pagamento prévio de seu valor. Na sentença, o juiz considerou ilícita a inclusão do valor da multa juntamente no mesmo boleto de cobrança da taxa condominial, quando pendente decisão de defesa administrativa.

O processo diz respeito a um coproprietário que representamos, de uma unidade condominial multada por suposto excesso de barulho. No entanto, o condomínio exigia que a análise do recurso do condômino, acompanhado da respectiva defesa administrativa, fosse precedida do pagamento da multa questionada.

A ação em favor do condômino foi interposta requerendo-se a declaração da inconstitucionalidade da regra condicional prevista na convenção condominial. A ação requeria ainda que fosse comprovado que os barulhos tivessem partido efetivamente da unidade multada, além de pleitear liminarmente que o valor do boleto condominial (o qual reunia tanto a taxa de rateio quanto o valor da multa) fosse depositado em juízo, evitando, com isso, a concretização da inadimplência do condômino. A liminar foi deferida.

O pedido judicial foi fundamentado na violação do direito constitucional do contraditório e da ampla defesa, uma vez que a exigência ao pagamento prévio da multa para análise da defesa administrativa seria a imposição da pena de forma antecipada.

Além disso, no caso específico, o condômino comprovou que a multa foi aplicada por análise unilateral de supostos áudios obtidos por aparelho celular. Pois não foi providenciada, pelo condomínio, antes da aplicação da multa, qualquer prova pericial técnica no aparelho que captou os áudios. Tampouco o ato administrativo que culminou com a interposição da multa foi realizado corretamente, posto que o condômino multado não foi ouvido nem existiu qualquer ata do Corpo Diretivo relativa à reunião que decidiu pela imposição da punição.

Sentença favorável a condômino

A sentença inicial decidiu pela declaração da inconstitucionalidade da regra condominial que previa a condicional do pagamento prévio da multa para análise da defesa administrativa. Também registrou que a imposição da multa somente poderia existir após esgotadas todas as instâncias administrativas de defesa. E registrou que a análise das defesas administrativas não poderia estar condicionada ao pagamento de qualquer multa. Como consequência, condenou o condomínio ao pagamento de honorários de sucumbência no valor de R$ 2.000,00.

Insatisfeito com a decisão, o condomínio interpôs recurso de Apelação, arguindo que a regra condominial contida na convenção é soberana, pleiteando sua validade, e desejando fosse diminuído o valor dos honorários sucumbenciais. O pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que manteve a decisão inaugural e ainda majorou o valor dos honorários de sucumbência. Segue a ementa da decisão:

CONDOMÍNIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. MULTA POR INFRAÇÃO A NORMAS CONDOMINIAIS. CONDICIONAMENTO DO PROTOCOLO DO RECURSO AO PRÉVIO PAGAMENTO DO VALOR DA MULTA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. NULIDADE DAS CLÁUSULAS DO REGIMENTO INTERNO E CONVENÇÃO CONDOMINIAL. ADEQUADA FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, MONTANTE QUE SE ELEVA EM VIRTUDE DA SUCUMBÊNCIA EM PLANO RECURSAL. RECURSO IMPROVIDO, COM OBSERVAÇÃO. 1. A imposição de multa por conduta violadora de normas de convivência entre condôminos está sujeita à prévia observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. A imposição da pena só pode ocorrer após o exercício do direito de defesa, que não pode ser condicionado ao prévio pagamento do valor da multa. 2. Não comporta acolhimento o pleito de redução da verba honorária sucumbencial, considerando que o montante fixado bem atende à realidade da causa e guarda estrita conformidade com o artigo 85, §§ 2º e 8º, do CPC. 3. Diante desse resultado, e na forma do artigo 85, § 11, do CPC, impõe-se elevar o montante da verba honorária sucumbencial a R$ 2.400.00. (004597-38.2018.8.2x.001)

Desse modo, a decisão judicial do Egrégio TJSP somente fez prevalecer os ditames previstos na Constituição, posto que as regras contidas em convenção condominial devem obrigatoriamente respeitar a Constituição Federal, por conseguinte, não há que se falar em soberania das decisões condominiais que colidem com os princípios constitucionais.

Além disso, é possível extrair que a imposição da multa condominial deve respeitar pressupostos básicos para sua aplicação, sob pena de invalidação de provas produzidas unilateralmente.

Por fim, em razão de ser uma declaração de inconstitucionalidade, a regra condominial que previa a condicional de prévio pagamento para análise de defesa administrativa deverá ser extraída da convenção e o condomínio não poderá condicionar a nenhum outro condômino o pagamento prévio da multa para análise da defesa administrativa do ato que decidiu pela imposição da punição peculiar.


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Autor

  • Alexandre Berthe Pinto

    Alexandre Berthe PintoAdvogado membro da Comissão de Direito Condominial da OAB-SP e da Associação dos Advogados de São Paulo. Cursou pós-graduação em Direito das Famílias e das Sucessões (EPD). É pós-graduando em Direito Aplicado aos Serviços de Saúde. Atua nas áreas do Direito Condominial, Fraude Bancária, Direito do Consumidor e Família e Sucessões.

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