Se um mau síndico consegue levar um condomínio à ruína, que dirá a união de um síndico incompetente com uma má administradora.
A figura do mau síndico tem várias facetas, como o prepotente que não ouve ninguém; o bem intencionado com pouco ou nenhum conhecimento; aquele que usa o cargo em proveito próprio e dos “amigos do rei”; o que é movido por interesses inconfessáveis; e aquele que assume o cargo mesmo sabendo não dispor de tempo para se dedicar ao condomínio, deixando tudo na mão do zelador e da administradora. E se o zelador não for competente, a coisa piora — há casos em que o zelador manda no prédio, literalmente.
Os bons síndicos — e vemos muitos bons exemplos nas reportagens da Direcional Condomínios — acompanham as obras, solicitam cotações diretamente, em vez de deixarem isso a cargo das administradoras, adquirem noções sobre a execução dos mais diversos serviços; enfim, estão em constante aprendizado e são abertos à colaboração dos condôminos e, principalmente, dos membros do Conselho.
Já os que se inserem na categoria dos maus costumam dispensar a participação até mesmo de membros do Conselho, fazem cotações sem dar satisfações a ninguém, decidem tudo sozinhos, como verdadeiros déspotas.
Com o tempo, toda pessoa arrogante, com suas verdades intransmutáveis, acaba tornando-se cada vez mais ignorante, justamente por não ouvir ninguém, deixando, assim, de oxigenar suas ideias.
A quantidade de obrigações legais às quais os condomínios estão submetidos é enorme, e, se a administradora não mantiver um controle do vencimento de todas elas, os riscos para o condomínio se multiplicam. Síndicos competentes e dedicados sabem quais são essas obrigações, mas os demais se mantêm extremamente dependentes das administradoras para cumpri-las.
Um capítulo à parte é o caso das administradoras que assumem o cargo de síndico pessoa jurídica — o que envolve um conflito de interesses, já que um prestador de serviços (a administradora) e o representante legal do condomínio não podem ser a mesma pessoa.
Muito menos o zelador pode se tornar síndico, pois, nessa hipótese, patrão e subordinado seriam a mesma pessoa.
É impressionante como, muitas vezes, torna-se difícil destituir um mau síndico, ou mesmo evitar sua reeleição, seja porque a maioria dos condôminos não comparece às assembleias, seja por não quererem se indispor com os vizinhos, ou porque o síndico “perene” manipula os poucos que as frequentam e obtém procurações de condôminos residentes e não residentes (estes, por vezes, não têm a menor ideia de como o prédio é administrado). Já os condôminos que não se conformam com a atuação de maus síndicos geralmente encontram dificuldades em obter os dados de contato dos demais condôminos para mobilizá-los — e é também aí que entram as más administradoras, dificultando ou simplesmente negando o acesso a tais informações, impossibilitando a convocação da assembleia por um quarto dos condôminos.
Assim, novos candidatos não se elegem porque não conseguem contato com a maioria dos condôminos; o síndico, mesmo sendo ruim, tem lá seus adeptos, e a turma que sempre ganha é aquela panelinha, que já vem com a “chapa” formada e uma pilha de procurações. Não são raros os casos de maus síndicos que se mantêm no cargo por 20, 30 anos.
Com o passar do tempo, toda guerra acaba provocando cansaço e indiferença. O absurdo se mistura aos afazeres diários. Pouco a pouco, instala-se no ambiente a banalidade do mal, invisível à nossa sensibilidade. E, dessa forma, anestesiadas, impotentes, as pessoas não mais se interessam por aquilo que, afinal, é o patrimônio de todos, conquistado a duras penas. Um amigo engenheiro civil me disse conhecer um prédio no bairro de Higienópolis em tamanho estado de abandono que a edificação se tornou praticamente irrecuperável. Ou seja, o investimento para essa recuperação seria demasiado alto.
É por isso que os condôminos devem se ocupar das questões do prédio, participando ativamente das assembleias — afinal, é o patrimônio de todos que está em jogo —, sempre de olho no binômio síndico-administradora. Quem disser não ter tempo de participar de assembleias irá pagar o preço lá adiante. Ou, sobre ser governado pelos maus, já disse o economista inglês Arnold J. Toynbee (replicando Platão): “O maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam por ela”.
Mas, afinal, como romper essa barreira imposta por síndicos que se apegam ao cargo por vaidade, ou por interesses inconfessáveis?
A revolta
A história mostra que, o mais das vezes, toda opressão prolongada desemboca numa revolta — Maria Antonieta que o diga… No caso dos condomínios mal administrados, quando o surreal se torna insuportável, chega-se ao ponto de ruptura, e, só aí, depois de anos ou décadas de desmandos, o mau síndico cai.
Vamos, então, à interessante história real de um enorme condomínio em São Paulo, dominado havia décadas por uma família cujos membros se revezavam no cargo de síndico, enfrentando a oposição de um grupo de condôminos, os quais também lutavam pela troca da administradora, com assembleias que, não raro, terminavam em brigas, com agressões verbais e até mesmo físicas.
O Regulamento Interno, aprovado pelo Conselho Consultivo sem a participação da assembleia, atropelando em parte a Convenção de Condomínio, estabelecia algumas regras draconianas e ilegais para a eleição de síndico e membros do Conselho, impondo aos candidatos a obrigatoriedade de formar “chapas” e registrá-las.
Nesse panorama, surgiu um novo candidato a síndico disposto a mudar as coisas por ali, mas ele havia sido impedido de registrar sua candidatura avulsa, sem “chapa”.
A disputa acabou sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário (Processo nº1110249-65.2018.8.26.0100, em grau de recurso), tendo a magistrada decidido que “não convencem os argumentos do condomínio de que o sistema de chapas criado teria escopo exclusivo de organização e regulamentação”. “Em verdade, tal mecanismo derradeiramente limita a representatividade de quem deseja se candidatar, pois exige que os candidatos se organizem previamente, se autoescolham na composição das chapas, impedindo, assim, a livre escolha, pela massa condominial em geral, de quaisquer candidatos para quaisquer cargos, como ocorre normalmente. Aqui, inovou o Conselho Consultivo, criando limitação não prevista em lei e que atenta contra o espírito do poder de voto e do direito de qualquer condômino adimplente de se candidatar.”
E prossegue: “A aprovação, ademais, da candidatura da atual administradora do condomínio como síndica não poderia ocorrer por motivo de conflito de interesses, justamente por já ser ela a empresa contratada pelo síndico para exercer a administração, sob sua supervisão. Vale dizer, na hipótese de eleição de síndico profissional pessoa jurídica (que [no caso] só poderá ocorrer na ausência de candidatos condôminos), ela deve ser diversa, formalmente e materialmente (não pode pertencer ao mesmo grupo econômico) da administradora. Deve ser assim, pois, do contrário, não haveria a devida independência e fiscalização mútua entre o trabalho e a prestação de contas de uma e outra”.
Entretanto, a luta continua, pois a antiga administração está recorrendo da decisão judicial de primeira instância.
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