Na terra onde um conto não pode mais ser de fadas. Verdades e mitos sobre a decisão do TJSP sobre o protesto

Conforme anunciado na mídia especializada, no dia 25/05/2011, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) julgou procedente a arguição de inconstitucionalidade em um processo que analisava a validade da Lei Paulista 13.160/2008, para um protesto em contrato de locação.

A decisão foi adotada em Órgão Especial do Tribunal de Justiça, por solicitação da 36ª. Câmara de Direito Privado nos termos da súmula vinculante no. 10 do Supremo Tribunal Federal, que assim determina:

Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art.97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte.

 

Logo, somente o plenário dos Tribunais, ou órgãos especiais dos mesmos, pode declarar inconstitucional uma lei, nos termos do art. 97 da Constituição Federal, que assim determina:

Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

A razão de tal preocupação legal é simples, a declaração de inconstitucionalidade não tem validade só para as partes, mas sim possui um caráter erga omnes e um efeito ex tunc, ou seja, serve para todos e leva a inexistência do ato praticado, mesmo que no passado.

 

Mas o que isto tem haver com condomínios?

Pois bem, desde a divulgação da decisão judicial, ainda que a mesma tenha em seu dispositivo final uma restrição de efeitos, válida apenas para os contratos de locação, não podemos entender de outra forma, senão como temerário o protesto de condomínios, senão vejamos.

A lei paulista mencionada acima, cita no mesmo item 7 que trata sobre contratos de locação, agora julgado inconstitucional, a possibilidade de protestos de condomínios:

 

I – o item 7:

“7 – (….), e ainda o crédito do condomínio, decorrente das quotas de rateio de despesas e da aplicação de multas, na forma da lei ou convenção de condomínio, devidas pelo condômino ou possuidor da unidade. O protesto poderá ser tirado, além do devedor principal, contra qualquer dos co-devedores, constantes do documento, inclusive fiadores, desde que solicitado pelo apresentante.”

 

Logo, o motivo para a inconstitucionalidade da lei paulista, teve os seguintes motivos:

a) Protesto é ato notarial, formal e solene que não constitui direitos, mas sim declara prova inequívoca de uma divida;

b) Protesto envolve matéria de ordem de Direito Civil e Comercial, que nos termos do art. 22, I da Constituição Federal, é de competência restrita da União e não dos Estados, não sendo o caso de uma competência concorrente, cujas hipóteses são elencadas no art. 23 da Constituição;

c) A Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo, já havia se posicionado que não basta possibilitar um protesto por lei estadual, há que se ter uma lei federal que o autorize, para que o mesmo seja valido;

 

Desta forma, fundamentou de forma clara o TJSP que:

“Padece, inexoravelmente, da inconstitucionalidade declarada no v. acórdão suscitante, porquanto invade esfera de competência legislativa privativa da União. Ao enumerar títulos e documentos protestáveis e disciplinar a forma e o modo de protestá-los, dentre os quais o contrato de locação e o recibo de aluguel, a lei estadual, pelas normas impugnadas, versando matéria de Direito Civil e Comercial, viola os princípios federativo e da reserva legal.

Na verdade, sem prejuízo da interpretação que lhes venha a dar a competente orientação normativa administrativa e o Poder Judiciário no exercício da sua típica função jurisdicional, só à lei federal, ou decreto regulamentar federal – o ato normativo expresso, especifico e competente do direito positivo, tão enfaticamente reclamado nos ilustrados pareceres da Eg. Corregedoria Geral da Justiça -, caberia disciplinar, definir e conceituar quais e de que forma seriam sujeitos a protesto “os outros documentos de dívida”.

 

Assim, sabendo o que o nosso tribunal pensa, pergunta-se:

Seria oportuno ou temerário protestar um condômino, mesmo

que o dispositivo final da decisão restrinja apenas para questões de locação?

 

Não somos de nenhum clã que deixa alguém se queimar para saber que é fogo. Sabemos da irregularidade no Estado de São Paulo e alertamos, cabe a cada síndico (administrador e responsável civil e penalmente pelos atos do condomínio) analisar, pois protesto não deve ser usado como ato de coação.

 

Mas seria só….?

Não, claro que não.

Protestar transforma um título em líquido e certo, como bem apregoam alguns, mas vejamos algumas de suas desvantagens:

 

Primeira desvantagem – mesmo protestado ainda temos que propor ações de cobrança pelo rito sumário:

:: Art. 275, II, “b” do Código de Processo Civil – diz ser a cobrança de condomínios por rito sumário o remédio jurídico para inadimplência;

:: Art. 585 do Código de Processo Civil – não traz no rol de títulos executivos os créditos condominiais.

 

Segunda desvantagem – protestando, a prescrição é reduzida:

:: Cobrança de Condomínios pelo Rito Sumário – 10 anos (art. 205 do Código Civil);

:: Cobrança de dívida líquida e certa – 5 anos (art. 206, parágrafo 5o do Código Civil).

 

Terceira desvantagem – tendo uma decisão do Órgão Especial do TJSP, qualquer condômino pode contestar o ato do apontamento de protesto, correndo o risco do condomínio e o síndico serem processados por dano moral, que salvo apólices especiais, não está coberto pelo seguro (RC Síndico).

Não podemos mais aceitar um “conto de fadas”, sob qualquer risco, ainda que de um “conto de reis”.

O síndico administra e carece de conhecimento e ação correta, não podendo mais agir pelo instinto de um ganho rápido em desfavor do condomínio ou de sua própria pessoa.

Pense ! Reflita ! E faça o melhor.

 

São Paulo, 19 de setembro de 2011

Autores

  • Jornalismo Direcional
  • Cristiano de Souza Oliveira

    Advogado e consultor jurídico condominial há mais de 28 anos. Mediador Judicial e Privado cadastrado perante o CNJ. Integra o quadro de Câmaras de Mediação e Arbitragem no campo de Direito Condominial. É Vice-Presidente da Associação dos Advogados do Grande ABC, Membro do Grupo de Excelência em Administração de Condomínios - GEAC do CRA/SP, palestrante e professor de Dir. Condominial, Mediação e Arbitragem, autor do livro "Sou Síndico, E agora? Reflexões sobre o Código Civil e a Vida Condominial em 11 lições" (Editado pelo Grupo Direcional em 2012). Sócio-diretor do Grupo DS&S. Diretor do Instituto Educacional Encontros da Cidade – IEEC. Já foi Presidente da Comissão de Direito Administrativo da 38ª Subseção da OAB/SP – Gestão 2016-2018 / Presidente da Comissão de Direito Condominial da 38ª Subseção da OAB/SP – Gestão 2019-2021 / Ex - Membro na Comissão de Direito Condominial do Conselho Federal da OAB e da Comissão da Advocacia Condominial da OABSP –2022.

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