O que muda na guarda e custódia de documentos do condomínio na era digital?

Um dos encargos mais difíceis e menos informados da gestão condominial é o que se refere ao tempo necessário para guarda e custódia de documentos pela gestão condominial.

O tema se agrava quando o síndico se apodera do conhecimento de que a guarda e custódia de documentos pode ser essencial e imprescindível para a defesa ou promoção dos interesses do condomínio e, por via de consequência, da própria massa condominial, sendo certo, por outro lado, que a negligência ou o descuido com esse aspecto da gestão pode acarretar dissabores diversos, quando não, responsabilidade civil direta do condomínio e da própria pessoa do síndico.

De início, deve ser observado que a guarda de determinados documentos deve obedecer e atender a determinados parâmetros legais, não se havendo falar em qualquer tipo de discricionariedade do síndico, senão, em estreita vinculação e rígida observância às regras de regência aplicáveis a cada espécie de documento.

Ademais, há de ser frisado que determinados expedientes documentais devem ser mantidos em acervo acessível, haja vista que tais documentos podem ser revestidos do caráter de prova da regularidade da gestão, seja perante as ações de controle administrativo pelo Poder Público, como é o caso das fiscalizações ambientais ou do trabalho; àquelas que dizem respeito a demandas ajuizadas com o perfil de ações tributárias, fiscais, previdenciárias; ou mesmo às de cunho cível.  

Outro ponto de destaque que deve merecer a atenção do síndico e da administradora de condomínios é o fato de que vivemos a denominada “era da informação”, onde todos os dados e informações trafegam em profusa velocidade pelas rodovias virtuais. Nesse sentido, não há como olvidar as vantagens do acervo digital, que devem ser enunciadas até para que se saiba de sua real utilidade.

Com efeito, a digitalização e/ou a microfilmagem de documentos proporciona, ao mesmo tempo, o controle de quem pode acessar as informações, onde senhas e códigos costumam trazer maior segurança à custódia e à guarda documental. Esse acesso facilitado, em qualquer instante em que o usuário precise de um determinado documento, e que admite a edição documental no formato on-line, seja para o fim de inserir, excluir ou corrigir informações, proporciona uma considerável e expressiva redução de custos e de espaço necessário para armazenamento. Isso posiciona ainda o condomínio no âmbito das boas práticas de gestão associadas à sustentabilidade ambiental e à salubridade espacial.

Contudo, o armazenamento digital importa na adoção de cuidados redobrados com a possível perda de registros, de forma que os arquivos devem ser replicados e guardados com a máxima segurança que esse tipo peculiar de custódia culmina por demandar.

Dentre as formas mais usuais de ferramentas destinadas à proteção documental podem ser enunciadas a guarda em nuvem, o armazenamento em servidores especiais e a efetivação de uma rotina contínua e permanente de backups.

Proteção

Destarte, sabendo-se que os documentos podem ser armazenados tanto em meio físico como em meio digital, resta saber qual o tempo destinado à guarda e à custódia de cada tipo e modalidade de expediente documental.

Nesse sentido, vejamos o quadro abaixo delineado, o qual não esgota o rol de documentos que devem ser custodiados pela gestão condominial, senão, enuncia, ao menos, aqueles que possuem maior destaque e relevo (Tabela 01).

Tabela 01 – Tempo de guarda de documentos

Setor

Tipo de documento / Tempo

Condomínio

– Cartão do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) / permanente
Planta do condomínio/ permanente
– Convenção do Condomínio / permanente
– Atas de Assembleia / permanente
– Orçamentos e contratos de obra / até o final da garantia
Seguros em geral / 5 anos após a vigência
Registros (extratos) bancários / 1 ano   

 

Tributário

– Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF) / 7 anos
– Documento de Arrecadação de Receitas Federais (DARF) do Imposto de Renda (IR) / 7 anos

Trabalhista / Fiscal

– Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) / indeterminado
Livro de inspeção do trabalho / permanente
Prontuário de funcionários / permanente
Processo trabalhista / permanente
– Guia da Previdência Social (GPS) /35 anos
– Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações à Previdência Social (GFIP) / 35 anos
Folha de pagamento / 35 anos
– Exame médico (periódico, admissional e de demissão) / 20 anos
Laudo do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) / 20 anos
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) / 10 anos
– Documento de Arrecadação de Receitas Federais (DARF) do Programa de Integração Social (PIS) / 10 anos
– Recibo de pagamento de funcionário / 10 anos
Recibo de cesta básica e/ou vale refeição e vale transporte / 10 anos
Guia de contribuição sindical / 7 anos
– Registro de ponto / 6 anos
Apólice de seguro de vida / 5 anos após a vigência

Fonte: Extraído da legislação brasileira e organizado pelo autor do texto

De ser ainda observado que o Art. 1348, § 2º, do Código Civil Brasileiro, autoriza o síndico a “transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de representação ou as funções administrativas, mediante aprovação da assembleia, salvo disposição em contrário da convenção”, o que vale dizer que o gestor condominial está autorizado, desde que observados os parâmetros legais e convencionais, a delegar atividades e serviços próprios de sua gestão, dentre os quais se encontram a guarda e a custódia de documentos, seja no formato físico, seja sob a rubrica digital.

Nesse sentido, a depender do preenchimento dos requisitos acima enunciados, poderá o condomínio se valer do apoio de uma administradora de condomínios, seja ela uma empresa “física” ou mesmo “digital”, esta última, aquela que costuma emitir comunicações digitais, bem como pastas de prestação de contas, jamais olvidando o fato de que a delegação de atividades não importa na transferência da responsabilidades. Ou seja, o síndico segue como a pessoa natural responsável legalmente pelo condomínio, não importando se as atividades que se encontram sob a sua égide estão sendo efetivadas, ainda que em decorrência da força de um contrato, por uma empresa de apoio à gestão condominial.

Ademais, conhecendo-se os riscos associados ao armazenamento de documentação no meio físico, recomenda-se ao síndico examinar “in loco” e também por referências qualitativas do mercado, o nível de segurança das tecnologias digitais empregadas no armazenamento virtual, uma vez que tais técnicas devem assegurar a maior segurança, longevidade e integridade ao acervo documental do condomínio; deve-se ainda atentar para a política associada de proteção de dados vigente na estrutura condominial, a qual deve obedecer, com o maior grau de conformidade possível, todas as diretrizes estampadas de forma expressa na mais recente Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).


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Autor

  • Vander Ferreira de Andrade

    Advogado. Especialista, Mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP. Responsável pela capacitação de mais de 5.000 profissionais no segmento condominial em todo o Brasil. Palestrante e Parecerista. Articulista de diversos periódicos especializados na área do Direito e da Gestão Condominial. Autor do “Manual do Síndico Profissional” (Editora Nelpa – São Paulo, 3.ª Edição, 2022). Atualmente é Vice-Presidente do Capítulo São Paulo da J. Reuben Clark Law Society e Presidente da Associação Nacional de Síndicos e Gestores Condominiais.

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