“Síndico atento traz o funcionário para si, para ser seus olhos e ouvidos nos condomínios”

Luís Lopes, 62 anos, administra edifícios de médio a alto padrão.

Síndico profissional Luís Lopes

Sou egresso do setor bancário, onde me consolidei como executivo. Sou formado em Administração de Empresas, Economia, Matemática e Comércio Exterior. Sempre gostei de estudar, de entender com o que estava lidando no meu trabalho. De certa forma, foi esse hábito que me levou à sindicatura. Eu me ofereci para ser conselheiro fiscal no condomínio em que morava; depois, síndico. Mas quis me preparar bem, então passei a frequentar cursos noturnos para desvendar esse nicho e acabei fisgado. 

Hoje, são quase 20 anos dedicados somente aos condomínios. Atingi um patamar que me satisfaz financeiramente e faço um trabalho que me realiza, que é cuidar de pessoas: enquanto síndico profissional, eu cuido de mais de mil famílias! Tenho, por exemplo, um condomínio-clube no Butantã bem numeroso, com nove torres e 290 unidades; noutro extremo, um de alto luxo com 12 unidades apenas, no Alto de Pinheiros. Cada qual com seus desafios, o que é instigante. Condomínios possuem identidade própria. Não existe fórmula única de gestão, o síndico que tem de se moldar à realidade de cada um deles.

Ingressei nos condomínios por volta dos 45 anos de idade, sendo 33 deles dedicados às instituições bancárias; 27 ao BCN (Banco de Crédito Nacional) e seis ao Santander. Iniciei jovenzinho no mercado de trabalho, aos 14 anos, pois venho de uma família humilde. Fui criado na Barra Funda, numa casa de vila alugada, onde vivia com meus pais e minhas duas irmãs, mais velhas. O meu pai era taxista e minha mãe, do lar. Preocupado com nossa segurança, ele decidiu que nos mudaríamos para um edifício, onde um cliente do táxi lhe alugaria um apartamento. Ele estava certo porque naquela época muitas casas não tinham laje e os assaltantes entravam pelo alçapão.

Moramos nesse edifício, no mesmo bairro, durante alguns anos até meu pai terminar de construir uma casa bem agradável na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte. Ainda antes de nos mudarmos para ela, comecei a trabalhar como mensageiro no BCN, transportando malotes entre agências, o que podia ser feito a pé, ou com um triciclo contendo um grande baú.

Sem falsa modéstia, sempre tive muita sorte na minha vida, sempre fui abençoado. Fui contratado para trabalhar direto com o Dr. Pedro Conde, o dono do banco. Ao final do primeiro dia de expediente, ele quis falar comigo. Entrei em uma sala maravilhosa, ele me estendeu a mão e disse: “Aqui eu sou igual a você e você é igual a mim, todo mundo se respeita. Eu vou ensinar você a ser um grande homem aqui dentro, mas preciso saber se você quer isso também”. Agarrei a oportunidade!

A atitude do banqueiro me marcou demais; hoje, em todos os meus condomínios, saio apertando a mão de todos os funcionários. Para muita gente, eles são invisíveis, mas está errado, eles estão ali cuidando do empreendimento, muitos sem terem se alimentado direito. Comigo, recebem café da manhã. Também institui um bônus de R$ 300,00 ao mês para quem não se atrasar e não faltar, a menos que seja com atestado. Essas despesas constam na previsão orçamentária. O síndico profissional atento traz o funcionário para si, para ser seus olhos e ouvidos, porque ele não está todo dia no condomínio. Ademais, aprendi no banco que quem tem poder de derrubar a diretoria ou presidência não é outro diretor, é o chão de fábrica.

De volta à minha trajetória, quando eu estava com 17 para 18 anos a minha família se mudou para a casa na Vila Nova Cachoeirinha. Pouco depois, eu conheci a Maria José, minha eterna parceira, nos bailinhos de garagem do bairro. Nos casamos cedo, eu com 23 anos, ela, 25, e fomos morar em um quarto e cozinha. Quando nossa primeira filha, Ariane, estava a caminho, buscamos um espaço maior. Para dar entrada em um apartamento usado na região, eu vendi um carro, um terreno e um videocassete de quatro cabeças em tempo recorde! Nos mudamos para o imóvel, mas logo depois veio o Plano Collor, com medidas econômicas abruptas, e comecei a ter muita dificuldade para pagar o financiamento, quase perdi o imóvel.

Nessa fase, eu chorava direto sem saber o que fazer, até que um colega do banco me sugeriu trabalhar à noite como garçom em uma churrascaria de ponta, onde o pai dele era funcionário. Eu não sabia nem equilibrar uma bandeja, mas comecei a servir bebidas e assim o fiz por três anos. Já a minha esposa passou a fazer pãezinhos e a vendê-los em uma cesta. Nesses três anos, ela cresceu exponencialmente. Dos pãezinhos nasceu uma salgateria, que evoluiu para uma rotisserie – em 1991, quando nasceu nosso filho Felipe, já tínhamos essa loja aberta e eu dava expediente aos domingos.

Anos mais tarde, a rotisserie evoluiu para um buffet e, aos finais de semana, eu e minha esposa íamos de mesa em mesa indagar se os clientes estavam sendo bem atendidos – essa preocupação do bem servir e de querer ouvir as pessoas teve continuidade quando abracei os condomínios. Ser um bom gestor tem a ver com a forma como se trata as pessoas. Não adianta querer ser sindico mão de ferro, aí você não consegue se reeleger.

No passado, com a rotina bancária, lidei com vários perfis de clientes, uns mais ricos, outros mais necessitados, vivência que me deu um olhar abrangente. Em um mesmo condomínio, por exemplo, há pessoas em diferentes momentos financeiros, então reajustar a cota em 10% pode não impactar algumas, mas complicar a situação de outras. Sempre que preciso aplicar reajustes mais altos, estudo primeiro se existem outras possibilidades que me permitam fazer alguma redução deste percentual.

Outra herança bancária são auditorias, sempre imprescindíveis. O fato mais significativo na minha sindicatura foi ter descoberto uma fraude de 2 milhões num condomínio do qual eu era gestor há apenas dois meses. Isso me mostrou que eu estava no caminho certo, que tinha maturidade e expertise para ser síndico profissional. Neste episódio, durante anos a fio a administradora fingiu fazer o recolhimento dos funcionários, mas desviava o pagamento. Decifrei a falcatrua e a denunciei. Passei a dar palestras sobre fraudes, onde abordo também a importância das auditorias. Todos os meus condomínios são auditados porque se eu der bobeira, se eu não perceber a má conduta de uma administradora, terei de responder por isso, podendo até perder bens que levei uma vida para conseguir. Melhor prevenir!”

Luís Lopes, em depoimento a Isabel Ribeiro


Matéria publicada na edição 294 out/2023 da Revista Direcional Condomínios

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