Síndico, Conte sua História! Com Demilson B. Guilhem

“A vida me deu Muito mais do Que eu mereço E esperava Conquistar”

Demilson Bellezi Guilhem, 65 anos, é síndico e podcaster

“Sou uma pessoa de origem simples, meus antepassados, espanhóis pelo lado paterno e italianos pelo materno, eram camponeses, pessoas paupérrimas que encontraram na imigração para o Brasil uma opção de trabalho nas lavouras de café. Eu nasci num lar humilde, mas de uma riqueza imensurável, pois havia amor e respeito. Éramos nômades porque o meu pai era pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia e, pela dinâmica do cargo eclesiástico, a cada dois, três anos, era transferido de cidade. Eu nasci em São Caetano do Sul, no ABC, mas após dez meses fomos morar em Presidente Prudente, depois Juiz de Fora, Rio de Janeiro e São Paulo, onde passei minha adolescência, no Capão Redondo, zona sul.

O meu pai era graduado em Teologia e recebia salário para dedicar-se integralmente à igreja. O salário era bem limitado, tanto que só conseguiu ter casa própria no Capão Redondo porque os imóveis custavam menos. Naquela época, ele atuava numa escola adventista do bairro, enquanto eu estudava em outra, da mesma fé, na região. Desde garoto, participei de muitas atividades religiosas, adquirindo desenvoltura para falar em público. Os meus pais queriam que seus três filhos (eu e minhas duas irmãs) fossem pessoas dignas e com uma formação. Queriam que eu estudasse Teologia, mas escolhi Engenharia Civil.

Fiz faculdade na FAAP. Os meus colegas, moradores de bairros nobres, diziam: ‘Você vai para o Capão Redondo?’. E eu respondia: ‘Claro, é lá que eu moro’. Primeiro, se espantaram, depois passaram a frequentar nossa casa. Mesmo frequentando faculdade de elite, eu me sentia confortável porque eu fui educado para me relacionar com pessoas, independente de classe social. Lembro-me de ver o meu pai, um homem que veio da lavoura, despachando tranquilamente com o prefeito em Juiz de Fora sobre algum interesse da comunidade. Na própria igreja havia ricos e pobres. Entendi muito cedo que todos eram iguais.

Custear a faculdade é que era a parte difícil, pois as finanças eram apertadas, então assim que deu, fiz estágios remunerados e dei monitoria na FAAP em troca de um expressivo desconto. Ao me formar, em 1980, um colega do curso me convidou para trabalhar com ele na pequena construtora da família. Era a Eztec, hoje uma das maiores do país. Tenho orgulho de dizer que foi minha primeira empregadora.

Saí da construtora para trabalhar na expansão da igreja adventista pelo interior paulista, construindo templos, escolas e centros filantrópicos. Fui morar numa quitinete em Campinas e abracei a missão; não me tornei pastor, mas iria ser útil como engenheiro. Às vezes, volto ao interior e, por alguma coincidência, revejo meus projetos, minha dedicação, minha entrega.

Depois de um tempo, fui contratado como engenheiro na Golden Cross, no Rio de Janeiro, uma empresa de convênios médicos que teve vários escritórios, consultórios e hospitais pelo país. Desenvolvi meu trabalho técnico até o ponto em que não me senti mais desafiado. Pedi ao RH uma oportunidade de fazer carreira na área administrativo-financeira. A empresa aceitou, me pagou o melhor MBA executivo da época, na UFRJ, cursos na FGV, e tirou de dentro de mim o ranço de engenheiro de obra, meio truculento no trato, para ser um executivo de verdade. Fiquei 14 anos na empresa, entrei engenheiro e saí diretor.

Aos 40 anos, durante um período na Califórnia para aprender inglês em um curso de ponta para estrangeiros, fui colega de turma do maior acionista da Intelbras, uma pessoa muito agradável de conviver. De volta ao Rio de Janeiro, onde eu havia comprado um apartamento na Gávea, assumi um cargo executivo na Intelbras, cujo foco principal era telefonia, mas já mirava equipamentos de segurança.

Em 2003, por uma questão pessoal, entrei numa profunda depressão e me mudei para São Carlos, no interior paulista, onde meus pais estavam morando, e também uma de minhas irmãs. Aluguei uma casa perto deles, que me deram total apoio. Foram quatro anos de tratamento severo e contínuo com psicólogo e psiquiatra. Só não pensei em suicídio porque destruiria os meus pais, mas me faltava motivação para sair da cama pela manhã. Hoje, se noto alguém com depressão, procuro ajudar com base no que vivi.

Sempre fui cauteloso com dinheiro, meu, de empresas, dos condomínios etc. Nunca vi sentido em ter de adquirir um carro importado e usar terno Armani conforme galgasse posições na carreira. Um terno bem cortado já estava bom, para que ser perdulário? Quando adoeci, tive condições de bancar aluguel e tratamento. Quando melhorei, voltei ao Rio para trabalhar numa empresa de seguros, ficando por quatro anos. Nessa etapa, conheci minha futura esposa, a Ana Helena, que morava em São Paulo.

Ficamos num relacionamento de ‘ponte aérea’ até que, em 2010, voltei a morar em São Paulo e nos casamos. Compramos nosso apartamento na Vila Leopoldina, e passei a trabalhar com representação de máquinas de automação bancária, de uma fabricante alemã. Três anos depois, comecei a buscar diferentes perspectivas de trabalho. Eu já era síndico orgânico, mas eu não sabia que existia síndico profissional, o que descobri lendo a Direcional Condomínios.

Perguntei aos amigos da Eztec se conheciam essa coisa de síndico profissional e disseram que sim, que havia futuro, depois me indicaram para a gestão de um enorme condomínio em Osasco. A administradora do meu condomínio também me indicou clientes, bem como alguns vizinhos do prédio que se mudaram para novos condomínios. Assim foi minha transição para a sindicatura. Em quase 11 anos já implantei condomínio de interesse social e condomínio com imóveis de 8 a 10 milhões de reais. Não faço só implantações, mas prefiro porque os desafios são maiores, você ainda desconhece o DNA que surgirá dali.

Ser síndico é ter a oportunidade de aprimorar o local que as pessoas habitam por meio de uma gestão proativa. No meu condomínio, por exemplo, recuperei o caixa negativado, modernizei toda a área comum, instalei pet place e mercadinho, e ainda pude ficar seis anos sem reajustar a cota.

Eu me sinto tão realizado na sindicatura que há um ano criei um podcast para síndicos, em que trago entrevistados para falar de assuntos comportamentais, técnicos e jurídicos. A vida me deu muito mais do que eu mereço, do que eu imaginava e me sinto na obrigação de dividir um pouco do que consegui com todo mundo. Não quero convencer ninguém de nada, apenas agregar conteúdo.”

Demilson Bellezi Guilhem, em depoimento a Isabel Ribeiro


Matéria publicada na edição 296 jan/24 da Revista Direcional Condomínios

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