Larissa Lacerda, 37 anos: rotina árdua nos condomínios e criação das filhas, de 2 e 10 anos
“Nasci em Ituiutaba, Minas Gerais, mas mudei muito de cidade devido ao trabalho do então esposo da minha mãe. Além de Ituiutaba, morei em São Simão e Paranaiguara, que ficam em Goiás, e em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. O meu pai biológico, um namorado de juventude da minha mãe, havia questionado a paternidade quando ela o procurou para contar que estava grávida, por conta disso, ela e minha avó me criaram sozinhas. Eu o conheci adulta, com mais de 30 anos. Sabia quem ele era, mas por orgulho não o procurava. Mudei de ideia após participar de uma constelação familiar, onde ficou claro que eu tinha de resolver essa pendência.
Pelas redes sociais, localizei meus irmãos paternos, que já sabiam terem uma suposta irmã. Eles me incentivaram a acabar com as suspeitas com um teste de DNA. O meu pai aceitou fazer o exame, que foi agendado em Uberlândia. Quando ele soube do resultado positivo, fez questão de me registrar e dar o sobrenome dele. Aos poucos, convivendo mais com meu pai, passei a entendê-lo. Hoje nos damos bem, sem falar que ganhei uma nova família: avó paterna, irmãos, tias.
“Procurei atenuar o sotaque (…), em São Paulo noto preconceito com o
‘sotaque caipira’, e sentia que isso
poderia interferir na imagem de força que eu desejava transmitir nos condomínios.”
Mesmo com essa lacuna na infância, fui uma criança muito, mas muito feliz. Como a minha mãe se mudava com frequência, em determinado momento ela achou melhor que eu ficasse sob os cuidados da minha avó para ter uma rotina, até por estar em idade escolar. A minha avó tinha uma pensão em Ituiutaba. Cresci brincando na rua e comendo ‘comida de vó’. Por muitas vezes, só comíamos carne quando havia hóspedes, pois eram nessas ocasiões que entrava algum dinheiro, porém, nunca me faltou nada.
Vivi a minha adolescência em São Simão, cidade natal da minha avó, para onde ela se mudou e prosseguiu como dona de pensão. Quem conhece Goiás sabe como esse estado é quente. Eu comecei a trabalhar no ensino médio, numa floricultura. Mas o meu sonho era trabalhar em um lugar com ar-condicionado, e consegui! Fui aceita na loja O Boticário, no entanto, uma das funções era fazer a cobrança de notas promissórias em domicílios, e eu rodava a cidade inteira de bicicleta sob o sol escaldante. Mas eram bons tempos.
Com 18 anos, passei a morar com minha tia-avó em Osasco. Fazia um bom tempo que ela e os filhos haviam mudado de Goiás para a região metropolitano de São Paulo, onde prosperaram no ramo de açougues. Enquanto eu cursava administração de empresas, trabalhei como caixa em açougue da família, vendedora de loja, atendente de telemarketing e recepcionista em emissora de TV a cabo. Ganhava uma renda extra como modelo e hostess em eventos. Também fazia figuração, ocupando assentos na plateia em programas de auditório, como o do Gugu.
Em 2010, um novo mundo abriu-se para mim ao ser contratada como assistente administrativa na administradora de condomínios Itaoca, que ficava nos Jardins, em São Paulo. Ainda não existia WhatsApp e o meu telefone tocava o dia inteiro. No comecinho, eu, que fora criada em cidades pequenas, regiões com raríssimos prédios, me questionava como era possível tantas demandas em condomínios. Fiz cursos no Secovi, pagos pela empresa, e comecei a descobrir o quão vasto e promissor é o mercado condominial.
Fui promovida à gerente em seis meses. Em uma das minhas primeiras assembleias de condomínio, usei bolinhas de bingo para o sorteio de vagas de garagem. Um condômino chegou atrasado, exigindo que fosse reiniciado o processo. Quando eu falei que não podia, ele derrubou o suporte do bingo, e as bolinhas todas vieram sobre mim. Fui adquirindo experiência na raça e coragem.
Adotei Osasco como minha cidade, e o longo trajeto diário para a capital paulista, de transporte público, era desgastante. Depois que me casei com o Fabio, e tive minha primeira filha, a Lívia, a distância pesou ainda mais. Saí da Itaoca após quatro anos de trabalho e fui contratada pela administradora Sigma, em Barueri, onde fiquei por quatro anos, cuidando de 30 condomínios. Com reuniões e assembleias quase que diariamente, eu chegava muito tarde em casa, mal via a minha filha, então migrei para a sindicatura com expectativa de ter mais tempo e melhor qualidade de vida. Que ilusão (rs!).
Ao decidir empreender na sindicatura, procurei uma fonoaudióloga para atenuar o meu sotaque mineiro porque em São Paulo noto certo preconceito com o ‘sotaque caipira’, e sentia que isso poderia interferir na imagem de força que eu desejava transmitir nos condomínios. Cheguei ao meu primeiro condomínio por intermédio de uma gerente administrativa, que também era síndica de um edifício antigo no Itaim Bibi, mas não conseguia visitá-lo. Dividi a gestão com ela, dei um gás e em três meses revolucionamos o local. Ela decidiu sair da área condominial, e eu estou nesse condomínio há seis anos. Um condômino dali me indicou para o meu segundo condomínio. E outros foram chegando através de relacionamento e indicações.
Logo que iniciei na sindicatura, fiz vários cursos e passei a ir aos eventos, mesmo sem conhecer ninguém. Eu me apresentava e entregava o meu cartão. Entrei para grupos de WhatsApp de síndicos, e num deles soube que a síndica profissional Tania Goldkorn precisava de um preposto. Eu me apresentei a ela, trabalhamos juntas por quatro anos, e eu a amo: ela tem uma inteligência emocional única! Só nos separamos porque a minha empresa, que eu mantinha em paralelo, cresceu muito – graças a Deus!
No ano de 2024, abri mão de alguns condomínios da carteira para não perder a qualidade da gestão, e para não me distanciar da família, que ficou maior desde a chegada da minha caçulinha Bianca, em 2023. Aliás, ainda no puerpério, houve um incêndio em um dos meus condomínios. Eu fui avisada de que não havia vítimas, e os bombeiros haviam chegado, mas fui lá mesmo assim. Os moradores estavam fragilizados, de pijama na calçada. Chorei junto com eles. No outro dia, eu já estava lá outra vez, e acabou-se a licença-maternidade. Contudo, a sindicatura ainda é ótima opção para quem tem filhos pequenos, há flexibilidade de horário. Mas não é uma profissão fácil, é cada coisa que a gente ouve e passa! Tem dias em que estou no limite e penso em desistir, mas amo, vivo e respiro condomínios. E minhas filhas são meu combustível para lutar. Sou ariana, movida a desafios, não tenho vocação para vítima. Se hoje o dia foi pesado, amanhã é outro dia.”
Matéria publicada na edição 309 mar/25 da Revista Direcional Condomínios
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Jornalista apaixonada desde sempre por revistas, por gente, pelas boas histórias, e, nos últimos anos, seduzida pelo instigante universo condominial.