Introdução
Em recentíssimo artigo de autoria do nobre advogado Dr. Kênio de Souza Pereira, publicado no Boletim de Direito Imobiliário¹, o aclamado jurista rompeu importante barreira que acabou por suscitar a ira de condôminos e síndicos. Tudo porque, frisa-se, com corretíssima fundamentação jurídica, arguiu pela possibilidade da cobrança por igual das taxas de condomínio independentemente da área privativa da unidade autônoma.
Romper paradigmas, expor novos fatos e considerações diametralmente opostas ao senso comum e enraizado, confere ao seu interlocutor asseveradas críticas e até menções de repúdio. Afinal, possuir entendimento e discernimento próprios pode ser considerado inadequado e às vezes até imoral por aqueles que seguem, fielmente, aquilo que lhes é imposto.
Neste sentido, intentar contra o critério de fracionamento das taxas condominiais, tido por muito tempo como absoluto, parece absurdo, pois quem possui maiores recursos deve arcar com maiores custos, cultura esta que acompanha o pensamento primário e autoritário da sociedade.
Portanto, desde já, parabenizo o belíssimo trabalho desenvolvido pelo ínclito professor Kênio, o qual instigou o debate necessário sobre o tema.
Da forma de contribuição das despesas de condomínio. Previsão legal
Inicialmente prevista pelo artigo 12, parágrafo 1º da Lei nº 4.591/64, a cota parte do rateio das despesas condominiais dava-se pela fração ideal da unidade autônoma, porém, o mesmo parágrafo permitia estipulação diversa neste sentido, se assim os condôminos o desejassem.
Na vigência do Código Civil, inicialmente o artigo 1.336, inciso I, determinava que a contribuição das despesas condominiais seguia a proporção da fração ideal sendo, portanto, norma cogente.
No entanto, com a promulgação da Lei nº 10.931, de 2004, passou-se, a exemplo do artigo 12, parágrafo 1º da Lei nº 4.591/64, (Condomínio e Incorporação Imobiliária), prever a possibilidade de estipulação diversa na forma de contribuição mediante previsão expressa da Convenção Condominial.
Geralmente, as convenções condominiais seguem o critério de rateio pela fração ideal e assim ficou referendado por muitos anos. Ainda hoje tem-se esta distribuição como regra.
Contudo, conforme previsão estatuída pelo Código Civil, nada obsta estipulação diversa pelas normas internas dos condôminos.
Justificativas para o rateio pela fração ideal da unidade
Resta evidente que na maioria dos condomínios, as unidades maiores constituem a minoria e, assim, dificilmente, será aprovada a contribuição por iguais valores.
Há uma cultura predominante, porém equivocada, no sentido de que os imóveis maiores geram maiores despesas e custos e, portanto, devem possuir maior participação no rateio.
Por que o critério de rateio pela fração ideal não deve ser aplicado?
Quando falamos em condomínio edilício, devemos ter em mente que esta posse compartilhada refere-se única e exclusivamente às áreas de uso comum dos condôminos.
É evidente que a taxa condominial é aplicada na conservação e nos investimentos necessários à propriedade coletiva sem influência da área privativa do imóvel.
Pouco importa se no condomínio existam unidades de 100, 200 e 300 m², todos devem contribuir de forma igualitária, pois resta imperioso observarmos o teor do artigo 5º, Caput, consagrado pela Carta Magna, que trata do princípio da isonomia.
Ainda:
O STJ, em julgamento de recurso interposto por condômino, proprietário de unidade menor, pleiteava-se que a contribuição restasse baseada na fração ideal, alegando-se que a contribuição similar, constituía enriquecimento ilícito do proprietário da unidade com área maior.
O Egrégio Tribunal decidiu de forma condizente e fundamentada que:
“O rateio igualitário das quotas não implica, por si só, a ocorrência de enriquecimento sem causa dos proprietários de maiores unidades, uma vez que os gastos mais substanciais suportados pelo condomínio – v.g. o pagamento dos funcionários, a manutenção das áreas comuns e os encargos tributários incidentes sobre essas áreas – beneficiam de forma equivalente todos os moradores, independentemente de sua fração ideal”, Recurso Especial nº 541.317 – RS (2003/0064425-4), (Grifamos). Relator
Ministro Cesar Asfor Rocha, 4ª Turma, Data do Julgamento 09/09/2003.
Para oadvogado Jader Nassif, comentando o critério de contribuição igualitário das cotas condominiais, “os custos para manutenção das áreas comuns são os que mais pesam na composição da taxa de condomínio e não há como mensurar o uso que cada condômino faz dessas áreas para se estabelecer a cobrança de parcelas diferentes para cada unidade²”.
Conclusão
Por todo o exposto, fica claro que o argumento daqueles que defendem a contribuição baseada na fração ideal não deve prosperar não sendo justo que alguns poucos proprietários, paguem valores superiores de condomínio em benefício da maioria.
As portas foram abertas, a discussão esta lançada, cabendo a nós, operadores do direito, prosseguir na discussão sem relevar a opinião pública mas, fundamentados, unicamente na justiça, definir qual o melhor critério de arrecadação das cotas condominiais.
Notas
1 – “Taxa de inveja” – nos condomínios, a deficiência em matemática e na interpretação dos textos. Boletim de Direito Imobiliário, Agosto de 2013, 1ª quinzena, nº 15, pg. 13.
2 – Vida de condomínio: Rateio de despesas deve ser por fração ideal. Disponível em: http://migre.me/g4pME
São Paulo, 13 de setembro de 2013.