Uso de áreas privativas e comuns (Locação por temporada, coworking, home office): Limites legais

A locação por temporada de unidades privativas através de aplicativos ou não, a liberação de áreas comuns para atividades de trabalho dos moradores, como uma espécie de coworking, além da cessão de espaços para serviços diversos geram dúvidas no segmento condominial.

Síndico

Alessandro Paris: Síndico profissional e administrador de condomínios

O setor de condomínios foi sacudido por uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), em abril passado, relativa à locação por temporada em dois apartamentos residenciais de Porto Alegre. A interpretação mais veiculada tem sido a de que o STJ vetou o uso de aplicativos para locação temporária nos prédios residenciais, ao julgar improcedente o recurso de mãe e filho que tentaram cassar decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul favorável a um condomínio (e contra a locação pelas partes).

“O STJ não proibiu a locação por temporada nos condomínios”, afirma o advogado Cristiano de Souza Oliveira, que completa: “A decisão trata de uma condição específica de sublocação do imóvel condominial, por meio da locação por temporada, mas de forma a usá-lo como uma espécie de pensão”. “É uma situação que desvirtua a finalidade residencial, em cima disso é que houve a decisão, não só pela finalidade quebrada, mas por contrariar o Art. 1.336 do Código Civil, ao comprometer a segurança e o sossego dos demais.”

O episódio e as controvérsias remetem aos limites nos usos dos espaços comuns e privativos dos condomínios, principalmente em meio ao contexto de novos hábitos e necessidades impostos pela pandemia da Covid-19. Caberiam exceções às regras?

Para o síndico profissional e administrador de condomínios Alessandro Paris, é preciso ver que o segmento condominial, como um todo, tem passado por transformações, com empreendimentos que nascem vocacionados para usos diversos, constituídos de subcondomínios, por exemplo, um para moradia permanente, outro de ocupação temporária, outro de comércio e serviços. “São empreendimentos cujas convenções já não impõem mais restrições”, observa. Simultaneamente, suas áreas comuns dispõem de “certa conveniência”, como máquinas de autosserviço, tipo pague e leve (freezers com bebidas e gôndolas com produtos comestíveis e de higiene e limpeza), lavanderias automatizadas e lockers (armários) para encomendas ou serviço externo de lavanderias.

No escopo dos prédios que administra, Alessandro Paris diz não haver convenções que proíbam a locação por temporada nas unidades. Ou são convenções antigas, que não preveem essa modalidade, porque inusual na época de constituição do condomínio; ou são prédios já entregues com esta previsão, explica. “Em relação à locação por temporada, os gestores lidam com um grande conflito de interesses entre investidores e proprietários moradores, que não se sentem seguros com a movimentação dos locatários. Há também uma discussão muito grande quanto à utilização dos espaços comuns e acho que, uma vez que a taxa de condomínio está sendo paga, o uso dos espaços não pode ser cerceado.”

Condomínios residenciais mais antigos têm colocado restrições na tentativa de desestimular a locação por temporada, mas, independentemente de sua legalidade (veja nas págs. 16 e 17), “não há como o síndico fiscalizar e fazer esse controle, pois os contratos são feitos entre particulares”. “Na prática, o que os condomínios têm conseguido é diminuir a rotatividade de locatários.” Uma das normas mais empregadas é estabelecer um prazo mínimo de 48 horas para registro do locatário junto ao controle de acesso do condomínio.

Demais usos

Quanto ao home office, modalidade que cresceu na pandemia, os síndicos têm sido chamados para administrar desde situações de quem trabalha dentro do apartamento exigindo silêncio do vizinho, até a produção de marmita, bolo, entre outros alimentos, na área privativa, uma alternativa de renda. “Os demais moradores são clientes, mas isso gera muita confusão. Em geral, são prédios onde não há água nem gás individualizados, nesses casos, quando a administração é acionada, notifica a unidade e informa que a atividade é proibida pela Convenção.”

Já a destinação de espaços comuns para trabalhos típicos de coworking também registra situações distintas, conforme o perfil da edificação. “Há prédios que nasceram com salas que o condômino pode locar para receber clientes, por exemplo. Mas para adaptar alguns ambientes como coworking, como o salão de festas nos seus períodos de inatividade, temos feito enquetes junto aos moradores. Busca-se um ajuste nas suas expectativas, uma forma de quebrar os incômodos gerados por eventos como as reformas internas. As próprias pessoas estão se autorregulando para utilizar essas áreas, elas estão bem adaptadas a essa nova condição gerada pela pandemia”, diz Alexandre.

O advogado Cristiano De Souza defende duas posturas diferentes para cada contexto. “Em home office, uma moradora pode receber cliente para uma drenagem linfática, desde que não haja impacto na coletividade. Se considerarmos a legislação de forma literal, a atividade poderia ser interpretada como desvio de finalidade, mas precisamos considerar a excepcionalidade da situação.” Quanto ao coworking existem duas outras situações: “Em novos empreendimentos, o conceito imobiliário inclui a área comum como extensão da privativa, o que está inclusive no projeto de lançamento desse tipo de edificação. Quem compra sabe que o perfil do condomínio vai impactar na sua administração. Este terá que criar regras para dar conta dessas demandas, como no uso da sala de reunião para trabalho dos moradores.” De outro modo, adaptar espaços com finalidades sacramentadas na Convenção e Regulamento Interno exige deliberação de assembleia.


Matéria publicada na edição – 269 – julho/2021 da Revista Direcional Condomínios

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